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Pelô vivo: saiba de onde vem a tradição de curtir o São João no Pelourinho


 

Bairro histórico é um dos destinos preferidos de quem fica na capital e deseja fazer a festa em família

  • Larissa Almeida

Publicado em 15/06/2024 às 11:00:44
São João no Pelourinho. Crédito: Paula Fróes/CORREIO

Quem pisa no limite entre o asfalto e o chão de pedras na altura da Rua Chile, no Centro Histórico de Salvador, consegue ouvir, nos fins das tardes de junho, a musicalidade que é fruto da combinação da sanfona, do triângulo e do reco-reco. Alguns passos na direção do som levam à Praça da Sé, uma das estações da festividade junina que, desde o Dia de Santo Antônio, reúne forró raiz, opções de compras artesanais, comidas típicas e espaço para dançar o arrasta-pé no Pelourinho. Ao notar a movimentação no local, com pessoas de todas as idades ocupando o espaço, é difícil imaginar uma época em que a festa não existisse ali. Mas, ao contrário do que muitos pensam, a tradição de curtir o São João no Pelourinho é relativamente recente.

De acordo com o escritor e jornalista Nelson Cadena, colombiano que tem título de cidadão baiano, até a década de 90 o Pelourinho sequer era frequentado a ponto de ser considerado um local de festa. “O Pelourinho, por muito tempo, foi um espaço degradado da cidade de Salvador. Seria inviável fazer ali não apenas o São João, mas celebrar qualquer festa. As pessoas tinham se afastado, não frequentavam muito o bairro, porque era um espaço marcado pela violência e com um índice de prostituição muito alto. Estou falando isso antes da restauração, que ocorre no período de 1990 até 1992”, aponta.

Naquele período, a capital baiana como um todo não tinha tradição de realizar festas juninas. Não à toa, o São João era comemorado nos bairros pela meninada que juntava dinheiro para comprar fogos e por grupos de pessoas que preferiam não o forró, mas o samba para vivenciar a festividade. Esse era o caso do produtor e agitador cultural Geraldo Badá. “No meu tempo, o São João era nos bairros, com os samba-duro junino, que hoje, inclusive, é tombado pela lei municipal, e esses grupos estão vindo para o Pelourinho”, diz.

Depois da restauração concluída em 1992, o panorama do bairro histórico mudou. O local passou a receber turistas, a ser visitado pelos soteropolitanos e engatou, aos poucos, sua potência econômica. No entanto, só oito anos mais tarde passou a ter o São João como uma possibilidade. “O Governo do Estado resolveu, no ano 2000, já com o Pelourinho totalmente recuperado, já ambientado e com frequência tanto de turistas como de baianos, criar o São João do Pelourinho. [...] Eu acho que, pela própria característica depois da recuperação, ficou um espaço mais intimista, lembra um pouco uma cidade interior e um espaço bem acolhedor”, destaca Nelson Cadena.

Apesar da sensação de intimidade, durante os anos de realização da festa junina, a partir do ano 2000, o Pelourinho registrou alguns conflitos em relação à integridade do espaço, que é considerado patrimônio pelo Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e Unesco. Foi então que comerciantes locais criaram a Associação do Centro Histórico Empreendedor (Ache), que passou a rediscutir, junto à Prefeitura, a organização do São João no bairro.

“Nós priorizamos um São João mais pé de serra, mais família, sem violência e sem grandes tumultos. O São João do Pelourinho ficou uma coisa muito bacana. Muito modesta, mas que ao mesmo tempo atrai o soteropolitano que quer vir realmente só com sua família. Eu estou aqui há 25 anos e acho isso aqui uma relíquia, uma Champs-Élysées, uma Torre Eiffel, um Cristo Redentor, um Pão de Açúcar. O Centro Histórico é um lugar lindo e junto com o forró, eu adoro”, ressalta Alexsandro Ferreira, proprietário do Boteco do Pelourinho.

Com 50 anos de vida e de Pelourinho, o empresário Davi Costa, conta que viu a tradição junina nascer no seu hábitat natural conforme foi surgindo a necessidade de uma festa que fizesse contraste com os grandes shows que passaram a ser realizados no Parque de Exposições. “Dentro dessa necessidade, as festas de São João do Pelourinho foram criadas e, entre tentativas e erros, houve festas boas e festas ruins. Pela experiência que temos, sabemos hoje que não é salutar concentrar bandas que tragam grande número de público para cá”, afirma.

