Templo secular escolhido pelo povo, Basílica do Bonfim completa 270 anos
A igreja foi inaugurada em 24 de junho de 1754, depois de nove anos de construção
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Maysa Polcri
maysa.polcri@redebahia.com.br
Quando foi finalmente inaugurada para o povo baiano, em 24 de junho de 1754, não se sabia ao certo qual seria o futuro da Igreja do Senhor do Bonfim. A Colina Sagrada, escolhida para abrigar o templo religioso, ficava distante da área mais movimentada de Salvador na época, o Centro Histórico. Mas, ao longo dos seus 270 anos de história, a igreja caiu nas graças dos moradores da capital baiana e de um país inteiro.
Foram nove anos de obras até que a igreja, elevada à condição de basílica em 1927, pudesse ser finalmente aberta ao público. A proposta de construção do templo foi do capitão português e traficante de pessoas escravizadas Theodósio Rodrigues de Faria. A igreja deveria abrigar a imagem de Jesus Cristo crucificado, depois que o europeu sobreviveu a uma tempestade em alto mar.
A construção logo atraiu pessoas para a localidade até então pouco habitada de Salvador, como explica o historiador Murilo Mello. “O Bonfim era uma região afastada do centro da cidade e pouco povoada, já que a ocupação maior era próximo às praias. Na época, se acreditava que, por ser um local ventilado, as doenças seriam bem tratadas lá. Tinha uma mata de difícil acesso, onde hoje conhecemos como Avenida dos Dendezeiros”, contextualiza.
“A Igreja do Bonfim trouxe um povoamento muito maior para a região. Casas foram construídas para receber os romeiros que vinham pagar promessas e isso trouxe um desenvolvimento para essa área, que se tornou um ponto turístico”, completa Murilo Mello. Todos os anos, a Lavagem do Bonfim atrai milhares de fiéis e curiosos no percurso entre a Igreja da Conceição da Praia e a Basílica do Bonfim.
É quando uma réplica da imagem do Cristo crucificado, aquela que veio por ordem do capitão português, sai carregada pelos devotos até a Colina Sagrada. Apesar de a estátua original continuar instalada no topo do altar da basílica, seu dublê que, na verdade, deixa o templo sagrado para transitar na cidade. Ao longo de quase três séculos, a imagem original só deixou seu lar 13 vezes, sendo uma delas no primeiro centenário de independência da Bahia.
Entre março e abril de 2019, os fiéis puderam chegar perto da estátua pela primeira vez neste século. A imagem foi retirada do altar-mor, em celebração da Jornada de Veneração à Santa Cruz do Bonfim. Sempre que alguma ocasião como essa acontece, a imagem é acompanhada por um membro da Devoção do Senhor Bom do Bonfim. O grupo de devotos tem a missão de resguardar o maior símbolo do templo, como explica Josias Sousa, irmão estatutário da devoção.
“Aqueles e aquelas que participam da devoção são considerados guardiões da imagem do Senhor do Bonfim, com o propósito de zelo e adoração a essa imagem, que está aqui há 270 anos. Cada dia mais temos visto a ampliação de devotos em todo mundo”, diz Josias Sousa. Atualmente, um imbróglio judicial entre a devoção e a Arquidiocese de Salvador tem causado divergências sobre a condução do templo.
No dia em que a igreja completou 270 anos de inauguração, uma missa foi presidida pelo padre Antônio Andrade Xavier, vice-reitor da basílica. Apesar de lembrar aos fiéis do aniversário, a missa foi feita em homenagem a São João Batista, profeta que tem como data de nascimento o dia 24 de junho. Sem saber que divide a data de aniversário com a inauguração do templo, a psicóloga Jeane Dias Braydi foi pedir bênçãos no dia em que completou 61 anos.
“Costumo viajar sempre no São João, mas, dessa vez, decidi comemorar meu aniversário em Salvador, nesta igreja. Não sabia que era a mesma data da inauguração. Isso torna tudo ainda mais especial”, celebrou Jeane, que recebeu uma canção de parabéns com outros aniversariantes que estiveram no templo na segunda-feira (24). No dia 7 de julho (domingo), uma missa especial, presidida pelo Cardeal Dom Sergio da Rocha, às 7h30, vai celebrar os 270 anos da igreja.
Para o padre Edson Menezes, reitor da Basílica do Bonfim, foi a participação do povo que garantiu que a igreja se tornasse um símbolo tão presente para Salvador. “Um santuário pode ser instituído pela igreja, mas ele também pode ser eleito para o povo e foi isso que aconteceu com a Igreja do Bonfim. O povo, ao criar o hábito de participar das missas e fazer as romarias, deu ao templo a característica de santuário”, diz.