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Carolina Cerqueira
Publicado em 25 de janeiro de 2025 às 02:00
Os jovens estão distantes do Sistema Único de Saúde (SUS) e, para eles, entender seu funcionamento não é tão intuitivo quanto para pessoas de gerações anteriores. É o que acredita a Agenda Jovem Fiocruz, plataforma colaborativa para a juventude que articula temas do SUS com a Política Nacional da Juventude. >
A Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), cuja edição mais recente foi feita pelo IBGE em 2019, mostrava que, enquanto 5,6 milhões de brasileiros de 18 a 39 anos eram atendidos na atenção primária, os adultos de 40 a 59 anos somavam 6,1 milhões. >
A maquiadora Mairla Bacelar, de 29 anos, que mora em Riachão do Jacuípe, estava entre esses jovens. Ela fez tratamento contra um câncer de colo de útero durante cinco anos no sistema público, já que não teria condições de arcar com os valores. Contou com a ajuda de um plano de saúde mais simples para fazer tomografias, ressonâncias e exames de sangue que não poderiam atrasar, mas teve acesso gratuito a sessões de quimioterapia e radioterapia com celeridade. >
“Foi tudo muito rápido, não houve demora para iniciar o tratamento e completei as sessões em um mês”, conta. Mas todo o contato de Mairla com o sistema público, desde que nasceu, acontece graças às orientações de uma tia, que é enfermeira e agente de saúde. “Ela que sempre ajudou toda a família, tanto no processo de fazer o cartão do SUS quanto de marcação de todas as consultas”, conta Mairla. >
A estudante Andrielly Alves, de 22 anos, que mora em Camaçari, marca as consultas indo ao posto de saúde e entrando na fila de espera. Ela diz saber que existe um aplicativo para marcação, mas nunca o utilizou. Por conta da longa espera, precisou realizar um tratamento de um sangramento, que descobriu ser decorrente de uma adenomiose, no sistema particular. “O exame demora tanto que eu já terminei o tratamento e ainda não fui chamada para fazê-lo no SUS”, conta. >
Ela consegue fazer o acompanhamento de asma, com marcações com um pneumologista com dois a três meses de espera, e o preventivo com uma ginecologista sem maiores problemas, mas afirma que, para urgências, prefere tirar do próprio bolso, mesmo que isso signifique criar dívidas. Procurando atendimento com regularidade, foge à regra. >
Para a Agenda Jovem Fiocruz, além de não saber usar o sistema público de saúde, os jovens tendem a recorrer a atendimentos somente em emergência. Dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) mostram que a diferença também está no setor privado. Enquanto 3,2 milhões de pessoas entre 20 a 24 anos no Brasil possuem plano de saúde, na faixa etária de 40 a 44 anos esse número sobe para 4,9 milhões. >
“Há um pensamento geral de que os jovens não precisam dos equipamentos de saúde porque estão no momento mais vital da vida, mas temos 10 milhões de jovens com diagnóstico de doenças crônicas como diabetes, hipertensão e depressão. Gravidez juvenil e abuso de álcool e outras drogas não são as únicas questões”, afirma o coordenador da Agenda Jovem Fiocruz, André Sobrinho. >
Outro pensamento preocupante é de que não há tempo para cuidar da saúde. “Eles trabalham, estudam e têm responsabilidades familiares, então os horários de atendimento têm que contemplar isso. Cerca de 30% dos acidentes de trabalho acontecem na juventude e, quando acontecem, os jovens são os que menos acessam programas de reabilitação, são os que menos param suas atividades em função de algum agravo à saúde”, acrescenta Sobrinho. >
Para diminuir a diferença de acesso à saúde entre jovens e adultos, preparamos um guia com o que você, jovem, precisa saber para ser atendido pelo SUS rotineiramente, não só em caso de emergência. As informações foram coletadas da Cartilha “Jovens na Trilha do SUS”, lançada pela Fiocruz em 2024; de materiais do Ministério da Saúde, e do e-book "O que é o SUS?”, também elaborado pela Fiocruz. >
O Sistema Único de Saúde (SUS) é uma política pública brasileira. Ele foi instituído em 19/9/1990, pela Lei nº 8080 e é gerido pelo Ministério da Saúde. O sistema segue três princípios: universalização (a saúde é um direito de cidadania de todas as pessoas e cabe ao Estado assegurar este direito), equidade (o objetivo é diminuir desigualdades e, para isso, é preciso entender que as pessoas têm necessidades distintas) e integralidade (prevê a integração da saúde com outras políticas públicas para contemplar todas as necessidades). >
A Atenção Primária à Saúde (APS) é a porta de entrada principal do SUS e contempla os atendimentos considerados simples. As Unidades Básicas de Saúde (UBS) e as Unidades de Saúde da Família (USF), conhecidas como "postos de saúde", são exemplos de locais que abarcam esse nível. Neles também são feitas vacinações, acompanhamento pré-natal, testagem para infecções sexualmente transmissíveis, dentre outros exames básicos, a depender do porte de cada unidade. >
Na atenção primária, é comum encontrar médicos de família e comunidade e agentes comunitários de saúde, voltados a entender e considerar as particularidades de cada região e como elas impactam na saúde dos moradores. Também há enfermeiros, clínicos, generalistas, pediatras, ginecologistas, dentistas, psicólogos, farmacêuticos e nutricionistas, a depender do porte de cada unidade.>
Na atenção secundária estão os atendimentos de média complexidade e os locais mais conhecidos são as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), que funcionam 24 horas por dia. Nelas, há médicos de diversas especialidades e equipamentos para exames mais complexos. >