“O Pelourinho comporta, assim como no Carnaval, bandas de menor porte que tragam famílias. É hoje o público que temos hoje e que gostamos que tenha lá, que traga o resgate da roça, do interior, do milho e da canjica. [...] Eu curto que seja assim. Saio com a família, damos uma volta, vemos os pontos no Terreiro de Jesus, no Largo do Pelourinho, no Cruzeiro São Francisco, visitamos as praças, vamos até o Santo Antônio. Vemos o que está acontecendo em cada local desse, passeando, se misturando, comendo, tudo ao mesmo tempo, tudo junto e misturado. Curtimos dessa forma”, completa.

Morador do bairro da Saúde, no Centro Histórico, Josemir de Jesus, 58 anos, conta que não abre mão do forró do Pelô há mais de 20 anos. “Eu amo o São João pela gastronomia, pela música, pelo vestir mais elegante das pessoas. Isso é a transformação que o São João nos causa. Aqui no Pelourinho, o que me atrai é a diversidade. Hoje, estamos vendo um trio de forró, amanhã nós vamos ver bandas de axé tocando forró. Isso é cultural e só se vê aqui”, frisa.

Lista de 10 coisas imperdíveis para curtir no São João do Pelô:

1. Exposição de arte dos educandos do Projeto Axé: ‘Caminhos do Erê’, com miniaturas de igrejas e oratórios dedicados aos Santos Juninos.

Quando: 03 a 28/06, das 09h às 18h

Onde: Museu Eugênio Teixeira Leal - Rua do Açouguinho 01 - Pelourinho

  • 2. Participar da Dança da Laranja, competição de consiste em equilibrar uma laranja entre o queixo e o pescoço

Quando: 10 a 18 de junho, das 15h às 19h

Onde: No “Terreiro das Brincadeiras”, localizado no Terreiro de Jesus

  • 3. Levar as crianças e a família para o “Terreiro das Brincadeiras”, para participar do jogo de argolas, tomba lata, pescaria, barraca do beijo, pular na cama elástica e mais.

Quando: 10 a 18 de junho, das 15h às 19h

Onde: No “Terreiro das Brincadeiras”, localizado no Terreiro de Jesus

  • 4. Tomar um cravinho antes de se jogar no arrasta-pé

Quando: Segunda a sexta, das 11h às 20h; sábado e domingo, das 11h às 19h

Onde: Bar O Cravinho, no Largo Terreiro de Jesus

  • 5. Visitar a 9ª Edição da Exposição ANTONIOS, que homenageia o santinho mais amado do mundo

Quando: Sexta a domingo, das 16h às 19h

Onde: ME Ateliê da Fotografia, na Ladeira do Boqueirão, 6 - Santo Antônio Além do Carmo

  • 6. Tomar um cafezinho, quentão, chocolate quente e licores típicos vendido pelos carrinhos de café, que vão circular pelo Centro Histórico no clima de São João

  • 7. Comprar produtos artesanais, como mel, licor, acessórios e tapioca na feirinha da Elabore em Movimento

Quando: 13 a 24 de junho

  • 8. Experimentar o Bolo de milho com Gelato de Quentão na Tropicália Gelato & Café

Bolo de milho com Gelato de Quentão . Crédito: Divulgação

Preço: R$23

Horário: 9h30 às 19h

Onde: Tropicália Gelato & Café | Rua da Misericórdia, nº 7, loja 3 – em frente ao Museu da Misericórdia

  • 9. Experimentar a Amendoinzada da Cantina da Lua

Amendoinzada da Cantina da Lua. Crédito: Divulgação

Preço: R$60

Horário: 11h às 23h

Onde: Cantina da Lua | Praça 15 de Novembro, nº2, Terreiro de Jesus, Pelourinho

  • 10. Experimentar a Paçoca de Carne Seca do Boteco do Pelourinho

Paçoca de carne seca do Boteco do Pelourinho. Crédito: Divulgação 

Preço: R$89,00

Horário: 11h às 22h

Onde: Boteco do Pelourinho | Largo do Cruzeiro de São Francisco, nº 5 – Pelourinho

O Projeto São João 2024 é uma realização do jornal Correio com apoio do Sicoob.

*Com orientação da editora Mariana Rios