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Batalha de Rap em Salvador mostra a força e vivência das periferias nas rimas


 

Evento ocorreu neste domingo (21), no bairro do Uruguai

  • Brenda Viana

Publicado em 21/07/2024 às 22:54:15
Batalha de rap em Salvador. Crédito: Ana Lúcia Albuquerque / CORREIO

Neste domingo (21), uma batalha de Rap e MCs agitou o Espaço Cultural Alagados, no bairro do Uruguai, na capital baiana.Com grandes nomes do mundo artístico do rap baiano, o evento Sons Periféricos, promoveu uma disputa acirrada entre os rappers de vários bairros de Salvador, que mostraram suas habilidades de improvisação nas rimas, nos flows (ritmo dos versos), além da forma como eles se comunicavam com o público presente.

Batalha de Rap. Crédito: Ana Lúcia / CORREIO

Para avaliar cada detalhe do que os participantes falavam, o evento contou com a participação da jurada técnica Mira Potira, a primeira representante da Bahia em um duelo nacional de MCs de 2012, sendo a primeira finalista e primeira mulher e MC de batalha da Bahia. Para os leigos que não entendem como funciona o encontro, a cantora explicou como funcionava uma batalha de Rap.

"É composta por oito ou 16 MCs. Na primeira fase, foram oito batalhas e, em seguida, em a segunda fase com mais quatro batalhas, seguindo com mais duas, a semifinal e a grande final. Nesse formato, chamamos de bate-volta, que é quando um acaba, o outro responde. São quatro versos de um, quatro versos de outro, depois dois de um, dois de outro, um de um, outro do outro. Assim, finalizando o bate-volta. Nessa categoria é mais conhecida pelo público geral de freestyle, que é tudo na hora, no improviso, com tema livre", explica Mira, que é do Amazonas e também trabalha nos coletivos de Salvador.

Ela reforçou que, na atualidade, a mulher consegue entrar com mais facilidade nas batalhas, já que as regras mudaram, principalmente no que diz respeito às rimas machistas, xenofóbicas, homofóbicas. Segundo Mira, o rapper perde ponto para cada preconceito rimado na batalha.

"Isso acaba reeducando, não só os MCs, mas também o público, porque se tiver uma rima preconceituosa, a plateia também não vai gostar, não vai querer e  vai votar contra. Hoje, eu posso batalhar com eles e se a minha rima for melhor, vou ganhar, sem precisar de apelação . É muito bom ver essa evolução no respeito durante as batalhas", comenta Potira.

Mira Potira aplaude as novas regras que tornam os duelos menos apelativos e mais respeitosos. Crédito: Ana Lúcia / CORREIO

A batalha foi promovida pelo Instituto Talentos de Bairro, é voltada para valorização da cultura periférica e, neste ano, a premiação foi um kit Red Bull, um troféu e prêmio em dinheiro, cerca de R$ 1 mil. Apesar de não ter faixa etária estabelecida, os participantes têm entre 17 a 40 anos, diversificando e dando mais oportunidade para os talentos variados.

Segundo Felipe Alves, coordenador do Instituto, a batalha existe há mais de cinco anos e com moradores de diversos bairros de Salvador, como Liberdade, Suburbana, Cabula, Lapa, Boca do Rio, Valéria e Cajazeiras. "São pessoas de vários lugares que  passaram por muitas batalhas, como a de Zé Ferina da Suburbana,  Estação da Lapa, então eles acabam fazendo o improviso, também, nos coletivos de Salvador, mostrando seus talentos".

Uma dessas estrelas das ruas da capital baiana é Pedro Monarka, de 23 anos, que venceu a batalha deste domingo (21), garantindo o primeiro lugar. Artista independente, ele mostra todo talento nos coletivos, embarcações, além de ter iniciado no Rap aos 14 anos. Atualmente, é tetracampeão do Circuito Regional de Rimas, realizado em Salvador. Para ele, ver que o Rap deixou de ser marginalizado é motivo de batalhar ainda mais para ser inserido na sociedade.

"Muitos rappers saíram do crime justamente com o preconceito diminuindo, principalmente aqueles que saíram das periferias de São Paulo, do Rio. Muitos até saíram da depressão fazendo rimas, indo para as batalhas. A arte ajudou e ajuda a sairem da marginalização, do crime, dando esse apoio superior, principalmente para os jovens", diz.

Pedro Monarka, vencedor da batalha desse domingo, comemora a vitória. Crédito: Instituto Talentos de Bairro

Essa também é o mesmo pensamento de Peseus MCS que, desde 2017, atua nas ruas da cidade. Começando as rimas pela Cidade Baixa, Igor brincava com amigos no bairro pobre de Salvador, mas sempre mostrando que tinha talento para ser rapper, mesmo sendo tímido. Assim como Monarka, ele também faz parte do Circuito Baiano de Rimas, mais conhecido como Terceiro Round. Mesmo não sendo conhecido no nordeste inteiro, ainda assim, é um dos eventos mais respeitados da cidade.

"A gente tem visto crescer bastante, com jovens performando a noite inteira, mas ainda falta ter mais valorização no nordeste, porque em São Paulo, tem rapper ganhando R$ 10 mil, R$ 40 mil reais, uma vez que  eles valorizam mais a cultura", comenta.

Peseus MC atua desde 2017 nas ruas de Salvador e pede mais valorização para a cultura rapper. Crédito: Ana Lúcia Albuquerque / CORREIO

A cantora Beatriz Oliveira, conhecida como Béa, também reforçou as dificuldades enfrentadas. Ela, que se apresentou no evento, reclama que empresários preferem não investir em talentos de Salvador nas ações realizadas na capital, apenas quando os baianos saem  e vão para o sudeste, onde há um reconhecimento maior.

"Nós, da Bahia, precisamos deixar de ser exportadores de talento. Porque, para  sermos vistos  como MCs e trabalhar nessa área,  precisamos ir para São Paulo. Na Bahia, ainda não se enxerga a batalha de rima como negócio, e é um negócio. A empresa do hip hop  funciona,  existe, mas precisa ter  visibilidade local. Conheçam os MCs de Salvador, da Bahia no geral, porque é um pessoal talentoso", finaliza.

Vale destacar que o Rap surgiu na Jamaica ainda nos anos 60 e, na década seguinte, levado para os Estados Unidos. Agora, em 2024, ocupa as ruas, coletivos e transportes públicos de Salvador com uma galera jovem que expõe a realidade das periferias da capital baiana.

Béa, cantora e rapper. Crédito: Ana Lúcia Albuquerque / CORREIO