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Carolina Cerqueira
Publicado em 16 de fevereiro de 2025 às 05:00
O Papa Francisco já criticou os chamados pais de pets e lamentou que “cães e gatos estejam ocupando o lugar das crianças”. Agradando ou não, os bichinhos vêm reconfigurando as noções de família e, portanto, as áreas comuns dos novos empreendimentos na Bahia e em todo o Brasil. A arquiteta e coordenadora de produto da Moura Dubeux na Bahia, Luciana Queiroz, compartilha que a infraestrutura oferecida tem ficado cada vez mais sofisticada. >
“Inicialmente, eram espaços voltados para atividade ao ar livre, algo mais simples. Mas já fomos adicionando equipamentos para simular cada vez mais uma boa praça. Hoje, oferecemos até recursos para simular um pet shop”, afirma. Uma pesquisa da Brain Behavior, empresa voltada a consultorias e estudos no ramo imobiliário e da construção civil, revela que 49% dos tutores brasileiros aceitariam pagar mais para morar em um imóvel que atendam às necessidades dos pets. >
Esse é o caso de Sandra Mota, de 61 anos. Ela é tutora de Pyppo, um pug de 11 anos. Quando ele chegou, com 4 meses, Sandra precisava se mudar e, quando viu a praça do condomínio de cinco prédios onde mora, no bairro do Imbuí, em Salvador, ficou encantada. Seria perfeito para Pyppo. >
“Ele já se divertiu muito nessa praça. Recentemente, colocaram também um Pet Place com brinquedos. É um espaço amplo, com bastante área livre e arborizada. Um espetáculo! Ele fazia a festa!”, conta. Agora, mesmo já velhinho, Pyppo não abre mão dos dois passeios que faz todos os dias. >
“Quando dá 8h e 18h, ele já dá sinal de que quer descer. Eu levo e ele fica andando 15 minutinhos e socializando com os outros pets. Daqui, por causa dele, eu só sairia para uma casa com quintal grande, não colocaria ele em um apartamento pequeno sem essa área que tenho hoje aqui no condomínio”, completa Sandra. >
Ederson Galeno, do Conselho Regional de Corretores de Imóveis da Bahia (Creci-BA), afirma que os imóveis em prédios com infraestrutura adequada não são, necessariamente, mais caros. "Esse valor pode recair na taxa condominial. Depende muito da proposta e do projeto", coloca. >
Diretor da imobiliária Itaigara Imóveis, ele compartilha que a empresa identificou, de 2020 para 2025, um aumento de 28% no número de clientes tutores de pets. Os empreendimentos que oferecem estrutura para os bichinhos saem ganhando na disputa por compradores. "É um diferencial competitivo no mercado imobiliário, principalmente entre os clientes mais jovens", diz Ederson.>
Não vá pensando que os condomínios meramente separam espaços para que os pets possam circular. Não mais! Tudo é cuidadosamente pensado para que eles socializem, brinquem e gastem energia com gangorras, túneis, rampas, obstáculos e um bebedouro para refrescar. >
“Começamos pensando em qual espaço teremos disponível para fazer o chamado Pet Place, escolhendo uma área perto dos demais espaços de lazer. É importante que seja um piso adequado para eles não queimarem as patinhas, geralmente grama, que é macia e traz frescor”, explica Thayane Azevedo, arquiteta na Pejota Empreendimentos, que equipou com pet places os residenciais Vivver Exclusive, Vivver Ulysses e Vivver Novo Horizonte, que ficam no bairro de Sussuarana, em Salvador. >
“Aí vamos dimensionar quais equipamentos colocaremos, deixando uma área ampla para eles correrem. E cercamos esse espaço para dar menos preocupação para os tutores e evitar acidentes”, acrescenta. Tudo é pensado para animais de pequeno e grande porte, bem como não exclusivamente para cachorros, embora costumem agradar mais esses animais. Gatos acostumados com ambientes externos são bem-vindos. >
Pet Care >
As ofertas não param por aí. A grande novidade, que vem crescendo desde a pandemia de covid-19, que fez todo mundo precisar se virar dentro de casa, é o espaço Pet Care. Ele vai estar presente no empreendimento Legacy, da OR (Grupo Novonor), em construção no bairro Caminho das Árvores, em Salvador. >
O superintendente regional da construtora na Bahia, Daniel Sampaio, afirma que os espaços para os pets já igualam os investimentos da empresa feitos nos espaços para crianças. “O Pet Care é dedicado ao bem-estar e cuidado, com a infraestrutura necessária para banho e tosa. É uma forma de facilitar o dia a dia dos tutores, que não precisarão se preocupar em levá-los para outros locais ou realizar o serviço em seus apartamentos, sem a infraestrutura necessária”, diz. >