Também podem ser feitos atendimentos de emergência e até cirurgias, caso necessário. Procure uma UPA em casos como: fratura, dores, cortes, febre alta, falta de ar, vômito constante; ou quando as UBS, que não funcionam de forma ininterrupta, estiverem fechadas. >
No último nível, estão os hospitais. É neles que a maioria das cirurgias acontecem e os pacientes com risco de morte são atendidos. Esta etapa também contempla os pacientes em tratamento contra o câncer. Procure diretamente um hospital caso ele tenha um pronto-socorro ou emergência e em casos como: fratura exposta, picada de animais peçonhentos e reações alérgicas intensas. >
Para atendimento de demanda espontânea, qualquer pessoa pode procurar qualquer unidade de atenção primária. Já nas Unidades de Saúde da Família (USF), os atendimentos são realizados de acordo com o território, ou seja, cada unidade atende uma área previamente cadastrada, considerando a proximidade em relação ao domicílio.>
Como explica Augusto Vidreira, diretor da Atenção Primária à Saúde de Salvador, a orientação é que o cidadão vá até a USF mais próxima para verificar se está contemplado. Também é recomendado que cada cidadão estabeleça um vínculo, além da USF, com uma UBS. >
De acordo com dados da Secretaria Municipal de Saúde de Salvador (SMS), no primeiro semestre de 2024, nas USFs e UBSs foram realizados 2,8 milhões de atendimentos. Já a atenção especializada, os Multicentros de Saúde de Salvador registraram 446.116 consultas, exames e procedimentos e as Unidades de Pronto atendimento (UPAs e PA) registraram 989.200 atendimentos de urgência e emergência, além da realização de 1.851.138 exames laboratoriais. >
Para ser atendido pelo SUS é preciso levar o Cartão do SUS (Cartão Nacional de Saúde) e um documento de identificação com foto. No atendimento da demanda espontânea, incluindo a vacinação, quem não possuir o cartão ainda assim será contemplado, mas para consultas, exames, cirurgias e medicamentos, é preciso ter o cartão. >
“Atualmente, os recém-nascidos de Salvador já saem da maternidade com a solicitação da primeira via do cartão, mas qualquer pessoa pode fazer essa solicitação em qualquer Prefeitura Bairro, através do agendamento do Portal Salvador Digital”, afirma Augusto Vidreira. >
O cartão, posteriormente, pode ser acessado digitalmente pelo aplicativo Meu SUS Digital, antigo Conecte SUS. >
No aplicativo e site Meu SUS Digital, o cidadão acessa as vacinas tomadas e resultado de exames. Também lá pode encontrar, com o GPS ativado, os hospitais, UBSs, UPAs e maternidades mais próximas. >
O diretor da Atenção Primária à Saúde de Salvador explica que, em unidades como UBSs e USFs, além do atendimento de demanda espontânea, são realizadas consultas mediante marcação presencial. Em Salvador, ainda não é possível realizar marcações por telefone, site ou aplicativo.>
“Como forma de organização, algumas unidades de saúde realizam a marcação semanalmente ou mensalmente, a depender do cenário local. A indicação é que a pessoa que ainda não tem essa familiaridade procure informação sobre as datas na unidade que deseja”, orienta o diretor. >
Já para consultas nos multicentros (com especialistas como oftalmologistas, ortopedistas e cardiologistas, por exemplo), é preciso receber um encaminhamento a partir de uma USF ou UBS. >
Para exames, também é preciso receber um encaminhamento e orientação para agendamento. Para os que estão na categoria de alta complexidade (como tomografias, ressonâncias e endoscopias), é preciso ainda submetê-los à análise e autorização médica de acordo com protocolo e o agendamento é feito em algumas UBS e em todas as Prefeituras Bairros. >
Augusto Vidreira ainda destaca que, cidadãos que já possuem diagnóstico ou já estão em tratamento de alguma enfermidade (como pacientes oncológicos) e querem migrar do atendimento particular para o público, por exemplo, podem obter um encaminhamento direto de seus médicos para a continuidade em hospitais ou ambulatórios vinculados ao SUS, não necessitando passar pela atenção primária. >
Os cidadãos têm direito a medicamentos gratuitos e a lista destes está disponível na Regulação Municipal de Medicamentos (Remune). Com receita em mãos e cartão do SUS, qualquer cidadão pode retirar os medicamentos em unidades como USF, UBS e Prefeitura Bairro. >
O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) também faz parte do SUS e funciona através de ligação gratuita para o número 192, 24 horas por dia, todos os dias. Ao receberem as ligações, os profissionais vão passar orientações por telefone e, caso necessário, enviar uma equipe capacitada para atendimento de urgência. Ao contrário do que muita gente pensa, o SAMU não atende somente nas ruas, mas em qualquer local. >
Deve-se ligar para o SAMU em casos de: problemas cardiorrespiratórios, intoxicação exógena e envenenamento, queimaduras graves, trabalhos de parto em que haja risco de morte, tentativas de suicídio, crises hipertensivas e dores no peito, acidentes com vítimas, afogamentos, choque elétrico, suspeita de infarto ou AVC, agressão por arma de fogo ou arma branca, soterramento, desabamento, crises convulsivas. >
O Ministério da Saúde, em parceria com o Conselho Nacional de Saúde, elaborou a Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde, que pode ser conferida no site bvsms.saude.gov.br. Para fazer reclamações, denúncias, sugestões ou elogios, o cidadão pode ligar gratuitamente para o 136 (de segunda à sexta, das 8h às 20h, e aos sábados, das 8h às 18h) ou acessar o Fala.BR. >