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A exclusão dos afrodescendentes nas Olímpiadas


 

O Brasil estreou no alto pódio, medalha de ouro, com um atleta negro, Ademar Ferreira da Silva, o campeão do salto triplo

  • Nelson Cadena

Publicado em 04/07/2024 às 05:00:00

Quando o futuro campeão da São Silvestre, Alfredo Gomes, um negro, participou da maratona da Olímpiada de Paris de 1924, o paraibano, neto de escravos, foi um dos afrodescendentes pioneiros, entre os atletas sul-americanos, se não o pioneiro. Argentinos e Uruguaios eram brancos. O negro foi excluído dos Jogos Olímpicos de Atenas, em 1896 e de Paris, em 1900. Em 1904 estrearam representados por dois zulus que correram a maratona descalços e portando chapéu de palha.

Os zulus não tiveram uma boa colocação e o seu desempenho medíocre foi motivo de chacota. A Enciclopédia Britânica usou como argumento para afirmar a suposta inferioridade da raça negra. O Barão Pierre de Coubertin, ao contrário, proferiu a célebre frase: “o negro, o vermelho e o amarelo ainda aprenderão a correr, a saltar, e arremessar muito melhor do que o branco”. Tinha razão. Vermelho referia-se aos americanos, referência dos índios pele vermelhas dos Estados Unidos.

O Brasil estreou no alto pódio, medalha de ouro, com um atleta negro, Ademar Ferreira da Silva, o campeão do salto triplo e lenda da modalidade, somente em 1952, repetiu a sua performance em 1956 e inspirou Nelson Prudêncio e João Carlos de Oliveira, também afrodescendentes, que subiram no pódio do salto triplo com pratas e bronze nas Olímpiadas de 1968,1972, 1976 e 1980. Afrodescendentes continuaram a brilhar no topo do pódio, na Olímpiada de 1984, com o ouro de Joaquim Cruz, nos 800 metros.

Daí por diante, os medalhistas olímpicos nas provas individuais, a conquistar a medalha de ouro, se dividiram entre negros e brancos, nenhum amarelo, estes com algumas pratas e bronzes, em outros esportes, em especial no judô. Celebramos o podium de Robson Conceição no boxe e Rafaela Silva, no judô, em 2016 Rebeca Andrade, Isaias Queiroz e Herbert Conceição, na ginástica, canoagem e boxe, nos jogos de Tóquio, em 2020. Totalizamos 19 medalhas de ouro, com atletas individuais, na nossa trajetória olímpica, oito de afrodescendentes, onze de brancos e pardos.

No meu último artigo sobre as Olímpiadas, chamei a atenção para a exclusão das mulheres da iconografia oficial nos 29 cartazes oficiais dos jogos, uma apenas, a deusa camponesa Atena, em 1896. Já referências de atletas negros e mulatos, deixei para destacar hoje, nenhuma. E continuará nenhuma nas próximas, enquanto prevalecer a tendência estilística de grafismos, símbolos e mascotes.

A Olímpiada de Berlim, em 1936, calou os escrivas da Enciclopédia Britânica com o desempenho dos atletas negros norte-americanos que dominaram as provas de atletismo: Jesse Owens, com quatro medalhas de ouro, deixou Hitler, que apostava na dita superioridade Ariana, em estado colérico. Babou de raiva.

Nelson Cadena é publicitário e jornalista, escreve às quintas-feiras