Receba por email.
Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Donaldson Gomes
Publicado em 28 de outubro de 2023 às 05:00
De que serve um aeroporto com tudo o que existe de mais moderno, afastado de tudo e sem boas condições de acesso? Guardadas as devidas proporções, este cenário é parecido com o desafio enfrentado por quem precisa movimentar cargas nos portos baianos. Os produtores de bens industriais e agrícolas baianos estão a quase 2 mil quilômetros de distância de São Paulo, principal mercado consumidor do Brasil. E além disso, precisam superar más condições de acesso para chegar até os portos.
Em acelerado processo de decadência, a movimentação de cargas ferroviárias na Bahia míngua um ano após o outro. Há dez anos, o volume de cargas movimentadas pelos trilhos era de aproximadamente 1,3 milhão de toneladas úteis. Caiu para 1 milhão, segundo dados do Painel CNT do Transporte - Ferroviário. De 2013 para 2022, mesmo com a expansão da economia, o estado perdeu 22% das cargas movimentadas, ao mesmo tempo em que assistiu o encolhimento da malha ferroviária disponível.
Em 2013, a Bahia era o 13º estado em movimentação de cargas, no universo de 15 unidades da federação que possuíam algum tipo de estrutura para movimentação de cargas ferroviárias. Hoje, num total de 17, a Bahia ocupa a 14ª posição. É a prática do conceito de andar para trás.
Em relação ao transporte rodoviário, um outro estudo produzido pela CNT mostra que a Bahia é o estado que possui a maior extensão rodoviária sob controle federal, com um total de 8,5 mil quilômetros de vias. Porém, em 20 anos, entre 2001 e 2021, foi apenas a sexta maior receptora de recursos para investimentos na estrutura.
E, quando se falam sobre os caminhos para chegar aos portos, vale a pena trazer para a análise o canal de acesso marítimo a Salvador. O porto da capital recebeu uma série de investimentos nos últimos anos e hoje está preparado para receber os maiores navios em operação do mundo. Acontece que novas embarcações, maiores do que nunca, vão entrar em operação na costa brasileira e há uma pequena barreira, literalmente, para que Salvador possa recebê-las. Um parecer técnico da Terrafirma Consultoria indica que a realização de uma dragagem, com custo em torno de R$ 200 milhões, para adaptar o canal de acesso do porto às novas gerações de navios pode evitar um prejuízo de até R$ 2 bilhões.
O levantamento indica que já existe um custo econômico, em torno de R$ 9 milhões por ano. A partir de 2026, os custos podem alcançar R$ 100 milhões e, a partir de 2033, a R$ 270 milhões anuais. Segundo a Terrafirma, um dos impactos deste cenário seria a perda de até 2 mil postos de trabalho já em 2026.
Melhores acessos
O presidente da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), Carlos Henrique Passos, acredita que houve um grande progresso na estrutura portuária estadual, que não foi acompanhado por uma ampliação e modernização das vias de acesso. “Houve um processo na área portuária, só que falta melhorar a estrutura de conexão a estes portos, principalmente através do sistema ferroviário”, destaca Carlos Henrique.
Para o presidente da Fieb, a Bahia precisa definir um ‘macro planejamento logístico’ capaz de atender às necessidades das diversas regiões produtivas do estado. “Se a gente olhar para o norte da Bahia hoje, temos o escoamento de minério para Aracaju através de caminhões”, diz.
Ele cita a Ferrovia de Integração Oeste-Leste, mas defende que a região central do estado possua também uma ligação com a Baía de Todos-os-Santos. “A Bahia vem crescendo na indústria mineral, tem a parte de grãos, mas tudo isso depende da conexão entre os sistemas ferroviários e portuários”, pondera.
Para o presidente da Fieb, solucionar estas questões representa um desafio para o desenvolvimento da Bahia, uma vez que a oferta de incentivos de natureza fiscal para empresas tende a se tornar cada vez mais difícil.
Para Roberto Oliva, presidente do Conselho Deliberativo da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), a Bahia vive um “apagão” de acessibilidade. “Nós já tivemos ligações com o Sudeste e com o Nordeste, uma grande integração”, analisa.
Roberto Oliva lembra que as operações que ainda estão em curso no estado são tocadas com uma estrutura defasada. “Temos limites com oito estados, quatro deles não têm portos, são oportunidades que não estamos aproveitando”, acredita.
Ele diz que em termos de infraestrutura portuária, a Bahia está apta a movimentar os mais diversos tipos de cargas, desde contêineres, a cargas gerais, granéis, minério, fertilizantes e combustíveis, entre outros. “Chega a ser inacreditável constatar que temos uma estrutura ferroviária que piora a cada dia e rodovias com a mesma capacidade que tinham na década de 70”, lamenta.
O especialista em planejamento Waldeck Ornelas diz que a Bahia está isolada do resto do país em termos de infraestrutura. “A Bahia não tem conexões ferroviárias com o Sudeste, nem com o Nordeste, depois do fiasco que foi a FCA, que permitiu o sucateamento da malha ferroviária baiana”, diz.
Para ele, é preciso trabalhar em duas frentes, com a conclusão do Porto Sul e a Fiol, em todo o seu traçado e conectada com o Centro-Oeste brasileiro, além de encontrar um caminho para refazer a estrutura abandonada pela FCA. “É preciso equacionar a substituição da FCA, para ter o restabelecimento da ligação de Salvador com o Sudeste”, defende. “Os portos precisam ser alimentados por ferrovias e rodovias eficientes”, afirma.
O Projeto Bahia Forte é uma realização do Jornal Correio com patrocínio da Intermarítima e Wilson Sons e apoio institucional da Fieb.