Perigo molhado: Inema tem apenas seis fiscais para 335 barragens na Bahia
Relatório aponta 10 barragens com risco de rompimento na Bahia
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Georgina Maynart
georgina.maynart@redebahia.com.br
Na Bahia, há 426 barragens registradas junto à Agência Nacional de Águas (ANA) e, destas, 335 são fiscalizadas pelo Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), ligado ao governo do estado. Mas, para fazer esse trabalho, o órgão conta com uma equipe de apenas seis fiscalizadores, que passam por uma capacitação de 40 horas.
O estado com o maior número de fiscalizadores é o Ceará (12), seguido de São Paulo (11). Órgãos federais somam 35 fiscalizadores, segundo consta em relatório, divulgado nesta segunda-feira (10), que aponta que a Bahia tem 10 barragens com estrutura comprometida e risco de rompimento - o estado lidera o ranking no Brasil.
De acordo com o Relatório de Segurança de Barragens - 2017, publicado pela Agência Nacional de Águas (ANA), 67% das equipes de fiscalização contam com até cinco membros. Apesar disso, o Manual de Políticas e Práticas de Segurança de Barragens para Entidades Fiscalizadoras estima a necessidade de 10 a 20 técnicos para fiscalizar de 301 a 1.000 barragens - como é o caso da Bahia.“O principal desafio dos órgãos fiscalizadores é de fazer que as equipes de segurança de barragens realizem esta tarefa de forma exclusiva”, diz trecho do relatório.Em nota, o governo da Bahia disse que foi o estado que mais cumpriu metas de fiscalização e vistoria de barragens e o único a atender integralmente ao que foi previsto e pactuado com a ANA.
“A Bahia é um dos poucos estados que tem informações, onde a população pode dormir tranquila porque os órgãos públicos estão atuando, fazendo o trabalho preventivo. Quando a gente indica que está em risco, a gente corre atrás e cobra a correção desses procedimentos”, disse o diretor de Águas do Inema, Eduardo Topazio.
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Risco A Bahia é o estado que possui o maior número de barragens com problemas de impacto na segurança. Pelo menos é o que afirma o relatório divulgado pela ANA. Na lista nacional das 45 barragens com algum comprometimento estrutural importante e risco de ruptura, dez estão na Bahia - 22%. O levantamento foi realizado a partir de dados fornecidos pelos órgãos fiscalizadores de cada estado. No caso da Bahia, a fiscalização de 335 barragens - de um total de 426 - é feita pelo Inema.
Em todo o país, o número de barragens com estrutura comprometida subiu de 25 em 2016 para 45 em 2017. Das 24.092 barragens espalhadas pelo Brasil, 723 foram classificadas tanto na categoria de risco, como na categoria que indica alguma espécie de dano potencial associado.
Na Bahia, as estruturas com risco são: Afligidos (em São Gonçalo dos Campos), Apertado (Mucugê), Araci (na cidade de mesmo nome), Cipó (Mirante), Luiz Vieira (Rio de Contas), RS1 e RS2 (Camaçari), Tabua II (Ibiassucê), Zabumbão (Paramirim) e Pinhões (Juazeiro/Curaçá).
O documento também mostrou que, das barragens sob fiscalização do Inema, 204 apresentam alta categoria de risco e 286 com alto potencial de dano (em caso de rompimento). A categoria de risco diz respeito, segundo a ANA, a aspectos da própria barragem que podem influenciar em acidentes.
Esse é o segundo relatório da ANA desde o maior desastre ambiental do país, rompimento da barragem de Fundão, da Samarco, em Mariana (MG) - 19 pessoas morreram e Rio Doce foi contaminado, em novembro de 2015.
Os problemas apontados no documento vão desde o baixo nível de conservação até a falta de documentos que comprovem a estabilidade da barragem. Infiltrações, rachaduras e erosões são os problemas que mais aparecem na lista.
Araci A situação mais grave, segundo o relatório, é da Barragem de Araci, no município de mesmo nome, no Nordeste da Bahia. A barragem foi construída para represar as águas do Rio Pau-a-Pique e amenizar as dificuldades dos moradores da região no período de estiagem.
