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Da Redação
Publicado em 3 de setembro de 2017 às 03:15
- Atualizado há 2 anos
Quando o mergulhador Wellington Alves, 37 anos, chegou para dar aulas de futevôlei e de mergulho no Porto da Barra, esta semana, tomou um susto. O mar tinha chegado tão próximo da balaustrada que, quando a maré desceu, parte da areia tinha sumido. “O rochedo que fica embaixo da areia ficou à mostra. Na quinta-feira, até comentei que, daqui a alguns anos, não vai ter mais areia”, conta Alves, que vai à praia diariamente, sob sol ou chuva. >
O que ele não imaginava é que o palpite não está tão longe de se tornar realidade. De acordo com estudos do professor da Universidade Federal da Bahia (Ufba) José Maria Landim, doutor em Geologia Marinha, o aumento do nível do mar deve ser de 0,5 a 1 metro nos próximos 80 anos. E essa mudança deve ser sentida, principalmente, nas praias com faixa de terra mais curta e nas áreas mais baixas da cidade. Essas, segundo ele, serão as primeiras a ser engolidas. >
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A mudança seria capaz de tirar do mapa praias como as do Porto e do Farol da Barra. Além disso, uma imensa área na Cidade Baixa, que abrange bairros como Monte Serrat e Bonfim, também está sob ameaça. “Basta ver que, na maré alta, as ondas já jogam areia ali (na Barra). A tendência é aumentar cada vez mais”, ilustra.>
É bem o que Wellington, o mergulhador, começou a perceber. “Tanto aqui (no Porto) quanto no Farol. Sempre saio do trabalho aqui e vou mergulhar lá. Pelo menos tive o privilégio de conhecer. Infelizmente, as próximas gerações não vão ter”. Foto: Evandro Veiga/Arquivo CORREIO Base técnica O alerta do professor Landim tem como base seus estudos da chamada ‘evolução pretérita da zona costeira’, cujo foco é analisar como o nível do mar se comportou no passado e de que forma a zona costeira respondeu a essas variações.“As avenidas Oceânica e Otávio Mangabeira avançaram na faixa de areia, diminuindo a largura das praias, que não terão para onde recuar com o avanço do mar”, observa. Inclusive, durante o Inverno, na maré cheia, já não há espaço na areia, na praia do Farol, às margens da Av. Oceânica. Frequentador do local desde criança, o barraqueiro Erivaldo Pinheiro, 39, diz que, hoje, o mar já chega na balaustrada. “Bate na parede. E a gente precisa ficar sempre atento, porque a maré vem de surpresa. Esses dias, um colega perdeu cinco cadeiras para o mar. Cada uma custando R$ 130”. >
Moradora da Liberdade, a pedagoga Meire Cruz, 39, viu a paisagem da praia do Farol mudar nos últimos anos.“Passei minha adolescência aqui vindo todo fim de semana e, hoje, você já vê menos areia. E é uma pena, porque é a melhor, mais aconchegante praia de Salvador. Se eu estiver aqui daqui a 80 anos, só vou pensar: ‘cadê meu cantinho?”, afirma a pedagoga. Para a fisioterapeuta Maria da Conceição Sousa, 44, a falta vai ser mais sentida no Porto da Barra. É para lá que ela, moradora da Cidade Nova, costuma ir com a filha e o marido. “Vai ser uma perda grande, porque esse pedaço de terra é ouro. Para a gente, é um paraíso”, lamenta. O professor José Maria Landim, estudioso da evolução pretérita da zona costeira, que indica comportamento do mar (Foto: Acervo pessoal) Espaço Conforme o professor Landim, o principal responsável pelo aumento do nível das águas é o aquecimento global decorrente do aumento de gases estufa na atmosfera. Os prognósticos são do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês, e vinculado à Organização das Nações Unidas). A mudança também afetará outras áreas da cidade. “Isto decorrerá, principalmente, por não haver espaço para as praias migrarem no sentido do continente”, diz. >
Para Landim, tamanha falta de espaço para a migração das praias é resultado, no caso de Salvador, de uma das principais vias de tráfego da cidade (a Av. Otávio Mangabeira), bordejar, tal como uma fortificação, a orla. “Trechos dessa avenida foram construídos até mesmo diretamente sobre a praia, como mostram fotos antigas”, cita. >
Vulnerabilidade A última vez que o nível do mar cresceu em grandes proporções em Salvador foi há 120 mil anos - o aumento foi de seis a oito metros acima do nível atual, como uma reconstrução das áreas inundadas cedida pelo professor Landim ao CORREIO demonstra (veja o mapa). As regiões alagadas na época, segundo ele, são também as mais vulneráveis no caso de uma futura elevação.>
O especialista ainda explica que, desde o início da urbanização da cidade, a ocupação em Salvador se concentrou ao longo da orla. “Não se pode dizer que essas ocupações foram irregulares porque não existiam as preocupações que vivenciamos nos dias atuais”. >
Existem dois instrumentos legais que definem as faixas de recuo (onde se proíbe construção permanente): terrenos de Marinha - uma faixa de 33 m contados a partir da linha de preamar, que pertence à União; e uma lei estadual de 1989, que estabelece uma faixa de 60 metros, contados a partir também da linha de costa, para possibilitar o livre acesso à praia.>
“Como Salvador já é um centro urbano consolidado, não tem muito o que fazer. O estabelecimento de faixas de recuo, entretanto, é a ferramenta de gestão mais eficiente e barata para minimizar os conflitos decorrentes da erosão costeira em regiões ainda não densamente ocupadas”, defende.>