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'Família do bagulho': a história do clã acusado de criar um império com o tráfico de maconha


 

Segundo a Polícia Federal, bens bloqueados podem chegar a R$ 50 milhões

  • Thais Borges

Publicado em 02/03/2024 às 05:00:44
Rener, Niedja, Larissa e Paulo Victor foram alvos da Operação Kariri. Crédito: Reprodução

A caminhada da noiva Larissa Gabriela Lima Umbuzeiro em direção ao altar teve algo de diferente da maioria dos casamentos. Contou com vestido branco, bolo de dois andares e decoração em flores brancas e amarelas. Mas naquele dia 2 de julho de 2023, uma ausência era gritante: o pai da noiva, Rener Manoel Umbuzeiro, 56 anos, não estava lá.

A cerimônia, realizada em um restaurante de alta gastronomia em Feira de Santana, é mais um episódio considerado chave para a Polícia Federal (PF) entender a dinâmica da família Umbuzeiro, apontada como responsável por criar um império de tráfico de drogas no Nordeste, por meio da plantação ilegal de maconha. A operação contou com apoio do Grupo Especial de Combate às Organizações Criminosas e Investigações Criminais (Gaeco) do Ministério Público do Estado (MP-BA).

Rener, que foi indiciado como traficante de drogas, morreu no último dia 21 de fevereiro, quando a PF deflagrou a Operação Kariri, em nove cidades, incluindo Feira de Santana, Salvador, Ibimirim (PE), Brasília (DF) e São Paulo (SP). Cinco pessoas foram presas, inclusive a filha, Larissa, que é médica, a esposa dele, Niedja Maria de Lima Souza e o genro Paulo Victor Bezerra Lima.

A irmã de Niedja, Clênia Maria Lima Bernardes, também foi presa, assim como a prima Robelia Rezende de Souza, que está em prisão domiciliar. Inicialmente, foi divulgado que a sobrinha de Niedja e Rener, Gabriela Raizila Lima de Souza, também teria sido presa, mas segundo a polícia, ela está foragida.

Ao patriarca da família, a PF imputou o crime de tráfico. Os demais, segundo o delegado Diego Gordilho, supervisor do grupo de informações sensíveis da Bahia, que coordena as investigações, seriam operadores financeiros - ou seja, fariam lavagem de dinheiro. Apesar do alto padrão de vida, Rener, Niedja e Larissa receberam auxílio emergencial do governo federal.

“Rener não aparecia, não buscava participar de holofotes. Ficava bem resguardado no interior, nas fazendas. Inclusive, teve o casamento da própria filha e ele não foi porque sabia que estava sendo investigado pela Polícia Federal”, diz Gordilho. “O mais diferente é a tentativa de buscar uma via de normalidade dentro do contexto da sociedade, sendo que o ganho financeiro, ao que tudo indica, veio do tráfico de drogas”, acrescenta.

Polícia Federal mira família que cultivava maconha em Feira de Santana. Crédito: Divulgação/Polícia Federal

Ele estava sozinho em uma fazenda na região de Morpará, no Vale do São Francisco, quando a equipe da polícia chegou ao local. Ainda de acordo com o delegado, Rener atirou três vezes contra os policiais usando uma arma que não era legalizada. Ele morreu no confronto.

Rener, Niedja e Larissa receberam auxílio emergencial. Crédito: Reprodução/Portal da Transparência

Polígono

As investigações começaram em 2019, quando Rener entrou no radar da PF depois de um flagrante. “Quase uma tonelada de droga foi apreendida e, pela investigação, foi possível afirmar que ele era o responsável pela carga”, acrescenta o delegado.

Mas a trajetória da família começou muito antes: segundo as investigações, eles se transferiram para Feira de Santana no início dos anos 2000, vindos do sertão pernambucano. A mudança pode estar diretamente ligada aos desdobramentos do Polígono da Maconha, um quadrilátero imaginário que representa uma região com mais de 20 cidades de Pernambuco e da Bahia (veja mais abaixo).

