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5 tannats uruguaios para (re)conhecer a uva


 

Cerca de 70% dos vinhos do Uruguai são absorvidos por consumidores brasileiros

  • Paula Theotonio

Publicado em 13/04/2024 às 10:30:27
Seleção de vinhos uruguaios. Crédito: divulgação

Tânica, sim. Poderosa, com certeza. E – por que não? – divertida. Pelo menos, foi a impressão que ficou após passar seis dias provando vinhos com a tannat, uva francesa de Madiran lindamente radicada no Uruguai. É nesse recanto charmoso da América Latina que a variedade vem se afastando cada vez mais da imagem de difícil e rústica para viver sua faceta versátil; entregando tanto tintos frutados e fáceis de beber quanto outros com estilo encorpado e marcante.

Hoje são 1.630 hectares plantados só com ela em todas as regiões vinícolas do país, segundo a Uruguay Wine — entidade promotora da vitivinicultura no país. Quase um terço dos tannats produzidos no mundo vêm dessa nação com 3,5 milhões de habitantes. Só Salvador tem 2,4 milhões de pessoas, imagine!

E falando em Brasil, nós somos seu principal mercado: em torno de 70% dos vinhos destinados à exportação são absorvidos pelas nossas importadoras. E também somos seus principais visitantes: em vinícolas como a Spinoglio, 80% dos enoturistas são brasileiros e é comum, em todas elas, ser recebido por uruguaios quase fluentes em português.

Hoje, quero levar vocês em um passeio por vinícolas interessantíssimas que fazem tannats com diferentes propostas; e que, para além dessa uva, elaboram vinhos espetaculares com outras castas que vêm brilhando no país, como cabernet franc e albariño.

O tannat moderno da Pizzorno (15900 Canelones, Uruguai)

A Pizzorno será, de todas as vinícolas que citarei aqui, a que mais me impressionou no seu receptivo. Desde a coordenação do atendimento até a degustação guiada, tudo parecia perfeitamente delineado para o bem-estar do turista. Fundada em 1910, apresenta uma estrutura familiar, processos manuais e clima aconchegante, que contrastam com a proposta moderna e divertida de alguns de seus vinhos. É o caso do Pizzorno Mayúsculas Tannat (R$ 139,90 na Grand Cru), elaborado por uma técnica chamada maceração carbônica e que gera vinhos com taninos mais baixos, acidez moderada, cor brilhante, muita fruta e aromas curiosos, como banana caramelizada. Ou seja, facílimo de beber até mesmo no calor. Se você optar pela visita com degustação clássica e almoço harmonizado, terá a chance de viver um almoço delicioso, com direito a bife ancho e panquecas com doce de leite. Ou, melhor ainda: aproveite para dormir na Pizzorno Logde & Wine, que possui instalações aconchegantes e de alta qualidade para uma noite saborosa e restauradora.

O tannat clássico da Bouza (Cno. de la Redención 7658, 12500 Montevideo)

A Bouza é uma visita obrigatória no Uruguai. Fundada em 2002, a vinícola boutique é uma das mais conceituadas do país e também é bem pequena: possui cerca de 45 hectares de vinhedos espalhados pelas regiões de Maldonado, Canelones e Montevidéu. As variedades cultivadas são tannat, merlot, tempranillo, pinot noir, chardonnay, alvarinho, riesling e semillon; gerando pelo menos 180 mil garrafas por safra. Cerca de 40% de toda a produção vem pro Brasil! A visitação é feita no vinhedo Las Violetas, em Montevidéu, onde os vinhos também são elaborados em uma bodega pequena. Ao longo do tour, caminhamos por videiras de tannat, onde a colheita é manual e por vezes noturna; galpões de arquitetura mais antiga, um vagão de trem que vai virar um wine bar e o famoso museu de carros antigos, onde os visitantes degustam os vinhos da marca. Dos 4 vinhos provados, dois foram com tannat: o Bouza Tannat 2021, varietal estruturado com estágio de 16 meses em barricas de carvalho de segundo ou terceiro uso; e o apaixonante blend Bouza Monte Vide Eu 2021 (por volta de R$ 564), que acabou de levar 94 pontos no Guia Descorchados. A tannat é uma uva que cresce ainda mais em cortes e esse é um grande exemplo: aqui ela compõe 50% do vinho e é complementada por 30% de merlot e 20% de tempranillo. Um vinho potente mas equilibrado, repleto de frutas negras maduras e ervas com notas de especiarias, com lindo final persistente.

