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Preconceito com exame cai, mas câncer de próstata ainda mata 3 baianos por dia


 

Bahia ainda não tem cirurgia com robô; incidência da doença é maior entre negros

  • Da Redação

Publicado em 11/11/2018 às 05:00:00
Atualizado em 19/04/2023 às 03:27:05
. Crédito: Foto: Evandro Veiga/Arquivo CORREIO

Quando se busca ajuda, é comum se pedir uma mãozinha. Mas nem precisa de uma mão inteira para conseguir auxílio na detecção do tipo de doença que mais mata os baianos: o câncer de próstata, responsável por três óbitos por dia no estado. Nesse caso, é necessário apenas um dedo e o mínimo instinto de sobrevivência para frear o avanço da neoplasia maligna no órgão reprodutor masculino, que vitimou 14,4% a mais num intervalo de sete anos e registra acréscimo de 8% no número de internações na Bahia, entre 2016 e 2017.

São tantas mortes que não dá pra contar nos dedos, como mostram os dados obtidos junto à Secretaria da Saúde do Estado (Sesab). Em todo o ano passado, 1.254 baianos perderam a guerra para a doença. Em 2018, até o último dia 5, já tinha sido contabilizados 895 óbitos, muitos dos casos certamente evitáveis, não fosse o tabu que envolve um simples exame que não dói e dura, no máximo, sete segundo: o toque retal.

E se muita gente não gosta de botar o dedo na ferida, no Novembro Azul, mês em que se lembra da importância do exame precoce, precisamos falar sobre essas dedadas que salvam vidas.“É importante explicar que a campanha não é de prevenção, porque não existe prevenção para câncer de próstata. A campanha é a necessidade de fazer o diagnóstico precoce, porque, com isso, temos mais de 90% de chance de cura”, explica o urologista Wagner Coêlho Porto, ex-vice-presidente da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU). Ele explica que, na verdade, antes do exame físico, há ainda duas etapas a ser cumpridas por todo homem a partir dos 50 anos - em alguns casos, citados mais abaixo, a partir dos 45 anos: a consulta urológica, que inclui a conversa com o médico, e depois o exame PSA, de análise sanguínea.

O cumprimento de somente duas das três etapas levou o operador de máquinas aposentado Carlos Oliveira, 67 anos, a só descobrir a doença quando ela já estava instalada. O primeiro exame de toque ele só fez há três anos, após mais de dez anos achando que bastava o exame de sangue.“Só fazia o PSA. Fui fazer o de toque há três anos, porque o médico já sentiu que tinha alguma coisa”, comentou o morador de Simões Filho, que operou a próstata há três meses no Hospital Santo Antônio, das Obras Sociais Irmã Dulce (Osid), em Salvador.Mas, seu Carlos, por que o senhor não fazia o exame de toque? Enxergava algum problema na situação? “Não. Eu não tenho nenhum tipo de preconceito. Se for pra descobrir algo que faz bem pra gente, eu acho que não tem problema”, destacou o aposentado, que faz fisioterapia em casa, na cidade de Simões Filho. 

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Internação Enquanto seu Carlos, por ser um caso menos grave, se trata na própria residência, a internação é compulsória para muitos pacientes com a doença, que é o segundo tipo de neoplasia maligna que mais leva pacientes aos hospitais da Bahia (9% dos casos este ano).

Na comparação dos últimos dois anos, também houve aumento na ocupação de leitos pelos pacientes com tumor maligno na próstata: em 2016, foram 2.566 internações (8,5% do total de pacientes com alguma neoplasia); já durante todo o ano passado, foram 2.624 internações (8,7% de leitos ocupados). Ao todo, as internações por câncer de todos os tipos, segundo a Sesab, totalizaram 30.246 em 2017.

A taxa de mortalidade da doença também é um destaque preocupante: se em 2010 eram registradas 14,6 mortes decorrentes do câncer na próstata, para cada 100 mil habitantes, esse índice chegou a 16,7 casos no ano passado (14,4% a mais), o que demonstra que a luta pela conscientização deve continuar firme.

