Prédio que desabou foi construído sobre um córrego na Baixa do Tubo
Obra era irregular e não teve acompanhamento de profissional habilitado
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Gil Santos
gilvan.santos@redebahia.com.br
Foi tudo muito rápido. Primeiro, a estrutura colapsou na base. Em seguida o prédio de dois andares foi cedendo e desmoronando por cima da loja de estofados que ficava no térreo e da garagem onde estava estacionada uma Mercedes. O acidente aconteceu no cruzamento das Ruas Edson Saldanha e Antônio Viana, em Cosme de Farias, na noite de domingo (3). Apesar do susto, ninguém ficou ferido.
Moradores contaram que há cerca de cinco anos um pequeno sobrado foi construído às margens do córrego que corta o bairro, e que nos últimos meses o proprietário resolveu ampliar a estrutura construindo um anexo em direção às águas. A estrutura tinha térreo e dois pavimentos superiores. Na parte de baixo, o espaço foi alugado para Ubiraci Santos, 64 anos, que montou uma loja de estofados. Ele estava em casa, no Cabula, quando recebeu a ligação dos vizinhos.
“Me disseram que o prédio tinha desabado, eu vim correndo e quando cheguei aqui já estava tudo destruído. Ainda não sei o tamanho do prejuízo, mas na loja tinha máquinas, diversos equipamentos e os materiais dos clientes. Espero consegui resgatar pelo menos a minha caixa de ferramentas", contou enquanto observava o trator recolhendo os escombros.
Moradores disseram que primeiro houve um estalo, e depois, o barulho da estrutura caindo. Era por volta das 20h30. A parede da direita permaneceu inteira, mas tombou sobre os destroços. O impacto atingiu a área de serviço da casa do motoboy Jadson Souza, 29 anos, que ficava ao lado do sobrado. Ele estava na rua no momento do acidente.
“Entortou a grade da janela e destruiu parte da parede, mas a Codesal já avaliou e disse que não corre risco de desabamento, porque a estrutura não foi afetada. Não tinha ninguém em casa na hora”, disse.
Além do trator, trabalhadores precisaram usar picaretas para conseguir quebrar parte dos escombros e desobstruir a rua. Emocionada, a manicure Lucimara Soares, 27 anos, assistiu a cena acompanhada por amigas e familiares. Ela morava no segundo andar e perdeu todos os móveis e eletrodomésticos.
“Eu saí no final do dia, com alguns amigos, e algumas horas depois me ligaram. Eu pensei que fosse alguma coisa com minha avó, mas quando cheguei aqui foi essa tragédia. Morava há cerca de dois anos, sozinha. Minha casa estava toda montada, e perdi tudo”, disse. Ela passou a noite na casa da avó, no mesmo bairro.
Lucimara contou que sentia abalos na estrutura durante a obra de ampliação do prédio, mas acreditava que fosse comum. A moradora não percebeu rachaduras e nem outros problemas estruturais. O auxiliar de depósito Cléber Júnior, 25 anos, morava no primeiro andar do prédio que cedeu e também não notou mudanças no edifício.
“Estava na igreja e quando encerrou o culto recebi ligações de minha mãe e de colgas avisando que a casa em que eu estava morando de aluguel tinha desabado. Estava há três anos aqui, mas não tinha notado nenhum problema na estrutura”, contou.
Durante a retirada dos destroços, outras pessoas se arriscaram para recolher fios e objetos de alumínio. Documentos foram encontrados e devolvidos aos locatários. O proprietário do prédio não foi localizado. Segundo os moradores, ele mora no mesmo bairro, mas não estava em casa e nem atendeu às ligações. O carro dele, que segundo testemunhas era uma Mercedes, foi soterrado pelos escombros.
O subprefeito Alan Muniz acompanhou o serviço de limpeza e explicou que a construção irregular em cima do canal pode ter contribuído para a tragédia. “Os locatórios compareceram junto com a Defesa Civil e o Corpo de Bombeiros, que trouxeram cães farejadores para ver se tinha alguma vítima, mas não teve. Fizemos o isolamento e depois a retirada dos escombros”, disse.
No momento do acidente a igreja que ficava ao lado do prédio estava em culto e houve correria. Moradores relataram cheio forte de gás. Os escombros obstruíram a passagem da água do canal, o que reteve o volume, fez o córrego transbordar e deixou moradores preocupados. O fluxo voltou a fluir, mas o local ainda precisa ser liberado.
Em nota, a Defesa Civil de Salvador (Codesal) informou que vistoriou o imóvel e confirmou que ele foi construído irregularmente e sem o acompanhamento de técnico habilitado. O CORREIO não conseguiu contato com o proprietário do prédio.