Marco Siqueira: ‘A Odebrecht voltará a ocupar o seu papel’
Presidente da OEC fala sobre o processo de recuperação da empresa pós-Lava Jato
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Da Redação
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A Odebrecht vai voltar a ocupar o papel relevante que sempre teve na construção civil brasileira e no desenvolvimento do país. Quem garante isso é o arquiteto Marco Siqueira, novo presidente da OEC – Odebrecht Engenharia e Construção. Ele acredita que um programa para estimular investimentos na área de infraestrutura pode ajudar o país a superar mais rapidamente a crise provocada pela pandemia do novo coronavírus.
“Nós passamos por um processo bastante traumático no setor de infraestrutura. Quando a gente cita a China, por exemplo, as empresas de lá chegam com a sua cadeia de produção e com a capacidade de financiamento”, destaca, ressaltando que as empresas brasileiras têm dificuldades neste sentido atualmente. Ele foi o convidado da live Política & Economia, no Instagram do CORREIO (@correio24horas), apresentador pelo jornalista Donaldson Gomes.“Veja que neste governo, o financiamento que era feito através do Bndes (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), por questões que não vou entrar aqui, mas também por questões ideológicas, foi colocado como algo fora da equação e com isso deixamos de exportar serviços”, diz. Marco Siqueira lembra que o processo não compreende apenas a obra em si e lembra que a OEC já foi a maior exportadora de botas do Brasil. “Quando você pensa na cadeia de produção destes equipamentos e do serviço sem si é muito extensa”, destaca. Ele lembra que o Bndes trabalha atualmente no sentido de prover garantias e não mais o financiamento e considera a estratégia válida. “A gente tem que buscar atuar com as ferramentas existentes, mas a concorrência vence com esse pacote todo, principalmente quando a gente fala do que a China vem fazendo no Brasil e na América Latina”, destaca.
O presidente da OEC acredita que com o tempo vai se criar uma “nova normalidade” no mercado brasileiro de infraestrutura. “Dentro desse período que passou, que vai ficar gravado como um período importante, vamos reestabelecer nossa capacidade. Há uma mudança estrutural no mundo”, acredita.
Questionado sobre o projeto da Ponte Salvador-Itaparica, cuja licitação foi vencida por um consórcio chinês, Siqueira disse que gostaria de ver a Odebrecht à frente da obra, mas ressaltou a expectativa de ver a empresa tocando outras grandes obras no futuro. “Eu queria estar lá fazendo, mas tem as condições que a gente não pode ignorar. É um projeto ambicioso, tem as condições financeiras, transporte de cargas. Eu não vou chorar pelo que não estou fazendo. Na Bahia, tem inúmeras oportunidades”, destacou. “É inegável ver a recuperação de Salvador, tem muita coisa a ser feita, a gente vai olhar de hoje para o futuro. Você pode contar que a Odebrecht vai estar muito mais presente de agora em diante e em várias frentes”, promete.
Hoje, após mais de três anos em reestruturação, Marco Siqueira diz que a empresa já percebe os reflexos do processo de reestruturação, que foi iniciado após a decisão do Grupo Odebrecht de colaborar com as investigações da Operação Lava Jato. “Quando a gente olha para o ambiente futuro, eu vejo a Odebrecht muito forte e a OEC puxando essa fila, até porque casa com este momento da necessidade do país de investir em infraestrutura. Está tudo totalmente alinhado”, acredita. Hoje a OEC possui pouco mais de 13 mil pessoas empregadas, entre trabalhadores diretos e indiretos. “Poderia estar com mais, uma de nossas características é a positividade e vamos caminhar para ter mais projetos e gerar mais empregos, principalmente nesta retomada depois desta pandemia”, acredita.
Atualmente, a OEC possui 25 projetos em andamento, metade no Brasil e metade no exterior. “Hoje o faturamento está bem dividido, tanto em projetos quanto em faturamento entre o Brasil e o exterior”, diz. A atuação está concentrada tanto em segmentos tradicionais, como estradas, portos, pontes, mas também em um tipo de engenharia que gera muitos empregos, que é a atuação em manutenções industriais.
Além disso, estão no horizonte projetos na área de saneamento, impulsionados pelo novo marco do setor, mas também de irrigação, como o projeto do Baixo Irecê. “Projetos de irrigação alimentam cadeias muito importante, porque entra o agronegócio, estimula a exportação e tem uma capacidade de multiplicação econômica que é muito interessante”, destaca.
Entre os segmentos que a OEC pretende intensificar a atuação está o eólico. Marcos Siqueira destacou o potencial para a produção de energia limpa da Bahia. “Há um grande potencial em regiões inclusive distantes da capital que nós vamos perseguir”, destaca.
