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As capas de discos que deram a cara ao axé e o peido que quase estraga uma delas

Conheça histórias por trás de imagens que ilustraram álbuns históricos, como 'Cada Cabeça é Mundo', da Timbalada

  • Foto do(a) author(a) Roberto  Midlej
  • Roberto Midlej

Publicado em 2 de março de 2025 às 05:00

'Cada Cabeça é um Mundo', da Timbalada: 42 homens posaram para a capa
'Cada Cabeça é um Mundo', da Timbalada: 42 homens posaram para a capa Crédito: reprodução

O ouvinte que já nasceu na era do streaming não é capaz de imaginar que, um dia, as capas de discos eram tratadas como obras de arte. No Brasil, há capas de LPs e CDs inesquecíveis. Seguramente, o leitor se lembra da clássica imagem dos Secos & Molhados, com cabeças postas à mesa, no disco de 1973. Ou aquela de Roberto Carlos, de 1971, em que o rosto do Rei aparece como um desenho no lugar das fotos tradicionais.

E em seus 40 anos, o axé também tem suas capas icônicas, que fizeram história e ajudaram o ritmo a se consolidar como o mais popular do país no final dos anos 1990. Quem não se lembra de um par de seios que ilustrava o primeiro álbum da Timbalada, de 1993? Muita gente talvez não saiba, mas a modelo ali era Patricia Gomes, também vocalista da banda. A ideia foi dos designers Ray Vianna e David Glat, que trabalharam em dupla em diversos álbuns da era de ouro do axé.

Ray já costumava pintar os integrantes da Timbalada daquele jeito característico, inspirado em desenhos tribais. “Usávamos aquelas pinturas nos shows que a banda fazia e queríamos aquilo no disco. Tínhamos escalado Banana [músico da banda] para ser modelo e aparecer na capa, mas, na hora em que íamos começar, chegou Patrícia, que foi um pedido de Carlinhos Brown”, lembra o designer. Ray garante que não houve nenhum tipo de ajuste digital, nem nos seios, nem na pintura.

Na época, o álbum foi lançado em CD e também LP, o que dava ainda mais impacto à imagem, já que a capa do vinil tem a dimensão 31,5 cm x 31,5 cm. Mas Banana não foi descartado: é ele que aparece de costas no encarte.

Os seios na capa do primeiro álbum da Timbalada são de Patrícia Gomes
Os seios na capa do primeiro álbum da Timbalada são de Patrícia Gomes Crédito: reprodução

David Glat, que fez as fotos, lembra da repercussão que o trabalho teve: “Causou choque e reboliço! Eu e Ray ganhamos o prêmio de melhor capa do Trofeu Caymmi daquele ano e a capa foi publicada no Anuário do Clube de Criação de São Paulo (a 1ª publicação de algo criado na Bahia) e na Publicação El Mejor des Diseño Latino Americano”.

Cabeças

Outra capa que se tornou emblemática e também foi criada pela mesma dupla é a do segunda disco da Timbalada, Cada Cabeça é Um Mundo (1994), em que cabeças aparecem vistas de cima. Como a banda já estava se consolidando, havia condições de um investimento maior que no ano anterior.

Os designers então convocaram 42 homens - nenhum era integrante da banda - para raspar a cabeça e pintar suas carecas e montaram até um andaime onde David Glat subiu para registrar a foto. Cada um dos modelos recebeu o que seria equivalente hoje a algo em torno de R$ 100 pelo trabalho, segundo Ray Vianna.

“Mandamos umas vans buscarem os rapazes e, quando chegaram, tinha uma equipe com uma máquina para raspar a cabeça deles, no estúdio de David Glat, na Federação. Foi uma bagunça terrível e demorou demais. Para piorar, quando conseguimos deixar todo mundo na pose ideal para a foto, um dos rapazes soltou um peido horrível e eles se espalharam. Tivemos que começar tudo de novo”, ri Ray, lembrando-se. O resultado: mais um prêmio Caymmi de melhor capa.

