Divórcios aumentam 40% entre maio e junho na Bahia, segundo TJ-BA
Especialistas em Direito da Família afirmam que os casos tendem a aumentar depois da pandemia
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Marcela Vilar
marcela.vilar@redebahia.com.br
Dividir tarefas domésticas, perder a privacidade e conviver sob o mesmo teto sem poder sair de casa são algumas das situações impostas durante a pandemia a alguns casais, que já não conseguem continuar na relação. Dados do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), obtidos com exclusividade pelo CORREIO, revelam um aumento de 40% no número de divórcios na Bahia, entre maio e junho deste ano.
O cenário, contudo, é diferente, quando comparamos os meses de março a junho de 2020 com o mesmo período do ano passado: há uma queda de 57%. A baixa na comparação com os números de 2019 pode esconder um pouco a realidade, uma vez que houve aumento na procura pelo serviço neste último mês da pandemia e, principalmente, pela dificuldade de acesso ao poder judiciário durante o isolamento.
Especialistas em Direito da Família alertam ainda que os casos tendem a aumentar quando acabar a crise do novo coronavírus, já que alguns tipos de divórcio exigem a presença do juiz. A titular do 12º ofício de notas - que é o maior cartório da Bahia, Conceição Gaspar, afirma que o registro de divórcios na unidade aumentou 23% de março a junho deste ano, em relação ao mesmo intervalo de 2019. Destes, 8% foram divórcios virtuais, permitidos desde o início de junho pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
“A procura tem sido grande e aumentou nos últimos dias com a aplicação do e-notariado, que possibilitou que os divórcios sejam feitos por videoconferência e os documentos sejam enviados por e-mail, o que facilita muito a vida da população”, relata a tabeliã, que atua no cartório desde 1998.
No cartório Catizane, que fica na avenida Tancredo Neves, a quantidade também cresceu. “Estamos recebendo uma média de 5 divórcios por dia”, revelou Samantha Torres, que coordena o Setor de Escrituras Públicas do ofício. O normal, segundo ela, era um ou dois por semana. Dados Atrasados O promotor de Justiça do Ministério Público da Bahia, Cristiano Chaves, explica que a comprovação estatística do que vem acontecendo só virá após a pandemia. “Não vamos enxergar esse aumento agora. Essa diminuição (dos números do TJ-BA em relação a 2019) é completamente normal, porque as pessoas estão saindo menos de casa, elas estão sem dinheiro e só vão regularizar as situações quando voltarem ao seu dia a dia e suas atividades”, pontua o promotor, que também é professor de Direito da Família na Faculdade Baiana de Direito.
Em relação ao divórcio virtual, Chaves ainda indaga: “Por mais que seja possível protocolar por sistema eletrônico, as pessoas vão pra onde, se os hotéis estão fechados?”. Outro fator que contribui para que os dados estejam, de certa forma, atrasados, é a demora da judicialização de alguns processos. “O fato de ter um aumento da procura não significa imediatamente um aumento de sentença de divórcio, porque, mesmo que seja consensual, tem alguns procedimentos a serem seguidos, e, se for litigioso, demora ainda mais. Então a gente não consegue ter esse reflexo imediato”, conclui o advogado Luciano Figueiredo, mestre em Direito Privado e professor da Faculdade Baiana de Direito. Com a convivência mais intensa sob o mesmo teto, as divergências entre os casais se agravaram e esta pode ser uma das causas para o aumento nos pedidos de divórcio. “A pandemia realçou os conflitos entre casais, que perceberam o quanto é difícil dividir as tarefas domésticas, manter a privacidade, fazer atividades individuais como conversar com amigos ou trabalhar em casa” destaca o psicólogo Elídio Almeida, que atua com a terapia de casais há mais de 10 anos.
O especialista ainda diz que houve um aumento de 60% na procura por seus serviços. O principal problema dos atritos, segundo o psicólogo, é a má comunicação: “Muitas vezes eles se expressam mal, com tom de ironia, agressividade, e, às vezes, pegam carona em problemas do passado, o que pode contribuir para novos conflitos”.