Ele cita ainda as obras relacionadas à “infraestrutura tradicional”, como estradas e pontes, além de serviços industriais relacionados à área de óleo e gás. “Estamos vendo o processo de privatização das refinarias e isso vai demandar muita coisa na área de montagem industrial, que é uma área em que somos muito fortes”, diz.
Para Marco Siqueira, os investimentos na área de infraestrutura são o melhor caminho para a recuperação da economia brasileira neste momento, além de ajudar a melhorar as condições da atividade econômica no Brasil. “Infraestrutura é o que a gente precisa para melhorar nossas condições como país. O agronegócio precisa, nossas cidades precisam, modais de transporte precisam melhorar. A saúde precisa disso. “Nossa missão missão é buscar mais projetos, mais obras e gerar cada vez mais empregos”, destaca. “Primeiro nós fomos buscar no mercado profissionais de referência na área de controles de governança, de compliance”, conta. Ele lembra que culturalmente, a empresa tinha uma gestão descentralizada e não possuia uma governança central, apenas “um sistema de comunicação que consolidava esses projetos”. “Tivemos que aprender”, lembra.
Ele lembra que a Odebrecht seguiu mais de cem recomendações de alterações que foram desde a forma de contratar até o estabelecimento de uma base de fornecedores única. Muitas dessas alterações foram sugeridas por autoridades estrangeiras e brasileiras. “Tudo isso foi feito, houve uma concentração de esforços e um investimento muito grande da empresa neste processo e agora a gente começa a ver um retorno disto tudo”, ressalta.
“Em processos recentes, quando temos conversas com investidores ou mesmo com bancos e eles tem a completa visão do nosso programa, fica muito clara a robustez desse processo e o quanto ele é verdadeiro e transformador. Isso já tem nos posicionado de forma muito positiva”, destaca.
Segundo ele, de junho para cá, a empresa conquistou três novos contratos e em todos eles parte importante é a demonstração do programa de governança.
Marco Siqueira diz que há um esforço generalizado no setor da construção para ter uma atuação correta. “Existe uma consciência no mercado que a atuação correta traz mais eficiência e mais produtividade. Eu acho que a boa governança é amiga da produtividade e isso nunca vai sair de moda no mundo dos negócios”, destaca.
A mudança no nome da tradicional Construtora Norberto Odebrecht aconteceu como parte do processo de reestruturação da empresa desde 2016. “Houve uma concentração de esforços no sentido de abraçar um projeto de governança amplo que todos abraçaram”, conta. “Uma das vertentes foi a questão da marca e a maneira como ela se apresenta e no próprio trade”, destacou, complementando que se tratou mais de uma composição de marca.
Antes havia uma visão de marca unificada entre as empresas do grupo, lembra. Depois, partiu-se para uma visão mais individual. “Para o mercado de engenharia e construção, optamos pela OEC, que tem a alcunha da Odebrecht”, explicou.
O presidente da OEC acredita que aos poucos as notícias envolvendo a empresa com a corrupção serão deixadas para trás. “À medida em que forem chegando projetos novos, vamos modificando a pauta. Pode voltar à tona, mas sempre como fatos que pertencem ao passado. A empresa vem investindo em um processo de reestruturação e vai dar muito orgulho ao Brasil”, acredita.
Investimento público Para Marco Siqueira, o Brasil precisa tanto de investimentos públicos quanto privados para desenvolver o setor de infraestrutura. Ele cita como um exemplo positivo o ambiente de negócios que deve ser criado pelo novo marco legal do saneamento. “É importante porque abre para os investimentos privados, sem fechar as portas para os recursos públicos. Acredito que precisamos dos dois e que não há nada de antagônico nisso”, destaca.
“O tamanho do Brasil e as dimensões das suas demandas são tão grandes que há espaço para todo mundo. Tem muitos subgrupos dentro da realidade do saneamento, por exemplo, para serem atendidas. Existem cidades pequenas que precisam se consorciar, tem regiões metropolitanas, que precisam de outros tipos de soluções. Tem distritos industrias que demandam soluções específicas”, enumera.
Para Siqueira, o mais positivo da discussão sobre o saneamento é que ela pode impulsionar um processo de “reurbanização” do país. “Você imagina chegar para uma comunidade e dizer, vamos trazer saneamento, água e esgoto tratado, mas a gente sabe que tem muito mais a fazer, como abertura de novas vias, regularização de propriedades. Existe um trabalho grande a ser feito que pode ser impulsionado por essa agenda”, destaca.
Marco Siqueira considera que as medidas mais importantes a serem tomadas para a recuperação da economia brasileira passaram pelo estímulo à geração de empregos. “É importante que haja uma recuperação do mercado de trabalho, até para que se consiga um alívio nas contas públicas. Foi importante essa extensão do auxílio emergencial”, avalia.