O tannat floral da Bracco Bosca (Carretera Sosa Diaz km 43.500 - Piedra del Toro, Atlántida, Canelones)

A cerca de 45 km de Montevidéu e a 8 km do mar fica a grandiosa Bracco Bosca. Grande, sim, devido aos seus vinhos e pessoas; porque, na verdade, estamos falando de uma vinícola boutique que atua em escala humana e possui apenas 11 hectares para produção de vinhos finos. Quando não somos recebidos pela proprietária, a solar Fabiana Bracco Bosca, somos atendidos por profissionais como Andrés, que nos guiou por uma saborosa degustação premium de 6 vinhos. Curiosamente, entre eles, não estava nenhum tannat, mas não se furte de provar o Ombú Reserve Tannat (R$ 129 na Dia Wine), um tinto com excelente equilíbrio entre potência e frescor, com notas de frutas, flores, ervas e especiarias. Notas florais, inclusive, que surgem em quase todos os vinhos que provamos, dos mais leves aos mais encorpados. A Tannat é, claramente, sua porta de entrada para belíssimos rótulos como o Gran Ombú Cabernet Franc, que recebeu nada menos de 94 pontos no Guia Descorchados 2024. Para aproveitar tudo o que essa bodega pode oferecer, hospede-se numa das suas cabanas de luxo com vista para os vinhedos. Chamadas de Ombú & Gran Ombú, são belíssimos refúgios para uma noite romântica.

O tannat atlântico da Deicas (Ruta 5 km 38200, Juanicó, Canelones)

Tudo na Deicas é impressionante. Desde as suas instalações em Canelones, dentro de construções jesuítas do século XVIII; passando pela pesquisa sobre os terroirs de seus 10 vinhedos espalhados pelo Uruguai e, claro, chegando nos seus grandes vinhos. São diversas linhas, incluindo rótulos mais simples e com excelente custo-benefício; até vinhos de parcelas e o famoso Preludio Barrel Select Tinto Blend (R$ 375 na Todovino), um dos primeiros blends de guarda a serem elaborados no país. Feito com tannat, cabernet sauvignon, cabernet franc, merlot, marselan e petit verdot de cachos selecionados em seus melhores vinhedos, os vinhos estagiam por até 30 meses em barricas numa cave exclusiva, construída em pedra em 1745, e a cada 6 meses as melhores são selecionadas para seguir no corte. Após engarrafado, passa 2 meses descansando na cave antes de seguir pro mercado. Um vinho para grandes momentos! Mas como eu disse no começo, a Deicas encanta até na linha “de entrada”. Na degustação Atlantic Wines, composta por vinhos de alta influência do Oceano Atlântico, pude conhecer o suculento Atlántico Sur Reserve Tannat (R$ 137,99 na Todovino), elaborado sem uso de barricas, com notas de frutas frescas, flores e toque mineral, textura sedosa, além de boa acidez e persistência. Seus companheiros de linha, o Albariño e o Rosé de Pinot Noir, são igualmente deliciosos e surpreendentes.

O tannat histórico da Spinoglio (Av. Don Pedro de Mendoza 8238, 12400 Montevideo)

A Spinoglio foi fundada em 1961, mas a tradição da vitivinicultura já fazia parte da linhagem da família, proveniente do Piemonte (Itália) e que imigrou para o Uruguai no apagar das luzes do século 19. Foi com intuito de dar continuidade a esse legado que Angel Spinoglio adquiriu uma bodega que já produzia vinhos desde 1898. Todo esse histórico é ressaltado no enoturismo, que contém um passeio por uma espécie de museu com equipamentos antigos de vinificação e registros fotográficos; na preservação de grandes tanques de concreto e tonéis gigantes de mais de 60 anos; e também na manutenção de um vinhedo antigo de uva Isabel com cerca de 120 anos. O vinho que mais me fascinou na experiência premium com almoço foi o Spinoglio Tonel Diez Corte Único (infelizmente, não disponível no Brasil), um corte de Tannat, Merlot e Cabernet Franc de diversas safras entre 2009 e 2018. Complexo e ao mesmo tempo fácil de beber, é vivaz e traz notas de fruta vermelha e negra maduras com toques florais, terrosos e especiarias. Da chegada, passando pelo delicioso almoço no restaurante Monfrà até a degustação, todo o tour foi conduzido por Cecília Baldi, uruguaia com português impecável e paixão pelas músicas de Ivete Sangalo.

DICAS

Como visitar as vinícolas? Você pode agendar separadamente com cada uma ou fazer toda a programação no site da Wine Locals, agência especializada em enoturismo sediada no Brasil e repleta de roteiros especiais por diversas vinícolas brasileiras, uruguaias, chilenas e argentinas.

Como trazer vinho na viagem? O aeroporto de Carrasco não permite o transporte de vinhos na bagagem de mão, exceto os que forem adquiridos no duty free pelo valor máximo de U$ 500. A proibição é válida tanto na entrada quanto na saída do país, além de voos com escala. Para voltar com os rótulos comprados nas vinícolas é necessário despachar a bagagem, podendo trazer até 5 litros por pessoa.