'Nada mais desigual do que tratar a todos da mesma forma', defende Hélio Santos na abertura do FALA!
Gratuito, o FALA! traz nomes como Semayat Oliveira, Aline Midlej e muito mais em programação híbrida
-
Da Redação
redacao@correio24horas.com.br
Uma movimentação para amplificar vozes de uma maneira que a mídia tradicional não faz ou consegue fazer. Esse é o discurso que norteia o Festival FALA!, que iniciou seus trabalhos nesta quinta-feira (25) em Salvador.
A conferência de abertura aconteceu no Teatro Gregório de Matos, que fica na Barroquinha e teve discursos fortes dos palestrantes, que teceram palavras sobre a importância da equidade racial e o investimento financeiro para combate do racismo. Uma realidade que parece distante, mas o nome da mesa justifica tudo: "O lugar da Utopia em um mundo distópico".
Foi dessa maneira que o professor Hélio Santos, que é doutor em Administração além de fundador do Instituto Brasileiro da Diversidade; e a doutora Cíntia Guedes conduziram suas falas.
Eles dois avaliam que a realidade é distópica por ser surreal a maneira como negras e negros são tratados no país: relegados às maiores taxas de analfabetismo, mortalidade, abandono, fome e indicadores sociais das piores estirpes. Para resolver esse cenário, é preciso pensar de maneira utópica.
"Temos que assumir que o Brasil é um país profundamente doente. O IDH de condomínios rivalizam com o da Suécia e Dinamarca, ao lado de favelas com índices baixíssimos. Temos que sonhar muito e para a vitória é preciso impor a nossa agenda", apontou o doutor Hélio.
Ainda segundo o especialista, é preciso deixar de lado bordões e ideias do senso comum como o famoso mantra "somos todos iguais". Isso porque, ele explica, pressupor uma pretensa igualdade significa entender que todas as pessoas do país partem das mesmas condições e podem sobreviver com as mesmas oportunidades - o que é um erro.
"Nada mais desigual do que tratar a todos da mesma forma. É preciso pensar em ações afirmativas sistêmicas. Como o racismo é sistêmico, as ações afirmativas têm que ser encadeadas. O racismo não dá folga. É preciso ir além de cotas e garantir que não se sofra racismo no mercado de trabalho", discursou defendendo que o dinheiro e acesso a recursos é fundamental para a construção desse processo, mencionando a importância de instituições como a Presidência da República e o Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) para tornar essa utopia uma bem-vinda realidade.
Cintia Guedes citou fatos como uma pesquisa do Instituto Luiza Bairros de que há paridade entre estudantes e funcionários negros e brancos na Universidade Federal da Bahia, mas que há cerca de 3% de professores negros na mesma Instituição.
"Ainda temos um caminho gigantesco para caminhar e como trabalhar nesse sonho? Digo para os meus estudantes que, para uma mulher negra, há 300 anos atrás, o lugar que estou hoje era o impossível. Por isso eu digo que sou filha da distopia. É preciso direcionar esse sonho forte em direção do impossível, para além das condições que a realidade política mesquinha que temos nos oferta", explicou antes de concluir: "a realidade que vivemos é produzida para que a gente desapareça", defende.
[[galeria]]
Cofundador e diretor de projetos da Ponte Jornalismo, uma das instituições criadoras do Festival, Antonio Junião explicou que o FALA! é uma iniciativa que busca aproximar o jornalismo das pessoas e da vida das pessoas.
"O jornalismo de causa é um norte das organizações fundadoras do Fala. Queremos um jornalismo na sua origem. Poucas pessoas determinam o que e interesse público, quais agendas serão discutidas e a gente quer quebrar isso porque é um privilégio. O jornalismo de causa quer incluir mais gente do debate, da maneira que as pessoas querem. As pessoas têm identidade, território, cultura, linguagem", afirmou Julião.
Defensor da ideia de que a democracia do Brasil é frágil por conta das lacunas e das poucas vozes que definem quais são as agendas públicas, Junião acredita que iniciativas como o FALA! são um ponto de partida importante para questionar e mudar essa realidade.
"Precisamos acabar com essa divisão de classes que e violenta. Assim como a violência de raça e gênero. Uma sociedade que tem racismo, violência de gênero, não é democrática. Precisamos entender que democracia queremos e os problemas que temos", afirmou.
O Festival FALA! continua até o próximo sábado com uma série de oficinas e palestras. Confira a programação completa na lista abaixo. Toda a programação é gratuita e híbrida, com transmissão em tempo real nas redes sociais do evento. A mesa de abertura está disponível no player a seguir.
PROGRAMAÇÃO GERAL
26/08 - SEXTA-FEIRA
10h - INTERVENÇÃO ARTÍSTICA (atividade presencial) - Citação de poesia - Rilton Júnior, escritor, poeta e ator da Juventude Ativa de Cajazeiras
10h15 - MESA 1 (atividade simultânea presencial e online) - Entre redes e ruas: que democracia é essa? Uma discussão sobre a qualidade da democracia no Brasil, a partir da análise do debate público promovido nas redes e a realidade vivida nas ruas.