O cultivo de maconha teria entrado na vida deles há mais de 30 anos, ainda em Pernambuco. De lá, eles decidiram vir para a Bahia, para onde outros integrantes do clã se transferiram. Ainda assim, a polícia acredita que havia ramificações no estado, especialmente em Ibimirim, terra natal de Rener e Niedja. A cidade no semiárido fica a mais de 300 quilômetros de Recife (PE) e tem pouco mais de 26 mil habitantes, segundo o último Censo.

O motivo para terem escolhido especificamente Feira de Santana não é conhecido. Mas a opção pela maconha, para o delegado Diego Gordilho, não destoa das práticas da região.

“É pela questão da localidade, que é inerente à região. Tanto que existe o Polígono da Maconha, região propícia ao plantio de cannabis, em termos do solo. Na Bahia, é uma região que vai se aproximando do estado de Pernambuco”, explica.

O inquérito apontou que a organização criminosa teria chegado a se expandir também para Alagoas e Paraíba em diferentes momentos, com o objetivo de dificultar as investigações . “A autonomia dessa família na área do tráfico é muito expressiva, tendo inclusive incentivado diversos outros pequenos traficantes em se tornarem (sic) traficantes de maior potencial, a exemplo de alguns que eram apenas transportadores a serviço dos Umbuzeiros e hoje se tornaram traficantes independentes, sem mesmo deixarem de se relacionar com a família”, diz a petição criminal com visualização pública.

Ainda segundo a investigação, eles seriam responsáveis por todo o ciclo da produção de maconha: plantio, colheita, prensagem, armazenagem, transporte e entrega. De Feira de Santana, além de aumentar o patrimônio, conseguiriam comandar os negócios e enviar a droga para capitais e regiões metropolitanas do Nordeste.

Ao todo, houve três situações de tráfico de drogas que a PF atribui a Rener. “A partir de então, foi desvendado que eles construíram uma grande rede para ocultar e dissimular o proveito econômico relacionado ao tráfico de drogas, sem nenhum tipo de renda ou ganho licitamente comprovado. Começaram a adquirir imóveis de alto valor usando os nomes dos filhos, de irmã, parente”, afirma o delegado.

Na operação de 21 de fevereiro, foram bloqueados seis imóveis de alto padrão e cinco fazendas. Todos seriam pertencentes ao grupo. Também foram bloqueadas contas bancárias e cumpridos 20 mandados de busca e apreensão. Somados, a PF estima que os bens podem chegar a R$ 50 milhões. Ainda de acordo com o delegado Diego Gordilho, o grupo já tinha sido alvo de operação das Polícias Civis da Bahia e de Pernambuco, além da Polícia Militar baiana.

Renda

Rener se apresentava como agricultor e pecuarista. A empresa Umbuzeiro Agropecuária foi aberta em abril de 2023 com capital de R$ 100 mil. Com sede em América Dourada, ela tem a descrição de ‘atividades de apoio à agricultura’ e inclui atividades econômicas secundárias como cultivo de milho, algodão herbáceo, amendoim, abacaxi e alho, além de cultivo de bovinos para corte e leite.

Ainda assim, segundo a polícia, ele não declarava nenhuma renda. Os agentes também não teriam identificado plantações de frutas, legumes ou outros produtos lícitos - apenas gado, composto de bois e ovelhas. Os animais ficavam nas fazendas ‘oficiais’, enquanto as roças de maconha eram em terras ‘alheias’.

“Eles não plantavam na sua própria terra. Eram terras abandonadas, terras de terceiros. Ao longo desta investigação, foi possível fazer a incineração de uma terra só, que tinha plantação de maconha”, conta Gordilho.

Já Niedja declarou ter uma renda proveniente de aluguéis de imóveis. Desse total, ela receberia R$ 6 mil mensalmente. No nome dela, também é possível encontrar uma empresa registrada em Florianópolis (SC) para atividades descritas como ‘treinamento em desenvolvimento profissional e gerencial’. Rener e Niedja estavam separados, mas ainda eram casados legalmente.

Um dos imóveis da família, de acordo com a polícia, é um apartamento avaliado em cerca de R$ 1,4 milhão, localizado no bairro Santa Mônica. No site da construtora responsável pelo empreendimento, o edifício é apresentado como tendo apartamentos de 205 m² e quatro suítes. Entre os bens da família, haveria, ainda um imóvel em Patamares e uma casa de praia em Itacimirim, na Região Metropolitana de Salvador.

