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Líder comunitário, Dom Márcio realizava até seis casamentos por semana


 

O padre era conhecido por realizar ações em prol da comunidade de Campinas de Pirajá

  • Gilberto Barbosa

Publicado em 08/03/2024 às 06:15:00
Dom Márcio celebrou mais de 1000 casamentos. Crédito: Reprodução/Instagram

Um líder comunitário, uma pessoa sorridente que conduzia as suas palavras de uma maneira única. Essas foram algumas palavras usadas para descrever o padre Dom Márcio Tranquilli. Responsável por mais de 1000 cerimônias, entre casamentos e batizados, ele faleceu aos 52 anos na última quarta-feira (6) durante o tratamento de um câncer no intestino.

Dom Márcio começou na igreja aos 12 anos na Paróquia de São Paulo, no bairro do IAPI. Criado na Igreja Católica Apostólica Romana, ele seguiu seu caminho pela Igreja Católica Apostólica Independente de Tradição Salomoniana (ICAI-TS), uma vertente do catolicismo que surgiu dos ideais de Dom Salomão Ferraz, um bispo do Rio de Janeiro.

“Ele teve algumas diferenças em relação a doutrina de Roma e foi seguindo pela igreja independente. Mesmo assim, ele sempre trabalhou muito pelo diálogo inter-religioso", afirmou Ademar Costa Filho, ministro de música da paróquia.

Ele atuava há quase 30 anos na Paróquia Nossa Senhora das Candeias, no bairro de Campinas de Pirajá e era visto como uma liderança na região.

"Ele praticamente não dormia para atender as demandas do pessoal. Antigamente o local era chamado de ‘melado’ porque as pessoas não conseguiam sair em época de chuva. Ele correu atrás e com muito esforço conseguiu fazer que a rua fosse asfaltada”, lembrou Ademar.

Ele começou a acompanhar Dom Márcio nas cerimônias ainda na juventude. Ele começou no canto, mas aprendeu a tocar violão incentivado pelo sacerdote. Ele conta que o padre já fez mais de seis eventos em uma semana.

“Ele foi um dos padres que mais fez casamentos na Bahia. Era uma pessoa que conduzia a cerimônia de um jeito diferente. A forma de falar, de tocar o coração das pessoas fazia com que o boca a boca acontecesse. Quem se casava com ele queria que ele fizesse todas as outras cerimônias da família”, disse.

Um dos casamentos celebrados por Dom Márcio foi o da jornalista Ana Virgínia Vilalva, em maio de 2019. Ela conheceu o padre através de amigos e se reuniu com o clérigo dois meses antes da cerimônia, para contar a história do casal. O encontro durou cerca de duas horas e após o casamento, ela passou a acompanhar o padre pelas redes sociais.

“Saber da sua passagem repentina foi um choque, porque não sabia de enfermidade. Sempre sorridente, ele nos deu a benção, nos aconselhou e participou daquele que considero um dos dias mais felizes da minha vida. E é assim que quero lembrar dele: sorrindo e dividindo conosco a nossa felicidade”, afirmou.

Angélica Sá foi a secretária pessoal de Dom Márcio durante o tempo dele na paróquia. Ela compara o padre ao personagem Robin Hood e conta que quando ele fazia o casamento de pessoas com mais poder aquisitivo, tentava converter a ocasião em benefícios para a comunidade.

“Ele tinha muita sede em fazer algo em prol da comunidade. Quem chegasse na paróquia era atendido. Ele fez muitas coisas como sopa comunitária, cursos de informática, aulas de música, cesta básica e doação de brinquedos. Nesse ano, ele já tinha preparado o peixe para a semana santa”, explicou.

No último mês de novembro, ele descobriu um câncer no intestino. Apesar do tratamento, a doença evoluiu de maneira rápida. Ainda assim, o padre não mudou a sua agenda e seguiu com seus compromissos na igreja.

“De início foi um choque, mas depois não dava para perceber que ele estava doente. Ele saiu do hospital pensando no Natal, preparou a festa da padroeira e fez a missa campal em cima de um mini trio. Ele era ligado no 220 [volts] e fazia tudo como se fosse a primeira vez”, contou Angélica.

No dia 23 de fevereiro Dom Márcio celebrou sua última missa. A situação se agravou na última quinta-feira (29) e ele deu entrada no Hospital Santa Isabel, onde ficou até a sua morte, na última quarta-feira (06). O anúncio foi feito no Instagram pessoal de Dom Márcio e causou grande comoção entre os seguidores.

“Era uma pessoa fora do comum. A gente viveu de tudo que você possa imaginar. Ele foi um mentor, professor, até mesmo um pai para mim. Todas as experiencias que eu tive na vida nasceram de coisas que ele me ensinou. Tem sido muito difícil e vai ser assim por muito tempo”, finalizou Ademar.

*Com orientação da subeditora Fernanda Varela