Tipos de divórcio Existem dois tipos de divórcio no Brasil: o extrajudicial, que pode ser registrado diretamente no cartório se houver consenso entre os parceiros, e o que precisa da presença de um juiz no processo. Em ambos, é imperativo ter um advogado. A intervenção da Justiça se dá em todos casos nos quais não há acordo entre as partes e que envolvam incapazes - isto é, quando há um (a) filho (a) do casal ou quando a esposa estiver grávida, pois deve-se alinhar questões como pensão alimentícia, guarda da criança e regime de convívio.
Nessas situações, é necessário ainda um parecer do Ministério Público, que é o órgão que protege constitucionalmente os menores de idade. Salvo estas duas exceções, qualquer divórcio pode ser registrado no cartório na presença de um advogado e do tabelião titular. Quando há divisão de patrimônio, é preciso ainda um documento de declaração de bens da Secretaria da Fazenda, que pode demorar até 45 dias úteis para ser emitido. O benefício de entrar com a ação direto no Tabelionato é a economia de custo e tempo. No cartório, o processo pode durar 10 dias e as taxas variam de R$ 237,66 a R$ 17.960.94, dependendo do tamanho do patrimônio envolvido, do valor da pensão alimentícia e como isso será dividido. Já um processo judicial tem custo de R$ 93,42 a R$ 11.676,72 e pode demorar, no melhor cenário, 30 a 180 dias, se não houver litígio. Se houver, pode durar cerca de oito anos.
Apesar de ter um mínimo e um teto maior, as taxas progressivas do cartório são menores que a dos processos na Justiça. Além disso, o valor pago a um advogado é mais baixo: o mínimo é R$ 2, 4 mil e pode ser usado somente um para representar os dois divorciandos. Já nos processos judiciais, um defensor custa no mínimo, R$ 3 mil para cada divorciando, num divórcio consensual e, se houver litígio, o preço mínimo sobre para R$ 4,8 mil. Divórcio virtual Com a pandemia, o Conselho Nacional de Justiça regulamentou, no início de junho, o divórcio online, que é a possibilidade de fazer o divórcio extrajudicial sem sair de casa. A partir da criação do Sistema de Atos Notariais Eletrônicos (e-Notariado), tudo que se precisa é enviar um e-mail com os documentos de cada cônjuge: rg, cpf, comprovante de residência, certidão de casamento e uma petição feita pelo advogado. Após o pedido, será feita uma sessão virtual com o advogado, os divorciandos e o tabelião para formalização do ato. Em seguida, o cartório emite a certificação digital do divórcio. As taxas são as mesmas do procedimento presencial. Consenso Por conta da demora que um divórcio pode levar, a advogada Lizandra Colossi, que integra o Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), indica que o melhor a se fazer é evitar a judicialização do processo, e, se não for possível - como nos casos que envolvem filhos menores de idade e partilha de bens - tentar chegar a um consenso. “Tento resolver tudo no escritório para apenas apresentar o acordo ao MP e pedir a homologação ao juiz”, explica a advogada, que se tornou especialista em advocacia consensual no último ano.
Número de divórcios na Bahia (fonte: TJ-BA)
2019 Março: total de 2023, sendo 1305 julgados
Abril: total de 2108, sendo 1290 julgados
Maio: total de 2181, sendo 1353 julgados
Junho: total de 1587, sendo 971 julgados
Total de março a junho de 2019: 7.899 divórcios
2020
Março: total de 1483, sendo 538 julgados
Abril: total de 545, sendo 136 julgados
Maio: total de 549, sendo 70 julgados
Junho: total de 769, sendo 95 julgados
Total de março a junho de 2020: 3.346 divórcios
Custos do divórcio Na Justiça: de R$ 93,42 a R$ 11.676,72 No cartório: R$ 237,66 a R$ 17.960.94
Custo de um advogado (fonte: OAB)
Divórcio Judicial: - Consensual: valor mínimo de R$ 3 mil. Se for cumulado com partilha de alimentos e/ou bens, o valor mínimo é de R$ 3,6 mil reais + 6% do valor da partilha
- Litigioso: valor mínimo de R$ 4,8 mil. Se for cumulado com partilha de alimentos e/ou bens, o valor mínimo é de R$ 6 mil + 10% o valor da partilha
Divórcio Extrajudicial em Cartório: R$ 2, 4 mil + 6% da partilha de alimentos ou patrimônio, se houver
*Sob orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro