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Professores indígenas ganham R$ 3 mil a menos que os demais na Bahia


 

Na rede estadual, enquanto docentes de outras etnias recebem R$ 4,4 mil por 40 horas semanais, os indígenas têm salário-base de R$ 1,2 mil; disparidade nos vencimentos também avança em outras funções

  • Yasmin Oliveira

Salvador
Publicado em 03/04/2024 às 05:00:00
A disparidade salarial entre professores indígenas e não indígenas passa de R$ 3 mil. Crédito: Amanda Chung/SECBA

Na gestão de Jerônimo Rodrigues (PT), que é o primeiro governador indígena da Bahia, os professores com carreira indígena enfrentam uma disparidade salarial significativa. Enquanto os professores não indígenas recebem um salário-base de R$ 4.420,55 para uma carga horária de 40 horas semanais, os docentes indígenas recebem apenas R$ 1.253,12. Isso destaca uma diferença de R$ 3.167,43 entre os dois grupos de educadores.

Os professores indígenas ingressaram na rede estadual de ensino no concurso público de 2014 e, desde 2016, reivindicam uma equiparação do salário. A carreira para os docentes desta etnia foi criada em 2011, a partir da Lei 12.046, e foi necessária uma nova luta para que um concurso fosse realizado dois anos depois. Durante os quase 18 anos de governos petistas, este foi o único processo seletivo destinado aos educadores indígenas. O certame ocorreu em janeiro de 2014 e a efetivação dos selecionados para atuar nas 27 escolas destinadas aos povos originários aconteceu apenas em setembro do mesmo ano.

“Tem escolas que só há (professores) indígenas e tem outras que houve a necessidade de acrescentar não indígenas. Podemos ensinar em escolas não indígenas também por sermos da rede do estado da Bahia, porém,só em casos diversos, por precisarmos sair da aldeia para outros fins”, explicou Verônica Pataxó, do povo Pataxó de Coroa Vermelha, aldeia localizada na cidade de Santa Cruz de Cabrália, no Extremo Sul da Bahia.

A progressão dentro da carreira de professor indígena traz salários bastante inferiores quando comparados ao docente não indígena com o mesmo título. Rodolfo Moreira, professor pertencente à etnia Kaimbé da região de Euclides da Cunha, relatou que a disparidade em seu rendimento como diretor em uma escola de médio porte é de R$ 2.236,26 em comparação com um diretor não indígena em um colégio de tamanho similar.

por

Rodolfo Moreira

"Recebemos um salário abaixo do salário mínimo e líquido, sem nenhuma gratificação, sem nenhum benefício "

“Os gestores, por exemplo, recebem menos que qualquer gestor de outra escola, mesmo tendo o mesmo porte. Não tem as porcentagens que todos os outros recebem a mais. Então, nós recebemos ali um salário abaixo do salário-mínimo e líquido, sem nenhuma gratificação, sem nenhum benefício, mesmo estando numa carreira de efetivo”, disse.

Com o passar dos anos, segundo ele, diversos docentes indígenas fizeram cursos e novas pós-graduações, mas não houve aumento salarial. “A gente quer receber minimamente um valor que seja de acordo com a classe. Quando você diz assim: ‘eu sou efetivo do governo do Estado’, você tem uma visão de que a pessoa ao menos tem um salário decente, tem um valor que possa receber com decência do seu trabalho. E a gente hoje não sente isso, a gente sente uma indiferença com os professores indígenas”, disse Rodolfo, ao ressaltar que há 100 professores indígenas efetivos na Bahia.

Rodolfo Moreira disse ainda que a Secretaria de Administração do Estado da Bahia (Saeb) junto com a Procuradoria Geral do Estado (PGE) e a Secretaria de Educação do Estado da Bahia (SEC) discutem uma nova base salarial para a categoria. A reportagem questionou aos órgãos como está o andamento desta nova tabela de valores, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição.

“O Estado alega que a nossa lei não aceita formação em licenciaturas que não seja a licenciatura intercultural para professor indígena. Um curso que só possui a Uneb e o Ifba ofertam na Bahia. Isso significa que quem fez licenciatura, que não seja intercultural, recebe como um professor não licenciado. Ou seja, recebe como professor nível médio, um salário-mínimo”, afirmou a professora indígena Arissana Braz.

Os docentes da carreira indígena recebem o pagamento de seu salário na forma de um subsídio. O valor não agrega o vencimento, abonos e as atividades complementares. Segundo Arissana Braz, pelas atividades complementares, os professores não indígenas recebem na rede estadual cerca de R$ 600.

A professora disse ainda que o Fórum de Educação Escolar Indígena (Fórumeiba) já elaborou um projeto de lei para alterar a legislação de 2011. Uma reunião foi feita entre a Secretaria de Educação e o Fórumeiba na semana passada para discutir o pleito dos docentes indígenas, mas eles temem que com a aproximação do período eleitoral a proposta seja esquecida e nem levada para a votação na Assembleia Legislativa da Bahia (Alba).

“A gente pede alteração para que os professores, tanto os que têm licenciatura intercultural, específica a professor indígena, como os outros que têm licenciatura feita em qualquer universidade pública ou privada, tenham direito a um salário como professor licenciado”, relatou Arissana.

Até o fechamento desta edição, a Saeb, a SEC e a PGE não se manifestaram sobre a cobrança dos professores indígenas.

*Com orientação do editor Rodrigo Daniel Silva