Ministério Público recomenda que escolas abatam o valor da mensalidade
Por conta da pandemia, contratos de educação infantil, inclusive, podem ser suspensos caso não haja acordo
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Priscila Natividade
priscila.oliveira@redebahia.com.br
Em meio às discussões entre pais e escolas pela redução das mensalidades por conta dos efeitos da pandemia da covid-19, o consumidor conquistou mais um argumento favorável a aplicação dos descontos pela falta de aulas presenciais.
O Ministério Público estadual recomendou, nesta quarta-feira (22), que todas as instituições da rede privada de ensino de Salvador elaborem propostas de renegociação de contrato com base nas suas planilhas de custos durante a suspensão das aulas e promovam descontos proporcionais. Também é orientada a abstenção de cobrança de juros e multas em casos de atraso no pagamento e de rescisões de contratos por parte dos pais.
No caso dos cursos de Educação Infantil, o MP destaca ainda que se suspenda a vigência dos contratos até o término do período de isolamento social, caso os pais não concordem com proposta de desconto ou compensação futura.
O MP deixa claro também que esta será a posição oficial do órgão com relação as queixas que chegarem nas promotorias do Consumidor: “O inteiro teor da presente recomendação será seguida em todos os casos concretos noticiados nas Promotorias do Consumidor da capital e em outras várias Promotorias do Estado, como parâmetro de atuação”, escreveu o MP.
Ou seja, as escolas tendem a perder muito mais lá na frente com a judicialização das reclamações que estão sendo trazidas pelos pais quanto a contração do serviço e a cobrança integral da mensalidade, como destaca o presidente da Comissão de Direitos do Consumidor da Ordem dos Advogados da Bahia (OAB-BA), Sérgio São Bernardo.
“É uma recomendação não é uma obrigação. Agora, uma recomendação do MP evidencia uma posição oficial do órgão. Isso terá influência sobre os magistrados que julgarão os processos lá adiante na pós-pandemia. A escola que negociar agora vai perder menos. Com a judicialização vai perder mais”, pontua.
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Planilhas x descontos O Sindicato das Escolas Particulares da Bahia (Sinepe) já tinha aconselhado as instituições a não reduzirem os valores por conta da manutenção da oferta de aulas em ambientes digitais. Procurado pelo CORREIO para comentar a posição do Ministério Público, a entidade não respondeu.
O Grupo Valorização da Educação formado atualmente por 80 instituições de ensino de Salvador, Lauro de Freitas e outras cidades afirmou a reportagem que os colégios não foram ouvidos pelo Ministério Público, porém estão analisando os pontos da recomendação. No início do mês, o grupo se comprometeu a reavaliar suas planilhas e estudar a possibilidade de fazer reduções de até 20%, a depender da situação financeira de cada escola.
Há um pouco mais de uma semana para o vencimento da próxima mensalidade escolar, que na maioria das escolas é paga até o 5º dia útil, alguns colégios começaram a divulgar as condições de redução. No caso do Colégio Montessoriano, localizado na Boca do Rio, o comunicado divulgado para os pais e responsáveis é de 30% para Educação Infantil e 20% no Ensino Fundamental e Médio para adimplentes.
Quem tem dívidas com a escola, pode fazer até o dia 24 de abril um acordo sem juros e multas, ter os descontos anteriores a pandemia mantidos e quitar o débito em seis vezes no cartão de crédito. Segundo o diretor financeiro da escola, Juraci Matos, as famílias estavam bem ansiosas por um posicionamento da escola: “Em nosso caso, o maior objetivo foi na preservação dos nossos recursos humanos. Tivemos que apertar os cintos para poder atender às nossas famílias. Sabemos que eles também estão neste exercício, além das incertezas em relação a emprego e renda”, afirma. A escola suspendeu também investimentos em reformas e ampliações e está renegociando contratos junto aos fornecedores. “Isso tudo é um efeito cascata. Mas cada um pode se apertar um pouco a fim de um bem comum”, completa. Outra iniciativa do colégio foi aumentar o percentual em R$ 50 o desconto com a doação voluntária de sangue. A expectativa é chegar até 100 bolsas para atender aos estoques de Bancos de sangue da cidade, como explica a diretora pedagógica do Montessoriano, Lúcia Matos.