Apartamento . Crédito: Divulgação

Ao longo dos anos, a polícia identificou que parte dos imóveis foi registrada no nome dos três filhos do casal. Além de Larissa, que foi alvo da operação, Rener e Niedja têm dois filhos que não são investigados - um deles ainda é adolescente. Uma das linhas de investigação buscou identificar a origem de depósitos altos feitos por Niedja para outras pessoas ou em sua própria conta.

“Eles não demonstraram, até então, nenhuma outra fonte de renda lícita, a não ser a oriundas dos aluguéis dos imóveis. E alguns aluguéis foram adquiridos por dinheiro obtido por tráfico de drogas. Não tem nenhum outro ganho financeiro legal. Eles estavam começando a investir em cabeças de gado, mas era uma quantidade pequena para sustentar todo esse padrão tão alto”.

O advogado que representa a defesa de Niedja e Robelia, Joari Wagner, destacou que não poderia falar sobre a investigação, que ainda está em andamento e corre em sigilo. Ele pontuou, ainda, que trata-se de uma situação de “tragédia familiar”, citando a morte de Rener.

“Foi um baque muito forte muito grande e elas estão extremamente decepcionadas por toda situação”, diz. As duas negam as acusações. "Elas não participaram, segundo elas, em momento algum, em questão de tráfico de drogas, lavagem de dinheiro. Elas informam que vão conseguir comprovar isso e a gente vai comprovar isso durante o processo que ainda virá", acrescenta Wagner.

Perguntado sobre o fato de a Polícia Federal ter atribuído a elas um “alto poder aquisitivo”, o advogado explicou que elas também negam que a situação financeira das duas seja como foi divulgado nos últimos dias.

"Niedja e Robelia não tinham padrões elevados, elevadíssimos, como quis fazer crer a polícia judiciária. Elas têm documentações comprovando justamente a renda, auferindo renda mensalmente tudo isso vai ser juntado em momento oportuno. Todas elas dizem o seguinte: o que estão querendo demonstrar na investigação não condiz com o padrão de vida delas", completa.

Robelia teve a prisão convertida em domiciliar por ter um filho menor de idade. Niedja, que ainda está presa e tem um filho de 12 anos, aguarda o julgamento de um pedido semelhante.

Medicina

Outro ponto que despertou a atenção no inquérito foi a própria formação da filha. Larissa, 29, cursou Medicina na Unime, em Lauro de Freitas. As mensalidades na instituição, durante os seis anos em que ela foi aluna, chegavam a R$ 12 mil.

A petição criminal questiona o valor pago diante da renda declarada. “Tal fato deve ser frisado devido ao alto valor das mensalidades dos cursos da Unime, o que indica uma alta despesa por parte de Rener e Niedja, pais de Larissa”, descreve o documento.

Uma colega médica de Larissa, que aceitou conversar com a reportagem sob sigilo, disse que ela não destoava do restante dos colegas. Como Larissa, muitos dos alunos da instituição tinham vindo de escolas particulares.

"Sempre foi uma pessoa que demonstrou ter dinheiro, porque tinha carro próprio, morava em apartamento de bairro nobre, mas nada muito diferente de outros colegas que também tinham o mesmo padrão de vida", explica.

Considerada uma aluna dedicada e com boas notas, Larissa chegou a fundar a Liga Acadêmica de Medicina Generalista da Unime. Em seu currículo Lattes, ela informa ter sido presidente da liga, além de ter participado da Liga de Medicina Intensiva da Unifacs. Vistas como muito importantes para a graduação em Medicina, as ligas são entidades sem fins lucrativos para oportunidades de ensino, pesquisa e extensão.

“Ela sempre foi muito solícita e não era negligente com a faculdade. Por isso, foi um grande choque, até porque a notícia tomou uma proporção muito grande. Larissa sempre foi uma pessoa muito exposta na internet, que gostava de postar o seu dia a dia. Mas uma coisa que a gente percebia era que ela nunca postava foto nas redes sociais com o pai. Tinha algumas poucas vezes com a mãe, mas ainda postava. Com o pai, não”, acrescenta a colega.

