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Audiência pública discute situação do VLT do Subúrbio


 

Vereadores cobram mais transparência no processo após Governo do Estado dizer que pode cancelar contrato

  • Gil Santos

Publicado em 03/08/2023 às 10:33:16
Audiência pública sobre o VLT do Subúrbio. Crédito: Gil Santos/CORREIO

A situação do Veículo Leve de Transporte (VLT) do Subúrbio Ferroviário de Salvador foi motivo de uma audiência pública, nesta quinta-feira (3), na Câmara Municipal. Os vereadores pedem mais transparência no processo e vão elaborar uma carta aberta que será encaminhada ao Governo do Estado.

A obra foi autorizada em 2019, mas pouco avançou. Um relatório do Tribunal de Contas do Estado (TCE) apontou 14 irregularidades e, na semana passada, o governo informou que estuda cancelar o contrato após investir R$ 57 milhões no projeto.

A audiência pública foi realizada no Centro de Cultura da Câmara, na Praça Municipal, com a presença de representantes de instituições públicas e da sociedade civil. O auditório ficou lotado. O vereador Cláudio Tinoco (União Brasil), propositor da audiência pública, disse que o espaço foi para promover o debate e cobrar mais clareza.

"Fizemos duas audiências no ano passado, que levaram à relevação das mudanças nas licitações, que surpreenderam até os órgãos de controle, com a mudança do modal e a mudança do edital. A gente revelou também o aditivo contratual. A audiência pública visa dar transparência, compartilhar com a sociedade e ouvir a sociedade. Agora tem o agravante que é a hipótese do cancelamento do contrato", disse.

A audiência começou com a apresentação detalhada do contrato de construção do VLT, e com a discussão sobre a mudança do modal feita pelo governo de um veículo leve sobre trilhos para uma estrutura usando pneus (monotrilho). O coordenador geral da Sociedade Nacional Movimento Trem de Ferro e do Projeto Ver de Trem, Gilson Vieira, apresentou um modelo de ligação férrea entre Salvador e Alagoinhas, e criticou o atual cenário.

“Foi um erro mudar o modal, trocar o modelo sobre trilhos para um modelo que vai usar pneus e cimento. Isso tira a característica cultural da nossa história e da memória. É um desrespeito com a população. Ficaram 14 mil pessoas sem trem, modelo que facilitava o transporte do produto de trabalho de pescadores e marisqueiras que por conta das características, do cheiro, é mais difícil transportar em ônibus”, afirmou.

Moradores do Subúrbio Ferroviário estiveram no auditório e assistiam a audiência. O líder comunitário do Lobato e radialista, Sulivan Santos, 43 anos, destacou os prejuízos desde que os trens foram desativados, em 13 de fevereiro de 2021.

“A tarifa do trem era R$ 0,50, e hoje pagamos R$ 4,90. Marisqueiras, pescadores, o pessoal que tinha comércios em volta das estações foram todos prejudicados. A saída do trem impactou negativamente na economia local, em relação a emprego e renda. Foi prometido o VLT e nós aceitamos porque era um modelo melhor, mas isso já tem três anos e as obras estão paradas”, disse.

Transparência

Essa é a terceira vez que os vereadores fazem uma audiência pública para discutir a situação do VLT do Subúrbio. Em fevereiro e, depois, em março de 2022, eles pediram explicações ao Governo do Estado sobre a mudança do modal de veículo sobre trilhos para monotrilho (uso de pneus), quanto aos valores empregados na obra que seguia parada e em relação ao cronograma de execução.

O último prazo informado era entregar o VLT no segundo semestre de 2024, mas o projeto sofreu mudanças. Em março de 2022, o valor do contrato foi reajustado pelo Governo do Estado. O documento assinado com a concessionária para a implantação e operação da Fase 1 do sistema foi de R$ 2,8 bilhões, quase o dobro de R$ 1,5 bilhão que havia sido divulgado no início do contrato.

Na ocasião, o governo informou que foi necessário um novo reajuste porque a empresa iria operar também a Fase 2. A conta ficou em R$ 5,2 bilhões. Além disso, o prazo de concessão foi ampliado e não foi divulgado o cronograma de execução das obras.

Uma auditoria do TCE apontou 14 irregularidades no contrato e atualmente o documento está sendo objeto de julgamento no Tribunal. Na semana passada, a Procuradoria Geral do Estado informou que estuda anular o contrato firmado com o consórcio Metrogreen Skyrail, controlado pela gigante chinesa BYD, responsável pela obra. O governo ainda não explicou o que acontecerá com os R$ 57 milhões já investidos.

O presidente da audiência informou que a Secretaria de Desenvolvimento Urbano (Sedur) e a Procuradoria Geral da União (PGE) foram convidadas, mas que não responderam. O TCE respondeu que reconhecia a importância do debate, mas que houve incompatibilidade de agenda, e a concessionária responsável pela obra afirmou que não teria condições de comparecer à audiência.

A Sedur e a PGE estão sendo procuradas pelo CORREIO desde a semana passada para informar sobre as condições do contrato e das obras do VLT, mas ainda não houve retorno.

Confira alguns dos pontos da discussão:

Dezembro de 2019 – O então governador Rui Costa (PT) assina a autorização para o início das obras do Veículo Leve de Transporte (VLT) em Salvador. A empresa contratada foi o consórcio Metrogreen Skyrail, controlado pela gigante chinesa BYD, por R$ 1,5 bilhão. A licitação tinha sido lançada em 2017. Foi anunciado que o modal teria 19,2 quilômetros de extensão e 21 estações. Com capacidade para transportar 172 mil usuários por dia, e que 600 mil pessoas seriam beneficiadas.

Fevereiro de 2021 – Depois de 160 anos em operação, os trens que faziam a ligação entre os bairros da Calçada e Paripe foram definitivamente aposentados. A última viagem ficou lotada de passageiros saudosos do modal. Cerca de 100 trabalhadores foram demitidos.

Março de 2022 - O valor do contrato para a construção do VLT foi reajustado pelo Governo do Estado. O documento assinado com a concessionária para a implantação e operação da Fase 1 do sistema foi de R$ 2,8 bilhões, quase o dobro do que havia sido divulgado. A empresa assumiu a operação também a Fase 2 e a conta pulou para R$ 5,2 bilhões. É anunciada a mudança de trilhos para pneus (monotrilhos);

Março de 2022 – Vereadores da Câmara Municipal de Salvador fazem uma audiência pública para cobrar mais transparência no processo, com os valores e com o prazo para execução da obra. Usuários e especialistas criticam as alterações feitas pelo governo.

Julho de 2023 – Auditoria do TCE aponta irregularidades no contrato e PGE diz que a parceria com o consórcio pode ser cancelada. O governo ainda não respondeu como ficará os R$ 57 milhões que já foram investidos no projeto e na obra, além dos R$ 100 milhões anunciados como aporte para a gigante chinesa, e quando o sistema estará em operação.