Participantes:Rosane Borges, doutora em ciência da comunicação pela ECA-USP (mediação) Célia Tupinambá, liderança indígena, professora, intelectual e artista da aldeia Serra do Padeiro Michel Silva, graduado em jornalismo pela PUC-RJ, é cofundador do jornal Fala Roça Midiã Noelle, jornalista e mestra em cultura pela UFBA 15h - MESA 2 (atividade simultânea presencial e online) - Novas resistências para velhas violações O papel da comunicação na construção de caminhos contra a barbárie.
Participantes:Valéria Lima, Mídia Étnica e Correio Nagô (mediação) Guilherme Soares, jornalista, consultor em diversidade e criador do Guia Negro Denise Mota, jornalista da Agence France-Press, No Toquen Nada e Folha de S. Paulo Claudia Wanano, comunicadora da Rede WAYURI, de São Gabriel da Cachoeira (AM) 18h30 - INTERVENÇÃO ARTÍSTICA (atividade presencial) - Apresentação de dança - Mano Sabota, b-boy e capoeirista
18h45 - MESA 3 (atividade simultânea presencial e online) - Uma cidade para todas as histórias Como artistas, movimentos sociais e comunicadores reivindicam e ocupam seu lugar de expressão e de direitos nos espaços urbanos gentrificados das grandes cidades.
Participantes:Mônica Santos, jornalista (mediação) Luna Bastos, artista visual e muralista Ana Flor, travesti, comunicadora e mestranda em Educação na USP Marcelos Teles, coordenador do Centro Cultural Que Ladeira é Essa 20h30 - INTERVENÇÃO ARTÍSTICA (atividade presencial) - Apresentação musical - Áurea Semiséria, MC e rapper de Cajazeiras
27/08 | SÁBADO
10h15 - INTERVENÇÃO ARTÍSTICA (atividade presencial) - Citação de poesia - Slam das Minas, poetry slam organizado e disputado por mulheres
10h30 - MESA 4 (atividade simultânea presencial e online) - Novas formas de ver e contar o mundo Linguagens e narrativas fora da curva que colocam o dedo na ferida e provocam o pensamento crítico misturando arte, cultura e jornalismo
Participantes:Semayat Oliveira, cofundadora do Nós, Mulheres da Periferia (mediação) Fabiana Lima, Slam das Minas Darwiz Bagdeve, professor universitário e escritor do HQ Guerreiro Fantasma, que apresenta uma Salvador futurista, sem perder as conexões com as raízes. Yane Mendes, cineasta periférica e uma das coordenadoras da Rede Tumulto, do Recife 15h - MESA 5 (atividade simultânea presencial e online) - Nós por nós. Identidade, cultura ancestral e combate ao silenciamento Organização de redes e produção de informação como instrumentos de luta, identidade e memória de grupos historicamente silenciados pela grande mídia.
Participantes:Naira Santa Rita, atua na área de direitos humanos e sustentabilidade Erisvan Guajajara, jornalista, defensor dos direitos indígenas, fundador e coordenador da Mídia Índia Joyce Cursino, jornalista, produtora e cineasta Natureza França, educadora, mestra em dança e produtora cultural, integrante do Quilombo Aldeia Tubarão e da Rede ao Redor 17h30 - INTERVENÇÃO ARTÍSTICA (atividade presencial) - Performance artística - Diego Mamba Negra, performer e artista
18h - MESA DE ENCERRAMENTO (atividade simultânea presencial e online): O jornalismo posicionado e suas subjetividades Contra o falso mito da imparcialidade. Por uma comunicação que tem lado e dialoga com a arte e a cultura
Participantes:Alma Preta Marco Zero Conteúdo Ponte Jornalismo 1 Papo Reto 20h - INTERVENÇÃO ARTÍSTICA (atividade presencial) - Apresentação musical - Grupo Pradarrum, músicas que valorizam a musicalidade dos terreiros de candomblé
PROGRAMAÇÃO DE OFICINAS: IMPORTANTE: Este evento será apenas presencial. As inscrições para o Festival dão direito a participar das Oficinas. (Sujeito a lotação)
Local: Espaço Cultural Boca de Brasa Horário: 14h00 e 15h15
OFICINA 1 - Pesquisa em Jornalismo: Vamos conversar? O diálogo entre prática e pesquisa em jornalismo 26/08, às 14h00.
Painelistas:Fabiana Moraes, jornalista, professora e pesquisadora do Núcleo de Design e Comunicação da UFPE, campus Caruaru Denis de Oliveira, jornalista e professor da ECA-USP OFICINA 2 - Arte e Cultura: a gente não quer só comida 26/08, às 15h15. Painelistas:Marcelino Freire, escritor e contista Miriam Alves, escritora literata OFICINA 3 - Direito à Comunicação: Porque não me calo: o debate interditado sobre o direito à comunicação 26/08, às 14h00.
Painelistas:Charô Nunes, Blogueiras Negras Daiene Mendes, Repórteres Sem Fronteiras OFICINA 4 – Pluralidade: Representatividade e empoderamento no centro do debate 27/08, às 15h15
Painelistas:Aline Midlej, jornalista Globo News Joyce Ribeiro, jornalista da TV Cultura Valéria Almeida, jornalista do programa Encontro