‘Um ataque racial em curso’, diz especialista sobre tiroteios no entorno das escolas em bairros de maioria negra
Pesquisador Dudu Ribeiro vê distribuição desigual da violência como plano de dominação do negro baiano
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Larissa Almeida
lpalmeida@redebahia.com.br
Os bairros de maioria negra são mais afetados pelos tiroteios no entorno das escolas de Salvador do que os bairros com população negra abaixo da média da capital. Isso é o que revela um estudo feito pelo Instituto Fogo Cruzado e pela Iniciativa Negra por uma Nova Política de Drogas. Para Dudu Ribeiro, que é integrante da Rede de Observatórios da Segurança e pesquisador da Iniciativa Negra, os resultados do estudo revelam que a violência atinge a população negra de maneira mais incisiva por conta do modelo adotado pela segurança pública, mas também pelo modo de organização da sociedade.
“Há um ataque racial em curso e ele se apresenta tanto do ponto de vista das estatísticas criminais, como do ponto de vista da relação da segurança pública com a educação. Nós estamos falando de uma cidade que, apesar de majoritariamente negra, tem uma maioria branca que concentra a maioria da riqueza produzida por essa cidade. Esse é um projeto de dominação atualizado pela guerra às drogas, que participa de forma central na distribuição desigual de cidadania”, analisa o especialista.
Onze dos 124 bairros de Salvador que tiveram tiroteios próximos a escolas no período concentram 34% dos tiroteios. Os bairros de Fazenda Grande do Retiro, Beiru/Tancredo Neves e Castelo Branco foram os três mais atingidos. Todos têm população negra acima da média do município, que é de 79,48%, de acordo com dados do Censo de 2010. A pesquisa considerou os tiroteios ocorridos entre 4 de julho de 2022 e 30 de agosto de 2024, durante dias e horários letivos.
Dudu Ribeiro aponta que os bairros com mais episódios de tiroteios no entorno das escolas também figuram em outros monitoramentos do Instituto Fogo Cruzado e da Iniciativa Negra, o que os consolida como localidades ocupadas pela violência. “Há um ciclo que atinge determinados locais e ele pode, inclusive, em um momento seguinte, ser transferido para outras localidades com as mesmas características de localidades grandes e periféricas, com precariedade se serviços públicos e proporção populacional com maioria negra”, pontua.
O especialista adiantou que na próxima etapa do estudo os pesquisadores vão se debruçar sobre os impactos desses tiroteios para a comunidade escolar. O objetivo é auxiliar a construção de políticas pública para reduzir os danos causados pela violência armada, promover o diálogo entre a população afetada e os agentes de segurança, e conseguir a colaboração de mais agentes.
“É fundamental que nós, cada vez mais, possamos reforçar a ideia de que segurança pública não pode ser mais um caso só de polícia. A entrada da secretaria de educação estadual e municipal nesse debate muito vai nos ajudar a pensar a questão da violência a partir da perspectiva dos educadores e educadoras, das mães e pais que acompanham os filhos nas escolas e dos próprios adolescentes”, finaliza.