Menos resistência Apesar dos números, o preconceito em relação ao exame de toque tem diminuído ano a ano, de acordo com Coêlho Porto.“Dez anos atrás, mais de 80% dos homens recusavam fazer o toque retal. Atualmente, mais de 80% pedem pra fazer exame urológico com o toque. Ou seja, há uma mudança do comportamento do homem sobre a necessidade de fazer o exame. O problema do homem era uma mudança de comportamento cultural e educativa”, afirma o urologista, que credita a ‘virada no jogo’ às campanhas de conscientização.Ainda assim, uma pesquisa encomendada pela SBU ao Datafolha, no ano passado, indica que 21% dos homens continuam a dizer que o exame de toque retal “não é coisa de homem”. Entre os entrevistados com mais de 60 anos, que fazem parte do grupo de risco, 38% disseram não achar o procedimento relevante.

E se o preconceito e o machismo ainda representam entraves para o diagnóstico precoce, que evita nove em cada dez mortes pela doença, tiramos algumas ‘dúvidas frequentes’ sobre o exame de toque com o urologista Bruno Falcão Santos, do Hospital das Clínicas (Hupes/Ufba). Leia no final da reportagem.

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Atrasada, Bahia ainda não realiza cirurgias com robô Existem três tipos principais de tratamento quando ocorre o diagnóstico de um tumor maligno na próstata, sendo o mais avançado, com a ajuda de um robô - tecnologia que chegou ao Brasil em 2009, mas ainda parece longe de aportar na Bahia.

De acordo com o urologista Nilo Jorge Leão, que já participou de mais de 200 cirurgias robóticas em outros estados, o robô, batizado de Da Vinci, “elimina o tremor da mão do cirurgião e os cortes são mais precisos”, fazendo com que o sucesso da intervenção seja maior e a recuperação do paciente idem. A intervenção, explica ele, é controlada através de um console (espécie de simulador), que dá uma visão 3D da área a ser operada, com ampliação da imagem em dez vezes.  O urologista Nilo Jorge Leão viaja para fazer cirurgias com robô (Foto: Evandro Veiga/CORREIO) “Já passou da hora de Salvador ter um robô como esse. Recife, Fortaleza e Belém já têm. Isso faria com que eu pare de viajar para São Paulo, mensalmente, para operar meus pacientes”, comenta o cirurgião, que coordena o Setor de Uro-oncologia da Osid. Atualmente, são 39 plataformas robóticas funcionando no país.“A recuperação e os resultados funcionais são muito acima da média”, destaca. O oncologista clínico Vinicius Carrera, da Clínica AMO, explica as demais formas de tratamento. “Quando descobre-se de forma precoce, o tumor é pouco agressivo. Neste caso, há uma modalidade muito adotada, que é a vigilância ativa. Isso nada mais é que monitorar o câncer, sem que ele necessariamente seja tratado, porque em muitos casos ele não tem a capacidade de se tornar mais agressivo e prejudicar o paciente”, conta.

A terceira alternativa é a radioterapia. “Esse tratamento envolve uma radiação dirigida de forma calculada para o tumor, poupando as áreas que não devem ser tratadas”, completa Carrera.

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Quem deve fazer o exame antes da hora Se você é do sexo masculino e acabar de virar um cinquentão, uma coisa a certa: a partir de agora, uma vez por ano, religiosamente, você terá de comparecer ao urologista para fazer uma consulta, com o bônus, quase certo, do exame de toque retal. No entanto, de acordo com a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), há uma minoria que precisa antecipar essa agenda em cinco anos.“Pacientes que tenham fatores de risco, como a população da raça negra (saiba mais abaixo), e pacientes que tenham histórias na família, como parentes de primeiro  ou segundo grau que tiveram a doença, devem passar a fazer a partir de 45 anos”, explica o urologista Bruno Falcão Santos.O colega dele, Wagner Coêlho Porto, concorda, e reforça que um outro grupo também precisa marcar na agenda a visita anual ao urologista a partir dos 45. “Estudos comprovam que além do fator hereditário e de indivíduos de raça negra, é bom incluir aí também os indivíduos obesos”, recomenda ele, explicando que, entre os homens acima do peso, a doença também costuma ser mais agressiva.   O urologista Wagner Coêlho Porto afirma que o preconceito com exame diminuiu bastante em 10 anos (Foto: Antonio Queirós/Arquivo CORREIO) “Para quem tem histórico de câncer de próstata na família, principalmente parentes de primeiro grau, como pai ou irmãos, o risco chega a ser seis vezes maior do que a população em geral”, reforça o urologista Nilo Jorge Leão. De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca),  em 2018, são previstos 68 mil novos casos da doença no país.

