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Gabriel Galo
Publicado em 14 de junho de 2019 às 05:01
- Atualizado há 2 anos
Integração mesmo, viva e pulsante, no mundo do futebol, são os campeonatos continentais. Porque transcende à questão territorial distante que se tromba a cada quatro anos e se despede cada qual ao seu canto. Não e nécaras.
Muitas vezes renegada, disputada por seleções B das grandes e de artilharia mundial, a Copa América tem ares de incompreendida. E é em meio aos traços inconfundíveis de suas gentes, que externam seu melhor em cada evento. A Copa América é, por assim dizer, a Copa do Nordeste do futebol mundial.
É reunião dos nossos, dos quase nossos. Não há a transposição fria de oceanos e mares a dividir aqui e acolá. É uma entidade única, tripa que no limite da geografia corre da Terra do Fogo ao Alasca, mas, para fins boleiros e geopolíticos, corta-se seco onde o dedo mindinho da América Central encosta na orelha da América do Sul.
Nossos são os outros também por proximidade afetiva. Nos verdes campos brasileiros de retângulos postos e sobrepostos, crescemos assistindo aos hermanos de continente envergando os mantos de nossas paixões. Quase todo plantel tem um estrangeiro para chamar de seu. Na trajetória, quase todos os clubes têm um gringo para abençoar a vestimenta a suor e sangue.
No que a Copa América parece ter sido constituída para dar vida a possibilidades de glória máxima a expoentes regionais do futebol, aos craques desconhecidos dos grandes centros, aos titãs de gerações que aceitam seu quinhão porque é a medida do possível. É o panteão onde os excluídos (pero no mucho) são exaltados.
Como haveria a história de negar, pois, uma Copa América a Romerito, herói do Fluminense carioca, campeão ainda adolescente pelo Paraguai em 1979? Como não elevar aos deuses em Machu Picchu uma estátua de Cubillas carregando o troféu de 1975? Como não afirmar que o auge do futebol boliviano se deu em 1963, ao confirmar em La Paz seu caneco?
Não haveria, ora, premiação do destino maior que a segunda geração de ouro do Chile pudesse, por fim, soltar o grito de vencedora? Ou quiçá a consolação à Colômbia, que passava o bastão de gerações no seu título em casa em 2001? Teria o Uruguai a mítica da raça não fosse o seu caminhão de taças, maiores vencedores que são?
A ausência de fronteiras torna, por vezes, complicado diferenciar onde o nosso quintal termina, a nação se forma e o próximo se avizinha. Nesta confusão do que pesa mais, Salvador vaiou a própria bandeira na última Copa América em território brasileiro, 30 anos atrás, numa Fonte Nova doída pela ausência de Charles.
Na confluência de querências líquidas, somos intrusos do português cercado por um mar de espanhol. Fazemo-nos, ainda assim, um só, em corpo e em alma. Se, por um lado, torcemos pela seleção canarinho, tudo bem sermos batidos por quem nos é mais bem quisto. E a fluidez da divisa faz os amantes de futebol se questionarem: não seria a hora de finalmente Messi ser campeão com a albiceleste? (Pensando melhor, que seja no ano que vem. Enquanto isso, bora, Brasil!).
A pelota vai rolar. A bênção, meus craques. Sejam bem-vindos todos a uma das mais lindas, genuínas e espontâneas festas do ludopédio. Saludos a la Copa América!
Gabriel Galo é escritor.