'É muito importante para mim estar aqui': o significado da escolha de Salvador para o lançamento mundial do filme de Beyoncé
Estrela global esteve em evento de promoção do documentário sobre os bastidores da última turnê: “Renaissance: A Film by Beyoncé”; programação aconteceu na Boca do Rio
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Millena Marques
milena.marques@redebahia.com.br
Depois de 13 anos, Beyoncé voltou a pisar em território soteropolitano e emocionou centenas de fãs, que se reuniram no Centro de Convenções de Salvador, na Boca do Rio, para o evento de promoção do documentário sobre os bastidores da última turnê mundial da estrela, realizada em 2023, o “Renaissance: A Film by Beyoncé”. O fato de ter escolhido a capital baiana como a cidade de lançamento da produção cinematográfica é simbólico, representativo e de um potencial de visibilidade local extremo, como pontuam fãs, produtores culturais e representantes do movimento negro.
Beyoncé subiu ao palco do Club Renaissance, nome do evento feito para os fãs da cantora, por volta das 23h, na última quinta-feira (21). Antes disso, a presença da estrela norte-americana era apenas uma especulação do público e da imprensa. Vê-la de perto foi a realização de um sonho para o jornalista Danilo Isaac da Silva, 22 anos, fã da cantora desde os cinco anos.
"São 18 anos de história. Ela esteve presente em cada fase durante esses anos, cada canção me remete a um momento da minha vida. Guardo grandes memórias afetivas, eu a tenho como uma figura materna", afirma, emocionado.
A escolha de Salvador é mais que simbólica. Isso porque o álbum Renaissance, que deu nome à turnê mundial, é uma celebração à cultura negra e, fora do continente africano, não há cidade mais preta no mundo do que a capital baiano, como pontua Danilo Isaac e confirmam os dados do último Censo Demográfico do Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os dados foram divulgados na apresentação da pesquisa “Minha Cor, Minha Raça”, na Casa do Olodum, no Pelourinho, nesta sexta-feira (22).
De acordo com o levantamento, 83,2% dos habitantes de Salvador são negros - quase metade da população se declara como parda (1.186.416 em números absolutos) e 825.509 pessoas se autodeclaram como pretas. Apenas 16,5% (398.688 pessoas) declararam sua cor como branca; 0,2% (4.395 pessoas) afirmaram ser indígenas apenas no quesito cor ou raça; enquanto 0,1% (2.605 habitantes) declararam sua cor como amarela.
"Celebrar a cultura negra, junto com artistas locais, com fãs tão apaixonados, na minha cidade natal e na presença da maior potência musical da atualidade, foi mágico. Uma noite jamais será esquecida por mim, nem pela Beyhive e muito menos pela Bahia", complementa Danilo Isaac.
A estudante universitária Elaine Alves, 20 anos, passou a infância ouvindo as músicas da Bey e reproduzindo as coreografias ao lado das primas, mulheres pretas como ela. "Ver uma mulher preta chegar onde ela chegou me inspira a continuar, as músicas dela me movem e tudo que ela prega me faz acreditar em mim e nunca desistir dos meus sonhos", pontua.
Ter a oportunidade vê-la foi a realização de um sonho, nutrido por amor à representatividade da estrela pop. "Eu não esperava que ela fosse realmente aparecer, pensei que teríamos um anúncio ou um vídeo dela mas ela veio mesmo e foi muito lindo. Esse momento foi inesquecível. Foi o dia mais feliz da minha vida!", afirma.
Histórico
A noite do dia 21 de dezembro de 2023 entra para a história de eventos internacionais no estado. O co-fundador da empresa de investimentos em aplicações financeiras Vale do Dendê, Paulo Rogério Nunes, compara o evento com a visita de Michael Jackson à Bahia em 1996, quando gravou o clipe da música ‘They Don’t Care About Us’ com o Olodum no Centro Histórico de Salvador.
"Beyoncé é a maior artista global viva e é representatividade do ponto de vista de identidade afro, do diálogo com a juventude e do emponderamento feminino e da comunidade LGTQIA+. A presença dela em Salvador consolida, finalmente, Salvador como destino para visitantes internacionais, principalmente da diáspora africana", afirma.
A escritora, jornalista e palestrante Ashley Malia, 26, que esteve no Club Renaissance, pontua os traços de referências ao rei do Pop em toda a carreira de Beyoncé, fã assumida de Michael Jackson, inclusive, nesta visita a Salvador. "Quem acompanha o trabalho de Beyoncé consegue perceber as referências do trabalho de Michael Jackson. Quando vi a banda Didá no palco, tive certeza que ela viria", afirma.
Além das referências a Michael Jackson e do fato simbólico da capital baiana ser a cidade mais negra fora da África, Malia destaca o fato de o Brasil ser um dos países mais engajados do mundo. "O Brasil é o país que mais vibra pela Beyoncé, não tenho dúvida alguma", diz Malia.
De acordo com um levantamento da Comscore, empresa norte-americana de análise da internet, o Brasil é terceiro maior consumidor de redes sociais do mundo, atrás apenas de Índia e Indonésia.
Turismo político
A repercussão internacional gerada pela vinda de Beyoncé reflete no potencial de turismo político pertencente a Salvador, de acordo com a ouvidora-geral da Defensoria Pública do Estado da Bahia (DPE/BA), Naira Gomes. "Salvador pode ser vista como a cidade que pulsa e produz uma política apesar do racismo. O mundo e o Brasil colocarem os olhos para Salvador, que produz um referencial de antirracismo para o mundo inteiro", afirma.
A escolha da Queen B, como é conhecida por seus fãs, coloca Salvador no mapa do mundo, conecta a cultura queer soteropolitana com a apresentação de Lunna Monty, DJ e mother da House Afrobapho que se apresentou no Club Renaissance, e celebra os fãs baianos. Isso é o que pontua o secretário de Cultura e Turismo da cidade, Pedro Tourinho, por meio de publicação no Instagram.
"Ela [Beyoncé] fez o certo, o perfeito, o impecável: voou por 10 horas direto para Salvador, celebrou a cultura local, abraçou os fãs e serviu um evento de primeira. E assim, colocou Salvador no mapa do mundo, quem não conhece vai procurar saber, porque ela escolheu Salvador", diz trecho da nota.
*Com orientação da subchefe de reportagem Monique Lôbo