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Incidência é maior em homens negros Por algum motivo que a ciência ainda não explica, a incidência do câncer de próstata entre homens negros é bem maior em comparação com as demais etnias. Segundo o urologista Nilo Jorge Leão, essa constatação requer maior atenção à doença na cidade. “A gente sabe que Salvador tem a maior população negra fora da África, e o câncer nesse grupo costuma ser mais agressivo. Ou seja, são cânceres que matam mais”, destaca o médico, que coordena o Núcleo de Uro-oncologia das Obras Sociais Irmã Dulce. “Lá (na Osid), a gente observa muitos pacientes negros chegando com cânceres em estado mais avançado. Às vezes com metástase. Então, é importante lembrar que essa população deve procurar um urologista a partir dos 45 anos”, afirma.Quanto à explicação para essa incidência ser mais alta entre os negros, é escassa a literatura médica que trata do tema, mas para o urologista Bruno Falcão Santos, uma pista pode estar na genética. “O que a gente tem hoje em trabalhos é relacionando essa situação a uma questão genética, de alteração de alguns genes relacionados ao câncer”, diz.

Exemplos da diferença de incidência, no entanto, são diversos, como no livro ‘Oncologia, bases clínicas do tratamento’, de C.H. Barrios. A obra conta que a taxa da doença entre os negros nos EUA, na década de 1990, era de 79 casos para cada 100 mil homens, enquanto que, no Japão, a taxa não passava de 4 homens a cada 100 mil diagnosticados com a neoplasia.

De acordo com o IBGE, na Bahia, os homens negros (pretos e pardos) eram 39% da população total em 2017. Entre os homens, 80,5% eram negros, no estado. Em Salvador, os homens negros também eram 39% da população total e 84% da população masculina. No Brasil, os homens negros eram 27,2% do total da população e 56,3% da população masculina.

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Outras doenças atingem e matam homens Apesar de toda a mobilização pela quebra do preconceito sobre o exame de toque retal, a visita anual ao urologista também pode ajudar a diagnosticar outros tipos de câncer que atingem e matam os homens, como as neoplasias malignas no pênis ou nos testículos. Os principais sintomas, no caso do pênis, são feridas que não cicatrizam, aumento anormal do tecido da glande, surgimento de nódulos e gânglios inguinais na virilha.“É um tipo de câncer que hoje é raro no mundo, mas incidente no Brasil, principalmente nas regiões Norte e Nordeste”, explica Franz Campos, chefe do serviço de Urologia do Inca.Em Salvador, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) registrou 144 casos no ano passado e, até 18 de junho deste ano, 49.

Os mais atingidos são homens a partir dos 50 anos, mas os jovens precisam ficar atentos. A principal causa do tumor, segundo especialistas, é a má higiene íntima. Também é mais comum que a doença apareça em quem não fez a cirurgia de fimose para a retirada da pele que reveste a glande.

Para prevenir o câncer, é necessário higienizar bem a região genital, principalmente após relações sexuais ou masturbação. Além disso, é indicado o uso de preservativo durante o sexo. O tratamento varia de acordo com a gravidade do tumor e é feito com cirurgia, quimioterapia, radioterapia e, em caso mais graves, amputação do pênis.

O tumor no testículo também merece atenção. Segundo o Inca, cerca de 5% do total de casos de tumores malignos entre homens são desse tipo, e afeta de forma mais frequente quem já sofreu traumas na região, ou com idades entre 15 e 50 anos.

O autoexame, que é recomendado após o banho quente, deve ser feito a partir da adolescência como forma de prevenção e detecção precoce de qualquer alteração nos testículos. Se diagnosticado em fase inicial, o sucesso no tratamento é de cerca de 90%. Entre os sintomas que podem indicar algo errado estão o aumento de tamanho nos testículos, dor, desconforto e aparecimento de nódulos duros.

