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Vagner Mancini e o stand up do tempo perdido


 

  • Gabriel Galo

Publicado em 23/07/2018 às 05:00:00
Atualizado em 18/04/2023 às 16:39:07
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Você sabe o que é stand up? É aquela modalidade de humor que um comediante sobe sozinho ao palco, conta piadas para agrado da plateia, sem personagens nem interações com outros atores. Ele, voz e microfone.

Há algumas décadas, quando este tipo de apresentação já estava consolidado nos EUA, surgiu um espetáculo bufo que, felizmente, já caiu em desuso. O show humilhação se dava da seguinte maneira: o pretenso humorista, durante o tempo de sua performance, canalizaria sua raiva às pessoas da plateia. Era uma sucessão de piadas que conseguia constranger todos os presentes. Quem ria, ria de nervoso.

Acontece que por estas bandas do país maravilhoso que é a Bahia, as coisas demoram um tanto mais para chegar. Diz um amigo, cheio de chinfra e de galhofa, que se o mundo acabar, a Bahia fica sabendo cinco dias depois. Assim, estamos assistindo à chegada do stand up humilhação nas terras lambuzadas de dendê. E vemos a descoberta de uma nova profissão de alguém que até então tínhamos como treinador de futebol. Não há dúvidas: Vagner Mancini é, acima de tudo, um fanfarrão, um comediante de piadas de mau gosto.

Os proprietários da casa de shows, apesar de tantos apelos de um público cansado de sofrer, mantiveram a programação. Mancini renovou para mais tantas apresentações. “Na pausa para a Copa ele há de melhorar!”, diziam os donos, enquanto nos bastidores o comediante era só gargalhada. Na plateia, a torcida que ainda insiste, que persiste, que não desiste.

Ontem, o fanfarrão comediante preparou piadas que certamente chocariam quem se atrevesse a vê-lo. No palco que ele mesmo levantou, alguns centímetros mais elevado para aumentar a sua percepção de grandeza, iniciou sua série, metralhadora de impropérios.

“Para começo de conversa, Fillipe Soutto é titular da volância”. A plateia riu de nervoso. Viram a escalação, sofreram. Xingaram. O artista, no palco, ria histericamente da cara da apalermada audiência. Continuou. “Cortei Cedric e vou com Lucas no banco!” Os mais sensíveis começaram a chorar em desespero. “Chora mais! Porque ainda vou colocar ele pra jogar!” Alguns ameaçaram partir para a violência física.

Ele prosseguiu, ensaiando uns sarcasmos. “Qualquer coisa, se tudo der errado, podemos sempre confiar em Yago para reverter a situação”. Ele ria como hiena, puxava o ar profundamente para se recuperar do ataque de riso.

“E sabe o que é pior? Eu ainda consigo convencer os donos desta casa a continuar me chamando para trabalhar!” Pronto. O escárnio agora se virava também para os diretores da instituição. “E quem são eles para negociarem comigo? Depois daquele Ba-Vi da fuga, esta casa nunca esteve tão pequena em sua história!” Ele deita no palco, rindo que não se aguenta. As palavras saem em soluços.

“Na pausa para a Copa, por exemplo, tratei de botar atestado e trilha sonora nos treinamentos. Sabe aquela música Tempo Perdido da Legião? Ela mesma!” Há, apenas, humilhação no ambiente. “Mas podem ficar tranquilos. O fundo de poço tem subsolo. Esperem acabar este Ba-Vi!” Agradeceu a plateia, dando ‘até quinta-feira!’, certo de sua impune permanência.

Os chefes se reúnem. “Ele não é ótimo? Tem nada de politicamente correto ali. Adoro esse humor anos 80”. Alguém propõe ação imediata: “mete uma hashtag aí e tudo passa”. Um desavisado aborda, “mas e a torcida?” Todos caem na gargalhada. “Principiante...”

Gabriel Galo é escritor