“Sempre fizemos campanhas sociais ao longo do ano na escola e pensamos que esta poderia ser uma boa iniciativa neste momento, já que a doação de alimentos está bem em alta, mas não estávamos vendo uma ação mais efetiva com relação aos bancos de sangue. Estamos recebendo os atestados que comprovem a doação até o dia 5 de maio”.
Acordos flexíveis Ainda sobre a questão da cobrança integral do valor das mensalidades, a Superintendência de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon-BA) reforça que o momento é de buscar, o quanto antes, uma conciliação. Para o superintendente do órgão, Filipe Vieira, os pais devem pedir que a escola apresente nova programação pedagógica e planilha financeira de custos, para juntos avaliarem o preço justo pelo serviço.
“É preciso que os dois lados entendam a importância do seu papel fundamental e em ajudar a manter a escola ativa, sem que isso signifique o prejuízo da subsistência familiar”, afirma.
Qualquer pai, mãe ou responsável que tiver dificuldades em receber o serviço educacional, ou para negociar com a escola, deve denunciá-la ao Procon-BA pelo aplicativo ou e-mail denuncia.procon@sjdhds.ba.gov.br.
“A orientação é que os pais devem sinalizar suas dificuldades às escolas, e conciliar a melhor solução. Pedimos solidariedade aos dois lados”, acrescenta Vieira.
PRINCIPAIS RECOMENDAÇÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Ensino Médio e Fundamental *Abstenção por parte da escola de cobrança de juros e multas em caso de atrasos da mensalidade por prejuízos financeiros provocados pela pandemia.
*As escolas deverão buscar todos os modos de conciliação para a manutenção do contrato, no sentido de se evitar a judicialização destas situações.
*Apresentar para os pais a planilha de custos referente aos meses do período de suspensão das aulas, bem como a relativa ao ano letivo de 2020, elaborada sem a previsão na pandemia de covid-19.
*Conceder aos seus consumidores um desconto proporcional no valor da mensalidade de março, relativo aos dias em que não houve a prestação dos serviços, devendo esse desconto ser concedido na mensalidade do mês de abril, caso a mensalidade de março já tenha sido paga. O mesmo procedimento deve ser adotado nos próximos meses enquanto durar a pandemia do coronavírus.
*O valor do desconto deve ser proporcional a diminuição dos custos com a atividade presencial suspensa. Prestar esclarecimentos sobre a consequente modificação do calendário de aulas e de férias, informando também se fará a reposição integral das aulas presenciais ou se serão contabilizadas nas horas-aula as aulas não-presenciais.
*Envio de uma proposta de revisão contratual para vigorar durante o período de suspensão das atividades presenciais, com a previsão de atividades escolares de forma remota e valor mensal adaptado de acordo com as planilhas de custos referentes ao período de suspensão das aulas presenciais.
*Redução imediata do valor e suspensão de contratos acessórios, como atividades extracurriculares, alimentação e transporte, dentre outros serviços cobrados separadamente
*Não haverá cobrança de qualquer taxa ou multa por rescisão de contrato educacional durante o período da pandemia.
Educação infantil *A escola deve negociar uma compensação futura em decorrência da suspensão das atividades e/ou apresentar a planilha de custos, aplicando desde já o desconto, considerando as diferenciações da educação infantil.
*Caso o consumidor não concorde com a proposta, o MP recomenda que as instituições suspendam a vigência dos contratos até o término do período de isolamento social, negociando a devolução dos valores quando for o caso.
*O consumidor também poderá rescindir o contrato sem pagamento de qualquer encargo.