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Do MPB ao funk, primeiro dia do Salvador Capital Afro é uma celebração aos artistas locais negros


 

Festival acontece no Pátio da Barroquinha e vai até o dia 24

  • Raquel Brito

Publicado em 22/11/2023 às 22:49:30
Público dança ao som do pagode de Aline Souza . Crédito: Ana Lúcia Albuquerque

Flavio Andre Garces, tradutor de 28 anos, chegou ao Brasil em abril. O colombiano, que ama viajar e costuma passar poucos dias em cada destino, se apaixonou pelo país e por Salvador: agora, o plano é passar mais um ano por aqui. Para ele, as viagens são uma oportunidade de analisar a diáspora africana em diferentes lugares.

Nesta quarta-feira (22), Flavio foi acompanhar o primeiro dia do festival Salvador Capital Afro, que celebra a cultura negra por meio de painéis de debate, oficinas e showcases. Segundo ele, é mágico ver a força da população negra da cidade. “A comunidade afrobrasileira de Salvador me fez ver o mundo de uma forma diferente, adicionar outra capa na minha perspectiva. Aqui, desde a necessidade de luta até a celebração, as pessoas falam mais. Eu admiro muito isso”, diz.

O Salvador Capital Afro acontece no Pátio da Barroquinha entre os dias 22 e 24 de novembro. No primeiro dia, contou com a participação dos artistas Jann Souza, Vanessa Melo, Aline Souza e o grupo IFÁ.

Para Jann Souza, primeira artista a subir no palco nesta quarta-feira, participar do festival é uma chance de mostrar seu trabalho e devolver à comunidade a representatividade que ela significa enquanto artista mulher, negra e lésbica.

Jann Souza deu início à parte musical do festival. Crédito: Ana Lúcia Albuquerque

“É uma oportunidade riquíssima. Esse é um mês que a gente comemora, mas que também é um mês de resistência e de reflexão sobre o dia 20 de novembro. Tem esse parágrafo no meio do ano, mas a resistência, a resiliência e a luta acontecem o ano inteiro”, diz.

A cantora trouxe o MPB para o festival canções como as autorais Poder Ancestral e Coragem Amor, além de músicas de outros artistas negros, como Zero, de Liniker, e Árvore, de Edson Gomes.

Vanessa Melo foi a segunda a se apresentar. A artista abriu o show tocando e cantando a música Abre Caminhos, do grupo Saravá Jazz Bahia, e cantou ainda músicas como a inédita Alegria de Viver, que ganhou como presente e ainda será lançada, além de recitar o poema Me Gritaram Negra, da peruana Victoria Santa Cruz. No poema, Victoria relata o processo de autoaceitação como mulher negra após sofrer a vida inteira com o preconceito.

Vanessa tocou e cantou durante sua apresentação. Crédito: Ana Lúcia Albuquerque

Segundo Vanessa, que se apresentou pela primeira vez em um festival nesta quarta-feira, o Salvador Capital Afro é simbólico para a luta dos soteropolitanos negros, sobretudo dos artistas.

“Sempre existe aquilo de que é preciso ir para fora para fazer sucesso em casa. É importante fazer sucesso em casa, fazer o público chegar, trocar com essas pessoas. Isso vai além da música, são conexões de trabalho. Eu espero que tenha cada vez mais projetos, para a gente se fortalecer ainda mais na cena. Hoje foi incrível”, afirmou a cantora, após se apresentar.

Em sua apresentação, Aline Souza manteve o samba e o pagode bem vivos: desde versões em pagode de músicas de Bob Marley, como Three Little Birds e Woman No Cry, às autorais, como Senta Maria. Para a cantora, é muito importante que eventos como esse sejam promovidos, para que musicistas negros possam estar em evidência.

Aline Souza levou o samba e o pagode para o festival. Crédito: Ana Lúcia Albuquerque

“A gente não tem tantos espaços quanto espera. Eu, sendo mulher, falo até ponto, porque por aí está cheio de artistas negros, mas para mulheres é bem mais difícil chegar lá e conquistar esse espaço. As oportunidades que aparecem a gente tem que pegar. A de hoje foi uma oportunidade muito boa e eu estou muito feliz de estar aqui”, disse.

No encerramento do primeiro dia, o grupo IFÁ energizou a plateia com suas músicas, que mesclam ritmos como afrobeat, funk e reggae. O show teve direito a muita animação e ao guitarrista, Ênio Nogueira, descendo do palco e tocando junto ao público.

Ênio desceu do palco para tocar durante apresentação da IFÁ. Crédito: Ana Lúcia Albuquerque

Fabrício Mota, baixista do grupo, diz que é sempre uma felicidade tocar no Pátio da Barroquinha, ainda mais num evento como esse. “Falar de africanidade é falar do futuro, ancestralidade é um assunto do futuro. Para nós, é uma responsabilidade grande fazer isso do jeito que a gente conhece e gosta, que é através da música. Principalmente a instrumental, que é uma área ainda muito segmentada”, conta.

*Com orientação da subchefe de reportagem Monique Lôbo.