Nildão

Nildão, mais conhecido por seu trabalho como cartunista, também está por trás de capas que marcaram a música baiana, todas elas do Chiclete com Banana, incluindo os dois primeiros álbuns da banda, Estação das Cores (1983) e Energia (1984), ainda da era pré-axé, se considerarmos 1985 como marco inicial do ritmo. “Eu conhecia Bell e um dia ele passou em minha casa me mostrando uma ideia para a capa do primeiro álbum: era um velho de barba branca, com um cajado e olhando para o infinito. Eu disse que não tinha nada a ver e fui desafiado por ele a criar uma alternativa. Comecei a fazer na tarde de sábado e terminei domingo pela manhã”, lembra Nildão.

O disco Aconteceu (1992), da Banda Beijo, trazia um selo no centro
O disco Aconteceu (1992), da Banda Beijo, trazia um selo no centro Crédito: reprodução

À tarde, Bell passou de táxi na casa do amigo para pegar o desenho, que trazia um pássaro voando junto com uma criança e um arco-íris ao fundo. Dali, o chicleteiro se mandou para o aeroporto rumo a São Paulo para encomendar a capa. Aliás, para o aeroporto, não: para a rodoviária, afinal viajar de avião era um luxo para uma banda que dava seus primeiros passos.

Uma das capas mais curiosas do Chiclete é a de Fé Brasileira, de 1987. Ali, os integrantes aparecem subindo uma daquelas escadas que dá acesso a um avião. O detalhe: no lugar da aeronave, o que tinha era um jegue. Nildão chegou a fazer um cartum para ser usado na capa, mas Bell e sua turma fazia questão de aparecer no disco e então David Glat foi escalado para a foto.

A imagem continha certa ironia, já que, no lugar do avião, estava um jegue. Uma insinuação de que o Brasil e a fé brasileira não se sustentavam no ar. Com o parceiro Renato da Silveira, Nildão criou outras capas para o Chiclete, como Menina dos Olhos (1995) e Tambores Urbanos (1988). Nessa segunda, o desenho interno trazia um desenho que tinha um quê de premonição: uma ponte que ligava Salvador à Ilha de Itaparica.

O designer Pedrinho da Rocha também foi autor de capas que marcaram a história do axé, incluindo algumas da Banda Beijo. Uma das mais marcantes é aquela repleta de bandeiras, do disco oficialmente batizado como Aconteceu (1992), mas paralelamente conhecido como Axé Music. Segundo Pedrinho, o termo “axé music” tinha uma pecha pejorativa e os artistas o rejeitavam. Mas o designer queria que a banda absorvesse aquele nome, como uma espécie de provocação. Embora o designer não tenha sido o autor da capa, teve uma importante participação.

“Na época, li uma matéria no Estado de S. Paulo sobre a torcida do Palmeiras, que havia adotado o porco como mascote. Mas o porco era inicialmente uma provocação da torcida do Corinthians, que se referia ao Palmeiras como Porco pejorativamente”. A torcida do Verdão, no entanto, sabiamente, incorporou o animal como seu novo mascote. A lógica, para Pedrinho era a mesma: a Beijo deveria absorver o termo “axé music” e usá-lo de forma positiva. E ele conseguiu convencer Netinho! A solução foi colocar um pequeno selo na parte de baixo da capa, no centro, com o nome “axé music”.

A ideia das bandeiras surgiu por causa da Copa do Mundo de 1990, quando a Banda Beijo levou um trio elétrico para a Itália, sede do torneio. Afinal, Copa do Mundo nos faz lembrar imediatamente daqueles símbolos nacionais. O bloco Beijo adotou aquelas estampas no Carnaval de 1991 e não quis deixar de fora da capa do disco lançado em seguida. Embora não assine a capa como autor, Pedrinho tem certo orgulho de ter insistido em colocar o selo “axé music” e, de alguma maneira, de ter virado o jogo: até ali, o nome, que tinha uma pecha negativa, acabou sendo adotado pela mídia para se referir ao movimento que nascia na Bahia. “O nome era uma provocação, claro”, diz Pedrinho.

Na Cabeça e Na Cintura (1996), do É o Tchan por reprodução