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Saiba onde fazer o exame em SalvadorHospital Santa Izabel - Realizou exames gratuitos no dia 8. Agora, atenderá pelo SUS apenas pacientes encaminhados pelos postos de saúde Hospital Aristides Maltez - Não está fazendo campanha do Novembro Azul. Não faz exame de toque, apenas o PSA, de segunda a sexta, com entrega de fichas a partir das 6h30 Hospital São Rafael - Faz exame de toque + consulta, porém só particular ou plano, a partir de R$ 300 Clínica AMO - Só faz consulta, a partir de R$ 300 Postos de saúde - Além do Dia D de conscientização sobre a doença, a rede municipal de saúde oferta 15 mil atendimentos durante o mês, para oportunizar o acesso aos exames de ultrassonografias e consultas. Os interessados devem realizar a marcação dos procedimentos em um dos 128 postos de saúde da rede básica municipal. ***

Tira-dúvidas sobre o exame de toque

As respostas são de Bruno Falcão Santos, urologista do Hupes e diretor financeiro da SBU-BA.

- O exame de toque retal dói? Os pacientes reclamam de dor durante o exame? Não. O exame, quando há dor, tem alguma coisa alterada. A dor está relacionada mais a problema do reto, do início, não é nem da próstata. O exame de rastreamento que a gente faz ele não dói, ele incomoda. Se o paciente sente dor, ele deve informar ao médico. Mas, para desmistificar, é um exame indolor.

- Quanto tempo dura, em média, o exame? Ele demora entre cinco e sete segundos.

- Usa-se lubrificante, luvas? Usa-se luvas de procedimento, de látex. E utiliza-se ou lubrificante, que é a vaselina, ou pode-se utilizar lidocaína, uma pomada.

- Existe auto-exame de próstata? Não, até porque não é um exame fácil de se fazer. Da forma que é feito é complicado para fazer sozinho.

- Todos os homens devem fazer o exame? Se sim, a partir de que idade e com que frequência? A SBU preconiza que deva ser feito em todos os homens com 50 anos ou mais. Pacientes que tenham fatores de risco, como a população da raça negra, e pacientes que tenham histórias na família - parentes de 1º ou 2º grau -, devem passar a fazer a partir de 45 anos.

- Só o exame PSA já resolve, ou deve-se fazer outros procedimentos para verificar se a doença existe? Não. Se faz necessário o exame de toque também. Se fizermos só o PSA, vamos deixar de diagnosticar na faixa de 20% dos pacientes. Nós temos hoje, além do PSA e do toque, que são exames de rastreamento, depois deles temos outros: o ultrassom da próstata, a biópsia da próstata e cada vez mais temos usado a ressonância magnética da próstata. Neste último caso, temos usado há cerca de três anos.

- O exame pode deixar o homem impotente ou infértil? Não. O exame de toque não tem contraindicações ou complicações. Não vai deixar infértil, não vai deixar 'menos homem', ou 'brocha'.

- Há relatos de casos em que um hétero se ‘descobriu’ gay após o exame? Não. Não tem relatos. Se a pessoa tem o desejo, não vai ser esse exame que, como dizem, tirá-lo do armário. É uma coisa muito rápida e não chega a prazer. Antigamente se exigia a massagem prostática em algumas patologias, que era um exame mais prolongado, mas nesse caso não dá pra sentir nem dor, nem prazer.

- Dizem que quem faz sexo anal tem menor chance de ter a doença, porque a próstata é sempre massageada. É verdade? Não. Isso é mito. Não tem nenhuma relação com massagem a prevenção do câncer de próstata.

- A doença sempre apresenta sintomas? Na maioria das vezes, ela é silenciosa. Quando apresenta sintomas, pode ser incurável. Por isso que precisamos investigar sem sintomas. Lógico, se tiver sintoma, pode não estar relacionado com o câncer. A próstata pode ter outras doenças. Uma delas é a hiperplasia prostática benigna, que é o crescimento benigno da próstata. O paciente fica com vontade de urinar várias vezes, com o chato fraco, e isso tem tratamento.