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Carol Aquino
Publicado em 22 de novembro de 2017 às 02:00
- Atualizado há 2 anos
A produção do cacau baiano vai mudar. E o que fazer do setor nos próximos 15 anos foi o que levou produtores do estado ao Fórum Bahia Cacau 2035, na tarde desta terça-feira (21), em Salvador. Enquanto o fruto se prepara para um novo ciclo, universidades e institutos de pesquisa, produtores rurais, empresários do chocolate e secretários de governo elaboram o novo Sistema e Arranjo Produtivo Local (APL). Até o momento, uma coisa é certa: para conseguir 'salvar a lavoura' ou tentar reviver a era de ouro da colheita, os produtores terão que aderir ao cacau sustentável.
A ideia é aproveitar o já existente sistema de produção comum na Bahia: o cacau cabruca. Nesse tipo de plantação, o cultivo é feito dentro da floresta. Assim, é possível preservar a Mata Atlântica, a fauna e as nascentes. Nesta terça, foi publicada no Diário Oficial do Estado (DOE) a Portaria nº 03 da Secretaria do Meio Ambiente (Sema) e do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), ambos do governo do estado, que regulamenta a concessão de áreas florestais para o manejo da cabruca na Bahia.
A “virada verde” da produção cacaueira também tem outro propósito: faz parte das exigências para que a amêndoa do cacau baiano seja considerada premium e consiga um preço melhor no mercado, principalmente o externo.
Atualmente, a amêndoa baiana não é considerada de alta qualidade e, por isso, é mais usada para produção do chocolate de massa, mais comumente encontrado em supermercados. Já a amêndoa premium possibilitaria uma marca forte, sabor próprio e identidade regional. Encontro em Salvador que discutiu produção cacaueira também teve exposição de chocolates (Foto: Marina Silva/CORREIO) Resistente à seca Para isso, o Instituto Biofábrica de Cacau desenvolveu uma variedade da planta que é mais resistente à seca, às pragas, além de ser capaz dar origem a uma amêndoa de alta qualidade e sabor diferenciados.
Aos poucos, os agricultores vão incorporando novas práticas, como o uso de adubo orgânico, estufa solar. “A gente começa a observar e vai vendo a necessidade da planta. Você vai cuidando e a matéria orgânica vai respondendo. Não precisa usar veneno. Na geração de resíduos, estamos já produzindo composteiras. Porque sustentabilidade é isso, preservar o meio ambiente e produzir produtos limpos”, conta a agricultora Damiana Martins, da zona rural de Mutuípe, no Centro-Sul.
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Mercado O mercado e os próprios consumidores já demandam outro tipo de chocolate, mais gourmet, que tenha uma determinada concentração da amêndoa. “Será que nem o vinho, em que você olha o rótulo, a safra, o tipo da uva, a origem”, compara o secretário de Desenvolvimento Rural do Estado da Bahia, Jerônimo Rodrigues.
Para atingir o chamado nível premium, o cacau precisa obedecer a critérios sociais, ambientais e de produção. “Quando, lá fora, a gente chega e diz que o cacau da Bahia é um cacau que preserva o meio ambiente, que não tem trabalho infantil, isso agrega valor à amêndoa”, aponta Rodrigues.
Outra característica do fruto produzido na Bahia é que entre 80% e 90% dele advém da agricultura familiar. Populações indígenas, quilombolas e assentadas também produzem.
É o caso do produtor rural Edcarlos Pereira de Oliveira. Assentado em uma antiga fazenda em Pau Brasil, no Sul, ele conta que as 35 famílias que dividem o terreno com ele estão vendo na plantação de cacau uma fonte de subsistência.“Estamos dando conta do cacau que estava morto, da fazenda que estava abandonada. Começamos a plantar novas mudas há seis meses. Nossa esperança é plantar mais e colher”, revela o produtor rural. De olho no chocolate Com o mercado favorável a essa nova fase, os produtores começam a se preocupar cada vez mais com a porcentagem de cacau presente no chocolate.
“A receptividade da população está sendo boa. Nós estamos em movimento lento, mas crescente, da conscientização do nosso consumidor. Nós éramos acostumados com bombons, que têm baixa porcentagem de cacau, e não chocolates. Hoje, a gente entende que o chocolate deve ter esse alto percentual de cacau, que é nossa matéria-prima”, aponta a empresária Cecília Gomes, da Amado Cacau, e diretora da Associação de Produtores de Chocolate da Bahia.
Outro fator que pode aquecer a demanda por cacau é o Projeto de Lei federal 93/2015, que propõe que o doce de cacau produzido e comercializado no Brasil só seja chamado de chocolate se tiver um percentual mínimo de 35% da amêndoa.
De autoria da senadora Lídice da Mata (PSB), ele está tramitando na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal. Os rótulos devem trazer expressamente a porcentagem do cacau na embalagem. Quatro projetos de lei semelhantes também tramitam na Câmara Federal, todos de autoria de deputados baianos.
Nova fase A Bahia espera recuperar o destaque que tinha no passado na produção do cacau. O estado ainda é o maior produtor brasileiro do fruto, porém perdeu o destaque mundial para outros países da América Central e África. A meta é duplicar a produção, que hoje é de cerca de 100 mil toneladas, entre cinco ou dez anos, chegando a cerca de 200 mil toneladas por ano.
O aumento da produção deve ser acompanhado do crescimento da qualidade, fazendo com que a indústria deixe de importar amêndoas para fabricar chocolates finos. A Bahia também quer deixar se ser só produtora de amêndoa para virar referência em produção de chocolates.“Se a arroba de cacau custa R$ 100, com uma arroba a gente pode fazer R$ 500, R$ 600 com o chocolate”, conclui Jerônimo Rodrigues. ***
A fortuna e a praga da vassoura-de-bruxa O cacau começou a ser produzido no Brasil ainda no século XVII, quando, em 1679, foi autorizado o cultivo da planta pelos colonos. Na Bahia, o fruto só foi cultivado em meados do século XVIII, em Canavieiras e Ilhéus.
Nas primeiras décadas do século XX, o fruto era o principal produto de exportação baiano. Os cacauicultores fizeram fortunas e foram chamados de “coronéis” do cacau.
A decadência veio a partir da década de 1990, quando as lavouras foram tomadas pela praga da vassoura-de-bruxa e o preço do cacau declinou significativamente no mercado internacional. A produção caiu tanto que passou a ser insuficiente até para atender a demanda nacional.
*Colaborou na reportagem Elaine Araújo, participante da 12ª turma do Correio de Futuro