O relatório aponta que a estrutura apresenta rachaduras no coroamento da barragem, indica um alerta e diz que o valor estimado para reforma seria de R$ 180 mil. Barragem de Araci fica no município de mesmo nome, no Nordeste da Bahia (Foto: Reprodução) A obra foi feita no açude de Araci em 1965 e é administrada pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs). Em entrevista ao CORREIO, no entanto, o engenheiro civil Raimundo Goethe Peixoto Junior, responsável pelo setor de segurança das barragens do Dnocs no estado da Bahia, descartou qualquer possibilidade de rompimento.“Algumas anomalias são comuns em barragens mais antigas, como a de Araci. Houve um período em que ela chegou a secar. Às vezes, nesses casos, ocorre expansão ou contração do solo, e isso influencia no material da barragem. Mas não há risco de rompimento”, explicou Raimundo Goethe.Ainda segundo ele, foram feitos serviços de recuperação, sondagens e a barragem não voltou a apresentar rachaduras. O engenheiro acrescentou que a barragem, atualmente, é pouco utilizada, pois a água está salinizada, devido ao baixo nível do rio.
‘Nenhum risco’ Embora os dados referentes à Bahia que constam no relatório tenham sido enviados pelo Inema, o diretor de Águas do órgão, Eduardo Topazio, contestou o resultado e afirmou que “não há nenhuma barragem em risco iminente de ruptura” no estado.
Ainda de acordo com ele, o relatório divulgado pela ANA “não reflete a realidade”, porque, além de conter dados de 2017, utilizou “um universo de apenas 3% das barragens de todo o país”.
Por meio de nota, o governo do estado também questiona o número de barragens cuja administração é atribuída ao governo. No relatório, são três aos cuidados da Companhia de Engenharia e Recursos Hídricos da Bahia (Cerb). Já o governo diz cuidar somente da Barragem de Apertado, que fica em Mucugê, no Centro-Sul. A de Afligidos e Cipó já teriam sido entregues aos municípios.
Segundo o governo estadual, a Barragem de Apertado “não se encontra em risco de ruptura”. O Inema destacou que o equipamento “não oferece riscos à população e nem ao meio ambiente”. Barragem de Apertado fica na cidade de Mucugê, na Chapada Diamantina; governo nega que haja risco (Foto: Divulgação) Ao CORREIO, o secretário de Cultura, Turismo e Meio Ambiente de Mucugê, Euvaldo Ribeiro Júnior, disse que “não tem constatado riscos”. Ele recebeu no mês de maio um relatório de vistoria da Cerb que não aponta riscos.“Onde a gente encontra problemas são em barragens de órgãos federais extintos, que terminaram sendo relativamente abandonadas, como as do Dnocs e Codevasf, onde o estado tem buscado auxiliar nesse processo, mesmo não tendo responsabilidade objetiva”, diz a nota do governo.Mais barragens Outras três barragens administradas pelo Dnocs estão na lista das 10 em maior risco: Luiz Vieira (Rio de Contas), Pinhões (entre Juazeiro e Curaçá) e Tabua II (Ibiassucê). Em todo os casos, diferente do que diz o relatório e o governo do estado, o engenheiro do Dnocs descartou riscos mais graves de rompimento.
“Risco de rompimento não existe. A gente pede sempre recursos para fazer a manutenção e reparos de itens que aparecem nas inspeções, que apresentam alguma falha. Algumas apresentam vegetação, taludes que não deve ter, erosões, pequenas fissuras. Mas são manutenções corretivas, que precisam ser recuperadas. Não há nenhum risco na segurança dessas barragens, com relação a ruptura”, garantiu Raimundo Goethe.
A fiscalização constatou ainda que, nas barragens em Camaçari, mantidas pela Distribuidora de Água de Camaçari (DAC/Cetrel), havia árvores e formigueiros comprometendo o equipamento.
