Quem são as Caretas do Mingau, mulheres que se vestiam de assombração na luta pela independência

Hoje, movimento cultural em Saubara relembra as antepassadas

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  • Thais Borges

Publicado em 30 de junho de 2024 às 05:00

Caretas do Mingau
Caretas do Mingau Crédito: Secult BA/Divulgação

Às 2h da manhã de todo 2 de Julho, as ruas de Saubara recebem um grupo de mulheres vestidas de branco, cobrindo o rosto e carregando panelas. São as Caretas do Mingau, movimento cultural que celebra justamente as caretas originárias, consideradas uns dos agentes mais importantes das lutas pela independência no município.

Entre 1822 e 1823, um grupo de mulheres de Saubara saía assim - totalmente vestidas de branco - para assustar os portugueses. Fingindo ser assombrações, elas afugentavam os colonizadores para, assim, conseguir levar comida para os homens de suas famílias que estavam entre os combatentes da guerra.

A tradição de celebrar as antecessoras é centenária e, hoje, permanece com um grupo com cerca de 20 mulheres. A historiadora Vanessa Orewá, que estudou as caretas em sua pesquisa de mestrado, conta que a integrante que, por muito tempo, foi a mais velha do grupo, morreu no ano passado, com mais de 90 anos. Antes dela, sua mãe já integrava o movimento.

“A gente não conseguiu precisar se os festejos são de 150 ou 200 anos, algo mais próximo a 1823 mesmo”, diz ela, que, no ano passado, participou da organização. “Vejo as Caretas do Mingau como multiartistas, mas também como u grupo de estratégia cultural, no sentido de que essa prática vai passando de geração em geração”.

As mulheres do grupo saem cantando e relembrando a história pelas ruas da cidade. Nas panelas, carregam mingaus de tapioca e milho. Em cada trecho do trajeto, oferecem os mingaus, enquanto sacodem chocalhos.

Para Vanessa, elas também são professoras. “Elas são as responsáveis por contar, para a cidade, a história da vitória dessa guerra na Bahia. Se a gente for pensar na rua como essa escola, elas ensinam isso a céu aberto, de madrugada. Por isso, é um espaço revolucionário de conhecimento”, analisa a historiadora.

Na madrugada do dia 2 de Julho, as caretas ficam nas ruas até encontrar a Cabocla Brígida, o que normalmente acontece por volta das 5h da manhã. “A gente vai até a entrada da cidade, ao encontro dela, e finaliza o cortejo cantando sambas que, nas religiões de matriz afroindígena, são conhecidos como samba de caboclo. A gente canta ‘o que viemos fazer? Vamos saudar a cabocla’. Depois , encerramos o cortejo”, explica.