Larissa foi presa em São Paulo, quando saía de seu hotel para um evento médico. De acordo com a polícia, ela também teve um imóvel em seu nome - um apartamento de três quartos na Santa Mônica, área nobre de Feira de Santana - quando ainda era estudante.

A defesa de Larissa, representada pelos advogados João Daniel Jacobina e Danilo Sady, reforçou que não existe nenhuma acusação formal (denúncia) contra ela.

“O que existe é uma investigação, ainda não concluída e que corre em sigilo, de modo que a defesa não pode fornecer maiores informações. Seus advogados, por algumas oportunidades, já tiveram acesso a sua cliente, que aguarda o julgamento do Habeas Corpus solicitado ao Tribunal de Justiça”, informou o advogado Danilo Sady, em resposta ao contato da reportagem.

O CORREIO apurou que o segundo filho do casal Rener e Niedja, que não foi alvo da operação, atualmente cursa Medicina em uma universidade particular em Salvador. Em 2024, a instituição onde ele estuda tem mensalidades de R$ 12.680 mil.

Enlace

Além disso, enquanto Rener era considerado recluso, Larissa e Paulo Victor ostentavam uma vida de luxo nas redes sociais. Em seus perfis no Instagram, que continuavam abertos desde o dia da prisão, compartilhavam uma rotina de viagens e festas. Um dos vídeos publicados por Paulo Victor mostra uma cena do documentário do jogador de futebol Neymar Júnior, O Caos Perfeito, disponível na Netflix.

No vídeo, Neymar aparece posando para uma foto abraçando o casal. Segundo pessoas do ciclo de Paulo Victor e Larissa, eles não conheciam o jogador, mas estavam na mesma festa que ele, em Barra Grande, na península de Maraú. Neymar estaria atendendo a pedidos de fãs para selfies. “Que honra de ter aparecido nessa série que ficará pra sempre na história (sic)”, escreveu Paulo Victor, na publicação.

O casamento dos dois aconteceu no restaurante Noz, um empreendimento de alta gastronomia no Centro de Feira de Santana. De acordo com as redes sociais do estabelecimento, os eventos feitos no local podem receber de 20 a 80 convidados. Os pratos principais ficam entre R$ 76 e R$ 155. Em um evento com lotação máxima, aos domingos, o valor sai por R$ 35 mil.

Larissa Umbuzeiro e Paulo Victor se casaram em 2023. O pai dela, investigado, não foi à cerimônia. Crédito: Reprodução/Instagram

Paulo Victor é sócio da UAU, uma loja de ferramentas em Feira de Santana, desde 2018. De acordo com o delegado Diego Gordilho, ele também era operador financeiro. “O genro acabou utilizando suas contas para movimentar dinheiro da família, inserindo esse dinheiro na conta da empresa para buscar dissimulação”

O advogado Sebástian Mello, responsável pela defesa de Paulo Victor, disse que tanto ele quanto sua família estão muito consternados com a situação. Ele nega as acusações. “Ele é um empresário em Feira de Santana e sempre atuou de maneira lícita. A sensação dele é de uma injustiça muito grande. Ele está triste, mas concentrado em provar a inocência”.

As defesas de Clênia Maria Lima Bernardes e Gabriela Raizila Lima de Souza não foram localizadas até o fechamento.

O MP-BA informou que os promotores do Gaeco não poderiam comentar o caso porque não podem dar entrevistas sobre operações e investigações em curso devido à Lei de Abuso de Autoridade.

Já a Polícia Civil de Pernambuco disse que, por razões estratégias e legais, não divulga informações sobre investigações em andamento. A Polícia Civil da Bahia informou que, como este caso é conduzido pela PF, não tem informações sobre outras investigações dos citados no estado.

Dinâmica do negócio tem relação com o Polígono da Maconha, ainda que com diferenças

Os alvos da Operação Kariri têm um histórico que, de acordo com as investigações, remonta à organização do Polígono da Maconha. Esse quadrilátero imaginário envolve uma região com mais de 20 municípios do sertão nordestino que produzem cannabis ilegalmente.

Apesar disso, as cidades onde a família Umbuzeiro teria fazendas - Irecê, América Dourada e Ibititá - não fazem parte do polígono. As principais cidades baianas que ficam na área, por outro lado, são Juazeiro, Paulo Afonso e Glória. Essa localização reflete uma dispersão que tem ocorrido nos últimos anos na região, de acordo com o sociólogo Paulo Fraga, professor do programa de pós-graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).