O gestor de desenvolvimento imobiliário da MRV na Bahia, Ivan Barreto, acrescenta que a pandemia fez crescer a adoção e compra de pets, bem como a busca por oferta de serviços, infraestrutura e segurança sem sair de casa. “Os espaços com duchas estão entre as principais demandas dos tutores de pets para os empreendimentos”, aponta Ivan. >
Tendência >
Segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet), o país possui mais de 149 milhões de animais de estimação. Uma em cada 10 unidades de apartamentos possuem pets. É o que aponta o Censo Condominial 2024/2025, que funciona como o relatório anual dos condomínios, feito pela uCondo, startup de gestão condominial. O CEO, Marcus Nobre, aponta que é nítida a mudança do padrão familiar. >
“A gente nota as pessoas deixando de ter filhos e tendo pets e, a partir disso, temos ajudado as construtoras a remodularem os modelos de negócios. Já vemos mais prédios com espaços pet do que espaços kids”, afirma Marcus. >
A startup oferece um aplicativo de gestão que é contratado por síndicos e administradoras de condomínios. São seis mil condomínios cadastrados e mais de meio milhão de usuários, ou seja, moradores. É a partir desse cenário que conseguem levantar dados importantes. >
Cães e gatos são a maioria dos bichinhos. Os cachorros ficam com 65% e, os felinos, com 29,1%. Mas há espaço para outros pets. Aves, répteis e roedores somam 3%. >
A arquiteta da Pejo Empreendimentos Thayane Azevedo compartilha que os clientes buscam espaços de lazer com tranquilidade e segurança dentro dos condomínios. “Ao longo dos anos, as empresas começaram a olhar com mais carinho para essa demanda até porque, com o mercado imobiliário crescente, há a necessidade de diminuir a área útil dentro de cada apartamento. Hoje, o espaço pet é realmente um diferencial”, diz. >
O superintendente da OR na Bahia, Daniel Sampaio, complementa dizendo que o que os tutores buscam para seus animais de estimação o mesmo conforto e bem-estar que buscam para si próprios. “Não basta a estrutura, mas também buscam regulamentações de condomínio que tragam atenção e inclusão aos pets, deixando eles utilizarem os espaços e não afetando o bem-estar dos outros moradores”, destaca. >
Essenciais >
Para o médico veterinário Humberto Santos da Silva, especialista em animais de companhia, ter uma estrutura voltada para os pets é essencial para quem mora com bichinhos em apartamentos. “Algumas raças de animais precisam de um gasto energético elevado e vão fazer isso nas áreas comuns. É lá também onde vão socializar, o que é muito importante para a boa saúde mental”, explica. >
Os Pet Cares, também chamados de Pet Washes, são uma opção para os animais que já passaram por experiências ruins em pet shops e não gostam de frequentar esses lugares. Mas vale ressaltar que, para a higienização dos pets, é preciso um local climatizado, limpo e com controle de ruídos para que eles não desenvolvam fobias durante o banho. >
Os cuidados não deixam de ser necessários. O médico veterinário lembra que, para a circulação dos animais em áreas comuns, é preciso que eles estejam com vacinas em dia, controle de pulgas e carrapatos e vermicida para que não haja foco de doenças infectocontagiosas e de parasitas. >
“Também é importante que os materiais usados, como as tintas, não sejam tóxicos. Não podemos deixar de mencionar que prédios precisam disponibilizar sacos e lixeiras para que os responsáveis coletem os dejetos dos pets”, sinaliza Humberto. >
Conflitos >
Sandra conta que Pyppo já foi mordido sete vezes no Pet Place do condomínio onde mora. Por lá, são 800 apartamentos e cerca de 300 com animais. Ela relata que luta para acabar com os dejetos não recolhidos. “Toda hora estou mobilizando o pessoal para colocarmos mais lixeiras e saquinhos. Está tudo direitinho, mas, ainda assim, tem gente que não respeita”, destaca. >
Se há convivência e socialização entre os animais, há conflitos. A uCondo registrou este ano 344 reclamações envolvendo bichos de estimação. As ocorrências vêm crescendo. Enquanto, em 2022, foram mil ao longo de todo o ano, em 2023 foram 1,4 mil e, em 2024, 2,3 mil. >
Os registros envolvem latidos de cachorros, dejetos em áreas de convivência e animais soltos e perdidos. Este último item levou a startup a desenvolver, em 2019, uma ferramenta nova no aplicativo: o cadastro de animais. >
Através do recurso, cada tutor morador pode e deve cadastrar o seu pet, incluindo nome, descrição das características e sinalização do apartamento. Assim, quando alguém encontra um animal perdido, pode, ao consultar o aplicativo, identificá-lo e devolvê-lo ao dono. Também no cadastro há espaço para incluir a carteirinha de vacinação dos animais para deixar todo mundo mais tranquilo. >