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A vitória do improviso


 

Entenda como as tropas populares ajudaram a escrever a história da Independência do Brasil na Bahia

  • Paulo Leandro

Publicado em 01/07/2023 às 16:00:00
Paulo Leandro, jornalista e doutor em Cultura e Sociedade. Crédito: Arquivo CORREIO

O improviso pode ter sido o fator decisivo para a vitória das tropas baianas no enfrentamento dos gajos, devido ao famoso elemento surpresa de civis aparentemente fáceis de derrotar, pela falta de armamento adequado.

Grupos de escravizados e caboclos descendo as serras do Cabula e Saboeiro rumo ao centro da cidade, com faquinha nos dentes, para atacar os marotos, estariam entre os improvisados guerreiros da independência.

Folhas de cansanção e bredo não seriam armas consideradas perigosas, não fosse a astúcia das amazonas de Maria Felipa, na sedução improvisada capaz de atrair os inimigos para a fatal armadilha, na ilha de Itaparica.

Improviso das tropas de caboclos resiste nos festejos populares. Crédito: Marina Silva/CORREIO

Tampouco as canhoneiras posicionadas nos saveiros de João das Botas teriam o poder de espantar poderosas caravelas, se o improviso fosse substituído por táticas de batalha naval reconhecidas como válidas.

A vitória do Dois de Julho, nesta perspectiva, fortalece a hipótese de o improviso tornar-se decisivo no enfrentamento das estratégias tidas como “coerentes” e “racionais”.

A vontade de conquistar a independência superou com as graças do improviso todo e qualquer suposto conhecimento militar dos portugueses, apesar da ampla superioridade numérica e de alcance de suas balas.

O toque “errado” do corneteiro Lopes, trocando o recuar por avançar, embora não possa ser entendido como improviso, teria resultado da precariedade, ampliando a sensação de surpresa como capaz de desequilibrar o conflito.

O legado do Dois de Julho, passados 200 anos, também é o de acreditar na capacidade inventiva, ao contrário da falsa crença nos esquemas “certinhos”, como verificamos hoje, com a hegemonia dos excessivos “planos” de sabidinhos especialistas disso e daquilo.

De nada serviram aos primeiros vascaínos o rigor das fardinhas engomadas, dos bigodes revirados, das reuniões para tramar previsíveis ataques, diante do improviso do nosso povo, este sim, representou a grande e decisiva vantagem, contando a criatividade como mais relevante em relação às “certezas” dos inimigos derrotados por sua própria arrogância em marcha à ré.

O projeto Bahia livre: 200 anos de independência é uma realização do jornal Correio com apoio institucional da Prefeitura Municipal de Salvador.