"Elas não ficam no polígono, mas a gente observa que, há algum tempo, cidades como Irecê e até algumas mais ao Sul, como Ilhéus e Una, já aparecem (nas operações de erradicação). É uma tentativa de descentralizar", diz ele, que estuda o polígono há quase duas décadas, citando um movimento comum em países como Colômbia, Bolívia e Peru.

Pernambuco é o principal produtor de maconha do Brasil e, em alguns anos, a Bahia chega a figurar no top 3 do ranking de maiores produtores, a partir do saldo de apreensões. Ainda assim, a erva produzida no país não atende nem 20% do mercado nacional.

"Tem a ver também com a reorganização criminal, não só com o plantio. Há coisas interligadas, como o garimpo ilegal em terras indígenas. Muitas vezes, quando havia repressão no Vale do São Francisco, eles iam assaltar caminhões em estradas".

O histórico da área não é tão recente quanto se possa imaginar. Segundo o professor, a política de erradicação da maconha no Brasil começou ainda na década de 1930, com a proibição em 1934, sendo intensificada a partir de 1940.

A repressão costumava acontecer com mais intensidade em Alagoas e Sergipe, enquanto o cultivo de cannabis passou a ser feito principalmente às margens do Rio São Francisco, em Pernambuco e na Bahia. "É uma região de seca, mas as águas do rio facilitam muito o cultivo".

Numa região vulnerável, o plantio de maconha surgiu como uma alternativa para muita gente. O professor cita até casos de pequenos agricultores que tinham, em suas propriedades, plantações de mandioca e de maconha.

"Não basta só reprimir. Tem que dar alternativas também. Lógico que a repressão é importante, porque é um produto ilegal. Mas, nessa região, tem muita gente que estava se envolvendo porque era a alternativa".

As safras que normalmente levam de seis a oito meses podem ser aceleradas com defensivos químicos e chegar até a quatro meses. "A maconha é uma planta que se adapta fácil, por isso tem quase no mundo todo. Ela é plantada até indoor".

Reorganização

A partir dos anos 1990, a Polícia Federal fica com a incumbência de erradicar plantações de maconha e há um foco nesta região. Há, ainda, outro aspecto que ele destaca: a reorganização do crime. Hoje, a maior parte da maconha consumida no Brasil vem do Paraguai, em rotas que são dominadas pelo Primeiro Comando da Capital (PCC).

"A maconha, para esses grupos, não é a planta mais atraente. Cocaína gera muito mais dinheiro, mas o consumo no Brasil é grande, então continua sendo atrativo e importante ter esse tipo de cultivo".

O que é produzido no Polígono fica mais no Nordeste - justamente o destino apontado pela polícia para a droga produzida nas fazendas que foram alvo da operação.

A organização familiar nos moldes citados pela investigação, por outro lado, não é tão comum entre os produtores do quadrilátero. "Foge um pouco do padrão. Logicamente existiam famílias já ligadas ao crime, principalmente em Pernambuco, que pelejavam entre si. Mas esse tipo que aparece demonstra um novo tipo de produção e de pessoas envolvidas que foge do padrão tradicional", avalia o professor.

Reagir a uma abordagem policial, como Rener Manoel Umbuzeiro teria feito, também é algo incomum no tráfico que é feito no Polígono da Maconha. Segundo a PF, Rener morreu em confronto, após ter disparado três vezes contra os agentes.

O mais provável é que a polícia encontre plantações de maconha abandonadas. Em geral, as forças de segurança acompanham essas propriedades por drones e satélites e, quando está perto da colheita, fazem uma operação com o objetivo de causar algum prejuízo aos criminosos.

"Quando chega lá, só tem o plantio. As pessoas, por algum motivo, ficam sabendo e vão embora. É o chamado crime sem atores. Quando tem presos, são pequenos agricultores que às vezes nem sabem quem está lhes pagando. E o cara que está tomando conta do plantio não troca tiros com a polícia. É diferente de confrontos entre policiais e traficantes em grandes cidades, com troca de tiros".