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Carolina Cerqueira
Publicado em 9 de fevereiro de 2025 às 05:00
Antes da ‘crise da meia-idade', a casa dos 40 chega com tudo. Os homens já sabem que é hora de fazer o exame de toque retal, que visa identificar um possível câncer de próstata. E as mulheres já sabem que é hora de fazer a mamografia, que visa identificar um possível câncer de mama. Mas a pendente atualização de uma resolução da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) levantou a discussão sobre a idade ideal das mulheres para o exame. >
O rol de procedimentos da ANS, agência que é responsável por regular os planos de saúde, prevê a realização anual da mamografia a partir dos 40 anos. Mas uma proposta de alteração da Resolução Normativa 506, de 2022, que trata do Programa de Certificação de Boas Práticas em Atenção à Saúde, preocupou entidades e profissionais da saúde nas últimas semanas. >
Na proposta, um dos critérios para uma operadora ganhar o selo de qualidade da ANS de certificação oncológica é fazer a convocação ativa das beneficiárias dos planos entre 50 e 69 anos para a realização do exame a cada dois anos. Uma consulta pública de número 144 sobre o assunto foi aberta em dezembro de 2024 e encerrada no dia 24 de janeiro deste ano. >
Foram 63 mil contribuições, além de uma série de publicações contendo posicionamentos contrários à proposta. Uma delas foi da Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM), que alegou preocupação de que pacientes percam o direito de realizar o exame a partir dos 40 anos. >
Argumentos >
A SBM argumenta que, no SUS, com rastreamento bienal entre 50 e 69 anos, apenas 5% dos casos são descobertos ainda em estágio inicial. A ANS, em contrapartida, se defende ao alegar que a proposta foi mal interpretada e, caso aprovada, não impediria a realização de exames por mulheres a partir dos 40 anos. >
A faixa etária a partir dos 50 seria utilizada somente para a busca ativa das pacientes enquanto critério para certificação de cada operadora de saúde. >
Para a Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama), no entanto, definir uma orientação para oferta do serviço no rol da ANS e outra diferente como critério para certificação em boas práticas pode criar confusão. A defesa da federação é pela faixa etária de 40 a 74 anos. >
“Profissionais da saúde podem se confundir quanto à frequência recomendada para o rastreamento. A medida também pode desestimular a realização da mamografia de rastreamento do câncer de mama em mulheres a partir dos 40 anos e piorar ainda mais o cenário de diagnósticos tardios e em estágio avançado que o país já vivencia”, diz Maira Caleffi, fundadora e presidente da Femama. >
Por conta das manifestações, a ANS reuniu entidades médicas no dia 27 de janeiro para esclarecer dúvidas sobre a Consulta Pública 144 e estabeleceu um prazo de 30 dias para que as instituições contrárias apresentem estudos científicos e dados técnicos. De acordo com a agência, ainda será estabelecido um prazo para análise e deliberação sobre a efetivação da proposta. >
Durante a reunião do dia 27, um dos profissionais a se manifestar foi Roberto de Almeida Gil, diretor-geral do Instituto Nacional de Câncer (Inca). Ele defendeu o rastreamento populacional para o câncer de mama entre 50 e 69 anos e argumentou que esta é a faixa etária embasada por estudos e protocolos nacionais e internacionais. >
Diagnóstico precoce >
Maira Caleffi rebate que as mulheres brasileiras têm maior risco de serem diagnosticadas com câncer de mama em idades mais jovens e em estágio avançado do que em países de alta renda. >
“As questões socioeconômicas do nosso país também contribuem para uma tendência de mulheres pretas terem diagnóstico em estágios mais avançados da doença”, alerta. Segundo o Inca, as mulheres negras têm 57% de chance a mais de morrer de câncer de mama do que as brancas. Nas pardas, a probabilidade é de 10% a mais. >
Maira reconhece que a idade avançada é um fator de risco, mas afirma que 22% das mortes por câncer de mama no país acontecem antes dos 50 anos e que, se descoberta em fase inicial, a doença tem uma chance de cura de 95%. Os dados do Inca corroboram com o argumento. >
A média de casos de câncer de mama diagnosticados em mulheres a partir dos 50 anos, considerando diferentes localidades do Brasil de 2001 a 2020, é de 65,1%. O número dá margem ao percentual de 33,8% para os diagnósticos abaixo dos 50 anos. >
A presidente da Femama ainda coloca que o diagnóstico precoce é financeiramente interessante para os planos de saúde. “Quanto mais cedo a confirmação do tumor, menor a chance de escalonamento do custo em tratamentos de alta complexidade”, diz.>
Procurada, a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) disse que "recomenda a adoção de linhas de cuidados e protocolos assistenciais em sinergia com as melhores práticas internacionais para entregar a melhor assistência aos beneficiários de planos de saúde, com acesso a uma atenção à saúde integral e coordenada." >