Jovem morto pela PM em Pirajá tinha sonho de ser policial militar
Polícia afirma que morte ocorreu durante troca de tiros, mas família acredita em execução
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Da Redação
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Foto: Acervo da família Desde criança, Vitor Santos Ferreira de Jesus, 25 anos, tinha o sonho de ser policial militar. Mas entre a noite do domingo (26) e a madrugada da segunda-feira (27), o jovem morreu após ser baleado, segundo testemunhas, por policiais militares da 9ª Companhia Independente de Polícia Militar (CIPM/ Pirajá). Elas afirmam que os membros da corporação falaram para Vitor, que já estava ferido, se ajoelhar e, então, atiraram novamente na vítima.
O caso ocorreu durante uma ação policial em um paredão na localidade conhecida como Invasão da Osório, que fica em Campinas de Pirajá. De acordo com um familiar, Vítor teria passado na festa depois de sair do trabalho em um mercado. O último contato com o jovem teria acontecido por volta da meia-noite.
“Relatos de amigos e pessoas que estavam no local contam que os policiais entraram na localidade efetuando disparos, sem perguntar nada. Muita gente saiu correndo, mas Vitor não tinha nada a dever e saiu andando. Ele foi alvejado na perna. Depois, mandaram ele se ajoelhar e deram um outro tiro no abdômen dele. Uma outra viatura chegou para levar o corpo de Vitor”, disse o parente, que não quis se identificar.
A família acredita que o jovem foi executado. De acordo com o familiar, a polícia tem entrado na comunidade atirando desde que um policial foi baleado durante uma operação no local.
Um vídeo gravado durante a ação mostra policiais militares agrupados ao redor de Vitor, que estava caído no chão. Uma viatura da PM chega ao local e os agentes abrem o fundo do carro.
O autor do vídeo pontua que o jovem estava baleado no momento que o carro chegou. “A pessoa que filmou parou de gravar por medo. Quando a viatura chegou, os policiais mandaram ele se ajoelhar e deram mais disparos”, contou o familiar. Jovem trabalhava como empacotador e motorista em mercado (Foto: Reprodução) Em nota, a PM afirma que policiais militares foram até o local após serem acionados pelo Cicom para atender a uma denúncia de som alto provocado por um “paredão” na Invasão da Osório, por volta das 23h30 de domingo (26).
Os policiais relataram que todas as pessoas presentes fugiram do local ao avistarem a presença da viatura. Nesse momento, um grupo de homens armados teriam efetuado disparos contra os militares, que revidaram.
Ao saber do ocorrido, a mãe do jovem foi atrás da viatura junto com um amigo da vítima, contou a fonte. “Eles encontraram uma viatura parada com o pneu furado na Estrada do Derba. No começo, eles negaram envolvimento com a ação, mas, depois da mãe mostrar os documentos do filho, um policial disse que um meliante tinha sido alvejado durante uma troca de tiros na comunidade”, relatou, ressaltando que Vítor era trabalhador, não usava drogas e não tinha passagem pela polícia.
Socorro A vítima foi levada para o Hospital do Subúrbio, que informou que o jovem já chegou ao local sem vida. “Inicialmente, o hospital disse que ele não tinha dado entrada até que as pessoas que estavam na porta disseram ter visto um jovem baleado sendo levado para o local. Ele tinha três perfurações de bala no corpo”, contou com pesar.
Durante a varredura do local, os policiais encontraram um indivíduo ferido, informou a nota da corporação. De acordo com a PM, a guarnição prestou socorro à vítima até o Hospital do Subúrbio, que, no entanto, não resistiu aos ferimentos. A ocorrência foi registrada na Corregedoria Geral da Polícia Militar.
A Polícia Militar afirma ainda ter encontrado um revólver calibre 38, um carregador calibre 09 mm alongado com 12 munições, 172 pinos de cocaína, 67 papelotes de maconha e 31 pinos de maconha com a vítima. Diferente do que aponta a corporação, o familiar ressaltou que a perícia não encontrou vestígio de pólvora nas mãos do jovem.
Em busca de um esclarecimento da situação, a família prestou queixa do caso na corregedoria da Polícia Militar. Eles também pretendem contratar um advogado para dar entrada em um processo judicial contra os envolvidos.
“Como somos humildes, sabemos que o inquérito, geralmente, fica em aberto a vida toda. Pedimos apoio para cobrar um desfecho para o caso. Com tudo que aconteceu, todos estão muito abalados e ainda não foi possível abrir um processo contra a polícia”, relatou o familiar.
O jovem foi enterrado às 14h de terça-feira (28), no Cemitério Quinta dos Lázaros, na capital baiana.
Sonho de ser polícial Desde o começo do ano, Vítor fazia cursinho para prestar concurso público para a polícia e realizar o sonho de infância de ajudar os outros. “Ele sempre teve admiração por policial. Ele queria ser Policial Militar, mas iria para o concurso que passasse”, disse o familiar.
Nem a pandemia e a suspensão do cursinho presencial impediram os estudos. Durante a manhã, o jovem trabalhava como empacotador e motorista no mercado Araújo, em Marechal Rondon, e estudava no restante do dia.
A vontade de fazer parte da Polícia Militar só aumentou quando o jovem ingressou no exército, de onde saiu há cerca de dois anos.“Depois da experiência no Exército, ele passou a se dedicar e acreditar no sonho de ser policial. Ele era muito prestativo, gostava de ajudar os outros e adorava fazer favor”, relembrou o parente.Nascido e criado em Marechal Rondon, Vitor morava há 4 anos com a namorada em uma casa no bairro. Quando não estava trabalhando ou estudando, o jovem gostava de empinar pipa e jogar futebol.
Muito querido pelos amigos e pela família, a morte deixou todos abalados. A mãe do jovem está arrasada com a morte do seu único filho. “Ela tem problema de coração e está em um estado vegetativo até o momento.Ela nem consegue comer, só chora. Está sendo muito difícil”, disse um parente.
Vitor é lembrado como uma pessoa alegre e brincalhona. Em homenagem à vítima, os amigos fizeram uma vídeo de despedida. “Ele fazia amizade fácil. Todo mundo gostava dele, inclusive no mercado. O gerente era muito amigo dele. Vítor era muito engraçado e as pessoas filmavam muito as brincadeiras que ele fazia”, disse a fonte da família.
*Com orientação da subeditora Fernanda Varela