Família lota Igreja do Bonfim em missa do 7° dia de Mãe Bernadete e neto relembra crime: 'Momento de terror'
Parentes pediram justiça pela líder quilombola e também pelo filho dela, Binho, morto em 2017
-
Wendel de Novais
wendel.novais@redebahia.com.br
Wellington Pacífico, neto de Mãe Bernadete, relembrou a morte da avó e pediu justiça nesta quinta-feira (24), sete dias depois do crime. Ele participou hoje, ao lado de familiares e amigos, de uma missa na Igreja do Bonfim, na Colina Sagrada, que marcou a data.
"Infelizmente hoje faz sete dias que perdi minha avó. Foi um momento de terror, um pesadelo, porque naquele momento eu era o único adulto que poderia tentar fazer alguma coisa, mas não tinha nenhuma possibilidade. Saí agradecendo pela vida de minha irmã e do meu primo mais novo, que estavam lá no momento fatídico. Parece que foi ontem, consigo ainda lembrar de todos os detalhes, de todo meu sentimento, de toda aquela carga pesada a se carregar", disse Wellington, que testemunhou a avó ser morta com 12 tiros no rosto e 10 no tórax.
Filho de Flávio Gabriel Pacifico dos Santos, conhecido como "Binho do Quilombo", Wellington pede justiça pela avó e pelo pai, que também foi executado há 6 anos. "A única coisa que a gente pode fazer é apelar pra Justiça, às autoridades competentes, cobrar justiça, para que elucidem o caso deminha avó, como o de meu pai também, em 2017, que foi brutalmente assassinado dentro da comunidade com 16 tiros. Não pode ficar impune. A gente não pode escrever novos livros de história afirmando que os culpados escaparam impunes. A gente precisa escrever nossa história dizendo que os mandantes dos assassinatos de nossos líderes foram responsabilizados, foram para a cadeia", disse. "Estou aguardando a resposta das autoridades".
Na catedral lotada, familiares, amigos e membros de entidades do movimento negro e quilombola da Bahia compareceram em homenagem a líder do Quilombo Pitanga dos Palmares.
O filho da líder quilombola, Jurandyr Pacífico, falou sobre a importância do momento religioso. "É um momento religioso, minha mãe era religiosa, é o momento de estar com Deus. Eu sei que ela está junto com Deus. Está difícil, do jeito que foi, como está sendo... muito difícil pra gente", desabafou.
Jurandyr disse ter fé que a justiça será feita. "Eu sou uma pessoa que tenho muita fé em Deus e todos esses que estão fazendo mal, esse mal nunca vai chegar até a mim. E toda arma levantada contra a minha família não prosperará. Tenho muita fé em Deus e que vão se resolver os dois assassinatos [de mãe Bernadete do irmão dele, Fábio, assassinado há seis anos]". Ele aproveitou a oportunidade para agradecer pela escolta que tem recebido da Polícia Militar.
Mel Girassol, 29 anos, presidenta da Instituição Sócio Educacional Abayomi, disse que Mãe Bernadete ainda tinha muito a fazer. "Não queria estar aqui em uma missa de sétimo dia. O que eu sinto é um sentimento de vazio. Gostaria de estar dando continuidade no trabalho. 30 de setembro a gente tem o Beldade Negra, ação afirmativa em que ela seria homenageada", relembrou, dizendo que Mãe Bernardete seria jurada do evento. "Gostaria de dar continuidade ao trabalho e ver o sorriso dela, aquele sorriso largo, contagiante, e ver uma mulher forte, de fibra, que tinha todo um trabalho pela frente e teve a vida interrompida de forma perversa e desumana".
Presente na missa, o coronel Coutinho, comandante da Polícia Militar, falou sobre o reforço na segurança à família. "A Polícia Militar continua cumprindo com seu papel constitucional que é levar segurança, especificamente, não só à família, mas a todas as famílias que moram naquele local", disse.
A missa foi celebrada pelo padre Lázaro Muniz, que comentou sobre a importância de Mãe Bernadete para a luta quilombola. "O sentimento de impotência pela violência vai se revertendo pelo sentimeno de gratidão à Mãe Bernadete, pela luta pelos quilombolas, para que a gente possa continuar nessa defesa, e nesse combate a todo tipo de violência no meio de nós, à barbarie de vidas ceifadas pela ganância".