Crime planejado: carro usado em chacina de Sete de Abril vigiou vítimas
Pai, filho e três amigos foram surpreendidos em praça do Loteamento Bosque Real
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Wendel de Novais
wendel.novais@redebahia.com.br
A chacina que deixou cinco pessoas mortas, entre elas pai e filho, no Loteamento Bosque Real, no bairro de Sete de Abril, foi um crime articulado, em que criminosos sondaram a área antes de atacar. De acordo com quem mora no local, um veículo de cor preta parou em frente às vítimas para que criminosos descessem e disparassem contra elas. O mesmo carro, ainda segundo quem vive no loteamento, foi visto algumas vezes durante a semana que precedeu o ataque.
Um morador confirma a sondagem dos suspeitos e acrescenta que, com a exceção de Alan Veloso da Conceição, as vítimas tinham costume de ficar no local em que viraram alvos de disparos. “Esse carro passou aqui umas três ou quatro vezes, a gente reparou e outras pessoas também. No começo, achei que era motorista de aplicativo, mas depois vi que algo estava acontecendo. Isso [o ataque] estava anunciado, e os rapazes sempre ficam naquela parte da praça, ficou fácil pegar eles”, relata um morador.
Por medo, quem conversou com a reportagem no loteamento preferiu não se identificar. Um outro morador, entretanto, assegura que também viu o carro circulando no local. “Como aqui é a entrada do loteamento, esse carro descia, fazia a manobra lá embaixo e voltava. O pessoal falou aí que se tocou que era problema, mas eu nem liguei uma coisa à outra porque aqui é sossegado. Dificilmente a gente vê problema no loteamento, quando veio foi com tudo nessa situação”, comenta.
As circunstâncias do crime estão sendo investigadas pela Polícia Civil, através do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).
Uma fonte policial, que não será identificada, contou à reportagem que a possível motivação do crime está no que uma das vítimas realizava fora do loteamento. Mais precisamente na Via Regional, em dias de jogos do Vitória, quando há um grande fluxo de movimentação.
“Tem um pessoal lá no loteamento que era responsável por diversos assaltos na Via Regional, principalmente quando o Vitória joga. Do loteamento para via, é uns 12 minutos de carro. Eles aproveitavam essa proximidade para atuar ali, sendo que esse de 17 anos, o Jaquinho, estava no meio dessas ações criminosas. Inclusive, esse Jaquinho foi alvo de um ataque a tiros há um ano”, relata o policial.
No local, os moradores confirmaram que Jackson Oliveira Barbosa, 17 anos, o ‘Jaquinho’ citado pelo policial, foi o primeiro a ser alvo dos disparos feitos pelos suspeitos. Quando viu o filho ser atingido, o pai, Jackson Reis Barbosa, 39 anos, correu na direção dele e acabou também sendo baleado e morto. Consultados, alguns dos moradores, que preferiram não se identificar, confirmaram a atuação de Jaquinho em roubos. Eles destacaram, entretanto, que Alan Veloso da Conceição, que chegou a ser socorrido antes de morrer na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de São Marcos, não tinha envolvimento em crimes.
Não há informação que relacione as outras vítimas ao crime, mas moradores chegaram a comentar que Jaquinho estava envolvido, inclusive, em assaltos contra familiares de policiais na região. De acordo com o Instituto Fogo Cruzado, que monitora a violência armada em Salvador e na Região Metropolitana (RMS), 21 chacinas foram registradas até aqui em 2024. O instituto considera como chacina casos de violência onde três pessoas ou mais acabam mortas.
O Fogo Cruzado destacou que, dos 21 registros, 11 foram contabilizados em ações policiais, já que a organização também contabiliza múltiplas mortes por intervenção policial como chacina. Nos 21 casos registrados, 73 pessoas acabaram mortas, sendo 40 nestas ações. Em todo o ano de 2023, o instituto contabilizou 39 chacinas que acabaram em 159 mortos na região. Dentre essas, 27 aconteceram por intervenção policial e acabaram em 114 mortes.