Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Waldeck Ornelas
Publicado em 22 de outubro de 2021 às 08:05
- Atualizado há 2 anos
Finalmente o Brasil se reencontra com os trilhos, resgatando a saga do Barão de Mauá. Ante a indisponibilidade de recursos públicos, prevalece a opção pela parceria de investimentos, mediante concessões e, agora, também pelo regime de autorização, por meio do qual ferrovias podem ser inteiramente privadas – do projeto à operação. A crise fiscal conspira para que o Brasil se modernize. >
Nesse novo ciclo ferroviário a Bahia está contemplada com a Ferrovia de Integração Oeste-Leste – FIOL, cujo trecho Ilhéus-Caetité, já licitado, foi assumido pela Bahia Mineração – BAMIN, também detentora do futuro Porto Sul. Assim, o projeto segue, nessa sua primeira etapa, a lógica porto-ferrovia-mina, mas não se esgota aí: sua extensão até Barreiras atenderá ao importante polo de grãos do Oeste baiano, que deu origem ao MATOPIBA, a última fronteira agrícola do país; numa terceira etapa alcançará a Ferrovia Norte-Sul – FNS, espinha dorsal do novo sistema ferroviário nacional, chegando a Figueirópolis, no Tocantins. >
Paralelamente, teve início também a implantação da Ferrovia de Integração do Centro-Oeste – FICO, que parte de Mara Rosa (GO), no eixo da FNS, vai inicialmente até Água Boa, já no Mato Grosso, para em seguida alcançar Lucas do Rio Verde, no mesmo estado. >
Os interesses estratégicos da Bahia demandam a integração da FIOL com a FICO, vendo-as como base da futura ferrovia Transulamericana – a interligação ferroviária do Atlântico ao Pacífico – donde a necessidade da ligação ser feita sem um passeio das cargas pela Norte-Sul (entre Mara Rosa e Figueirópolis), impondo-se a ligação direta Correntina (BA) – Mara Rosa. Neste cenário, é lógico assumir que o encontro da FICO-FIOL em Mara Rosa dispense a implantação do trecho Barreiras – Figueirópolis. >
Aliás, iniciadas as obras de implantação da FICO, a VLI logo apresentou pedido, no regime de autorização, para implantação do segundo trecho, entre Água Boa e Lucas do Rio Verde. O acesso a Lucas do Rio Verde escancara a disputa VLI x Rumo pela dominância dos mercados de carga ferroviária, no caso o transporte de grãos: a Rumo também deseja chegar a Lucas do Rio Verde, só que a partir de Rondonópolis, tendo assinado com o estado do Mato Grosso. É sinal de que a VLI almeja trazer esses grãos para o litoral. Mas para qual porto? >
Ocorre que a VLI tem uma relação equivocada com a Bahia. Como concessionária do Corredor Minas-Bahia, através da FCA, a VLI abandonou a malha ferroviária baiana à própria sorte por nada menos que meio século, deixando-a deteriorar-se até o estado precário em que atualmente se encontra. Agora quer a renovação antecipada da concessão sem sequer apresentar um plano de investimentos. >
Se é certo que, quando da privatização da antiga Rede Ferroviária Federal (1996), não existiam agência reguladora nem a obrigação de investimentos, isto agora é inaceitável e inadmissível. É indispensável a existência de um programa bem definido, que incorpore como primeira prioridade, na linha Sul, a variante do Paraguaçu, mas que inclua também o ramal ferroviário do Canal de Tráfego, a pera ferroviária do Porto de Aratu, a articulação funcional com a FIOL – onde inclusive existe trecho superposto – o ramal para Feira de Santana e a implantação do terceiro trilho; na linha Centro, a reativação do trecho Senhor do Bonfim a Juazeiro, o acesso ao porto fluvial e a recuperação de todo o percurso; na linha Norte, sua manutenção até Propriá (SE), indispensável para preservar a ligação ferroviária de Salvador com as demais capitais nordestinas. >
Não se conhece ainda as intenções da BAMIN em relação aos trechos 2 e 3 da FIOL, nem sobre sua integração com a FICO. Mas tem-se a certeza de que a VLI precisa se entender com a Bahia. Para tanto é preciso resgatar o Corredor Minas-Bahia e mirar a exportação pelos nossos portos. >
Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional. Autor de “Cidades e Municípios: gestão e planejamento”. >