43 pessoas são denunciadas por oferecer serviços restritos a médicos

Última ocorrência foi registrada em Jequié, segundo o Cremeb

  • Foto do(a) author(a) Fernanda Santana
  • Fernanda Santana

Publicado em 28 de setembro de 2024 às 05:00

Em um consultório no bairro da Barra, uma enfermeira prometia dar um ‘up’ no rosto de qualquer paciente. Aplicava tanto bioestimuladores, substâncias injetáveis que estimulam a produção de colágeno, quanto botox, que minimiza linhas de expressão. Para o Conselho Regional de Medicina (Cremeb), no entanto, ela não poderia oferecer esses serviços.

A entidade recebeu, desde janeiro deste ano, 43 denúncias de pessoas que, como a enfermeira, são acusadas de praticar atos que seriam exclusivos de médicos.

Exercício ilegal da medicina  pode ser denunciado
Exercício ilegal da medicina pode ser denunciado Crédito: Shutterstock

O caso da profissional de saúde que divulgava o próprio trabalho com estética no Instagram gerou uma Ação Civil Pública movida pelo Cremeb. A liminar foi acatada pela Justiça, e ela terá que suspender atividades que, por lei, só poderiam ser exercidas por médicos. Salvador concentra 11 queixas relacionadas a esse tema, enquanto outras 26 estão no interior (quatro delas em Feira de Santana). Nas outras seis denúncias, não constam informações sobre o local.

A queixa mais recente foi enviada ao Cremeb no dia 7 de agosto. O suposto médico trabalhava em Jequié e foi alvo de denúncia anônima. No ano passado, a instituição diz ter atuado em 100 casos de exercício ilegal da medicina e impedido seis profissionais não médicos de realizar procedimentos exclusivos dos médicos.

As possíveis punições para quem pratica atos teoricamente restritos a médicos variam de acordo com a conduta praticada — por exemplo, se a pessoa apresentou carteira profissional falsa — e com as repercussões dessa conduta, ou seja, se houver danos diretos causados aos “pacientes”. A lista de médicos aptos a clinicar pode ser conferida no site do Cremeb. 

No âmbito penal, quem pratica ilegalmente a medicina pode responder pelo crime de estelionato, lesão corporal ou homicídio. Já no âmbito cível, quem exerce esses atos, na teoria restritos a médicos, pode ser condenado a indenizar os prejuízos experimentados pelo “paciente” decorrentes da conduta praticada.

Os atos que são exclusivos de médicos são determinados por uma lei de julho de 2013, como a indicação e execução de intervenção cirúrgica.

“A diferença substancial entre exercer ilegalmente a medicina e ser um falso médico se dará, substancialmente, na forma como o indivíduo se apresenta. Se um farmacêutico se apresenta como farmacêutico e executa atos considerados restritos aos profissionais da medicina, poderá responder por exercício ilegal da medicina”, exemplifica o advogado especialista em Direito Médico, René Viana, presidente da Comissão Especial de Direito Médico e da Saúde da Ordem dos Advogados na Bahia (OAB).

“Já, se este mesmo indivíduo se apresenta como médico para o paciente, sem o ser”, acrescenta o advogado, “além do exercício ilegal da medicina, em tese, também poderá incorrer no delito de estelionato”.

Quem determina os atos que são restritos aos médicos?

O debate sobre quais são os atos restritos à atividade médica está acalorado na última década, principalmente impulsionado pela febre dos procedimentos estéticos, como a harmonização facial, que custa entre R$ 1,5 mil e R$ 3 mil. Biomédicos, enfermeiros, farmacêuticos e fisioterapeutas estão de olho nesse mercado, com aval de seus respectivos conselhos.

Mas, o Conselho Federal de Medicina (CFM) tem buscado enquadrar a maioria desses atos como “invasivos” (procedimentos que envolvem intervenções mais profundas na pele ou no corpo e geralmente requerem a penetração por meio de incisões cirúrgicas ou injeções), o que colocaria pacientes em risco. É esse posicionamento que divide as entidades de classe de profissionais da saúde.

Não é apenas no ramo da estética que reside o imbróglio. Em outubro do ano passado, por exemplo, a Justiça determinou que outra enfermeira baiana parasse de realizar procedimentos como consulta e exames preventivos, inserção e retirada de DIU, consulta pré-natal, planejamento familiar e ultrassom em geral.

No perfil em uma rede social, ela se apresentava como “Dra. A.M. — Referência em Ginecologia e Obstetrícia”. No entendimento da juíza, a publicidade induzia o paciente a acreditar que ela era médica ginecologista e obstetra.

“Em princípio, discutia-se não existir uma clara definição em dispositivo legal com o intuito de delimitar as competências de cada profissão no âmbito estético, o que conduziu alguns conselhos profissionais a elaborarem resoluções dispondo sobre temas que foram considerados ‘procedimento estético invasivo’ pelo CFM”, relata o advogado especialista em Direito Médico René Viana.

O Judiciário, segundo ele, tem reconhecido procedimentos estéticos invasivos como atos exclusivos da medicina. “A matéria já foi apreciada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que, em lide envolvendo o Conselho Federal de Medicina e o Conselho Federal de Farmácia, empregou interpretação restritiva à execução de atos estéticos invasivos. Vale destacar que a atuação dos profissionais de odontologia não foi vedada, visto que essa mesma lei assegura o exercício profissional no âmbito de sua área de atuação”, destaca.

Como denunciar médico ilegal?

Acessar o site do CREMEB e preencher o formulário de denúncia na aba "Atendimento" -> "Denúncias"

Enviar a denúncia por escrito, digitada ou a punho, para a sede do CREMEB, localizada na Rua Guadalajara, 175, Morro do Gato, Barra, Salvador, BA, CEP: 40.140-460

Enviar a denúncia por e-mail para [email protected], de forma digital ou analógica, acompanhada de documento de identificação oficial com foto