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Empreendedorismo doce: de onde vem a paixão por açúcar


 

História do Brasil Colônia e comportamento do organismo humano ajudam a explicar o fascínio por um docinho

  • Carolina Cerqueira

Salvador
Publicado em 28/09/2024 às 11:00:00
Os doces brasileiros foram adaptados aos ingredientes locais, principalmente coco e frutas de compotas. Crédito: Nara Gentil

A vizinha vende bolos, a colega do trabalho vende bolo de pote, o rapaz no ônibus vende trufas, o moço na praia vende brigadeiros. Quando o assunto é doce, todo mundo quer provar um pedaço, mas também quer ganhar dinheiro. O fenômeno tem nome: empreendedorismo doce. Para entender o porquê do sucesso, é preciso voltar no tempo do Brasil Colônia e analisar oferta e demanda.

Para a professora do Instituto de Nutrição da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) Márcia Madeira, a explicação está tanto nos produtores quanto nos consumidores. Ela afirma que a alimentação é o setor no qual os pequenos empreendedores mais apostam e que os doces são os queridinhos da clientela.

O grande destaque vai para o chocolate. De acordo com dados da empresa de pesquisas Kantar, o setor faturou mais de 11 bilhões de reais em 2021. Naquele ano, cada brasileiro gastou, em média, 90 reais com o produto.

Geralmente, os pequenos empreendedores apostam em receitas que já faziam sucesso em casa entre familiares e amigos. Aí está o fator facilidade. E os ingredientes dos doces são, em geral, mais baratos do que dos salgados, que costumam demandar recheios a base de proteínas. Aí está o fator preço.

“Existem testes que comprovam que gostamos do familiar e o empreendedorismo se baseia nisso. Na hora de empreender, vamos no básico, no certeiro. É uma segurança econômica para o setor”, destaca Márcia Madeira.

O familiar também envolve afetividade. Se fizer um pequeno esforço, vai lembrar de marcas que baseiam suas propagandas nas memórias com as vovós que cozinham para os netos. Quem assistiu ao Sítio do Picapau Amarelo sabe bem a água na boca que os bolinhos de chuva da Dona Benta provocavam.

“Quem nunca ofereceu um bombom ou até uma balinha a outra pessoa em demonstração de afeto? Qual vovó nunca fez um bolo coberto com bastante chocolate para esperar seus amados netos em sua simples e aconchegante casa?”, questiona o gastrólogo e chef pâtissier do Senac, Tenesser Vila Flor Junior.

Açúcar para dar e vender

O costume de fazer receitas doces em casa tem explicação: a grande oferta do açúcar em terras brasileiras. No livro “Açúcar: uma sociologia do doce, com receitas de bolos e doces do Nordeste e do Brasil”, o sociólogo Gilberto Freyre afirma que é essa fartura de açúcar que provoca uma tendência ao “açucaramento” da dieta dos brasileiros.

Como explica Ilana Santos, na monografia “Influência portuguesa no preparo do quindim”, apresentada ao curso de Gastronomia da Universidade Federal da Bahia, a grande quantidade de produção de cana de açúcar no Brasil durante o período colonial fazia quem cozinhava aproveitar os produtos disponíveis e baratos e apostar em uma variedade de receitas.

Primeiro, a cana chegou à Europa através dos árabes, utilizada como especiaria e medicamento. Depois, passou a ser usada como alimento e colônias como Brasil passaram a abastecer países como Portugal. Não é à toa que a confeitaria portuguesa é conhecida mundialmente, com destaque para os pasteis de Belém.

O sucesso logo teve reflexos no Brasil, com confeitarias tradicionais como a Confeitaria Colombo, fundada em 1894 no Rio de Janeiro e que existe até hoje. Ponto turístico da cidade famoso por quitutes como a marmelada, a Colombo preserva a decoração dos tempos mais luxuosos, com referência à Belle Époque.

Em terras brasileiras, os doces foram adaptados aos ingredientes locais, principalmente com a inserção do coco e de outras frutas para confecção de compotas. Aí surgem, na Bahia, o quindim e as cocadas muito presentes nos tabuleiros das baianas de acarajé.

Paixão por um docinho

A nutricionista Thaiane Barbosa explica que o sucesso do açúcar no paladar se dá por proporcionar, momentaneamente, um conforto emocional. “Ele pode gerar um pico de energia e melhorar o humor. Só é preciso ter cuidado porque, depois, pode também gerar fadiga e cansaço e esse processo de alta e baixa pode levar à ansiedade”, alerta.

Além da explicação emocional, a parte física do corpo também tem culpa no cartório. Como explica a nutricionista, se o organismo sentir necessidade de repor energia ao longo do dia, vai pedir açúcar. E quanto mais açúcar ingerido, mais acostumado o paladar vai ficar, gerando mais vontade de doce.

O chef Tenesser Vila Flor Junior complementa: “Com base em algumas literaturas, a afinidade com doces é cientificamente comprovada. O açúcar libera um neurotransmissor que estimula a produção de hormônios do prazer, então é uma afinidade mundial, mesmo que em alguns países a paixão por doce seja mais intensa que outros”, diz.

Pitada brasileira

O brigadeiro, por exemplo, “é coisa nossa”. O quitute teria nascido nas mãos de doceiras cariocas na década de 1940, quando criaram o doce para vender e arrecadar fundos para a campanha presidencial do brigadeiro Eduardo Gomes.

No último Dia Mundial do Brigadeiro, 10 de setembro, a jornalista Christiane Pelajo publicou no perfil do Instagram um vídeo em que fala sobre a criação do brigadeiro e atribui a receita original à bisavó, Heloísa Nabuco de Oliveira.

“Ela inventou o doce para um casamento onde estaria presente o brigadeiro Eduardo Gomes, então candidato à Presidência da República. Ela decidiu homenageá-lo batizando o novo doce com o nome de brigadeiro”, diz a jornalista no vídeo.

A torta búlgara também é brasileira. Como contou Elíbia Portela ao programa da TV Bahia Mosaico Baiano, a torta é, na verdade, um recheio que ela havia criado para uma outra torta. Ela também é a responsável pela criação do pãozinho delícia da Bahia.

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