Em nota, a Cetrel disse que, nos últimos anos, tem investido na segurança e na confiabilidade das barragens RS1 e RS2, que armazenam água para situações de combate a incêndio no Polo Industrial de Camaçari.“Em 2018, foi concluída a substituição da tubulação do extravasor da RS1, um investimento de, aproximadamente, R$ 1 milhão. Em 2019 serão investidos mais R$ 300 mil para a elaboração de um projeto de melhorias que trará ainda mais robustez e segurança ao sistema”, diz a nota da Cetrel.Há, ainda, a Barragem de Zabumbão, em Paramirim, sob a responsabiliade da Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (Codevasf), que não foi localizada até o fechamento desta edição. Barragem do Zabumbão, em Paramirim, é administrada pela Codevasf (Foto: Reprodução) Problema nacional No Brasil, a maioria das 45 barragens consideradas vulneráveis apresenta problemas de baixo nível de conservação, falta de documentos que comprovem a estabilidade da barragem ou até insuficiência do vertedor.
Das 24.092 barragens espalhadas pelo país, 723 foram classificadas tanto na categoria de risco, como na categoria que indica alguma espécie de dano potencial associado. Elas correspondem a 13% do total analisado. Significa que estas apresentaram algum aspecto que pode influenciar na possibilidade de ocorrência de acidente e que podem provocar algum dano causado em caso de rompimento.
Outras 3.545 barragens foram classificadas pelos agentes fiscalizadores apenas na categoria de Risco (CRI), enquanto 5.459 receberam classificações relacionadas ao Dano Potencial Associado (DPA).
As mais de 24 mil barragens do Brasil foram construídas para diversas finalidades, desde acúmulo de água, rejeitos de minérios ou industriais ou para geração de energia. A maior parte, 9.827, são barragens de irrigação.
Os dados O levantamento da ANA inclui dados coletados entre 2016 e 2017. No período indicado foram registrados quatro acidentes e 10 incidentes envolvendo barragens, mas não foram registradas vítimas fatais.
O relatório faz parte da Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB), instituída por lei em 2010. A lei aponta algumas diretrizes para atuação dos órgãos fiscalizadores e para empresas privadas que atuam no segmento.“É muito importante identificar as barragens que devem atender à PNSB, para priorizar as ações que garantam a sua integridade e segurança, além de repassar essas informações à sociedade”, disse o diretor da ANA, Oscar Cordeiro Netto.O relatório aponta que aumentou o número de barramentos cadastrados, de 73% para 97% do total, mas estima que o represamento artificial seja pelo menos três vezes maior do que o registrado oficialmente.
“O aumento no número de barragens cadastradas, na classificação das barragens e na identificação dos empreendedores são provas do avanço até aqui, mas o número reduzido de inspeções e de planos de segurança mostra o desafio pela frente. Para seguir avançando e garantir a segurança, fiscalizadoras, empreendedores e sociedade precisam se engajar cada vez mais”, completou Netto.
Segundo o levantamento, o Dnocs é o maior proprietário de barragens do Brasil, 253 no total. Atualmente, 179 barragens são identificadas como de acumulação em rios de domínio da União. Há 41 barragens em processo de regularização da outorga. Segundo a ANA, em 2017, foram aplicados 34 milhões de reais em serviços de operação, manutenção e recuperação de barragens. O volume é três vezes maior do que ano anterior.
Fiscalizadoras O Brasil possui 43 agentes fiscalizadores da situação das barragens. A competência de cada um depende do tipo de barragem ou da localização do rio, se de domínio federal ou estadual. Por exemplo, as barragens para geração de energia elétrica são fiscalizadas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), enquanto as barragens de rejeitos minerais são de responsabilidade da Agência Nacional de Mineração (ANM). Já as barragens de usos múltiplos, geralmente, são fiscalizadas por órgãos estaduais.
O estudo também aponta que em 2017, foram feitas 780 fiscalizações, cerca de 16% a menos do que ano anterior. Não há nenhum ato de autorização, outorga ou licenciamento em 42% das barragens e em 76% dos casos não está definido se a barragem é ou não submetida à lei.
*Com supervisão das editoras Mariana Rios e Clarissa Pacheco.