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Da Redação
Publicado em 11 de fevereiro de 2019 às 05:10
- Atualizado há 2 anos
Em dezembro passado foi sancionada a Lei 13.756, que criou a modalidade de loteria denominada apostas de quota fixa, a qual “consiste em sistema de apostas relativas a eventos reais de temática esportiva, em que é definido, no momento de efetivação da aposta, quanto o apostador pode ganhar em caso de acerto do prognóstico”. >
No Brasil, as apostas em eventos esportivos por meio de sites viviam em um limbo jurídico. Por um lado, a Lei de Contravenções Penais, editada em 1941, trata como contravenção penal “estabelecer ou explorar jogo de azar em lugar público ou acessível ao público, mediante o pagamento de entrada ou sem ele” (art. 50), ali incluídas “as apostas sobre qualquer competição esportiva” (§3º, c)). Por outro lado, a proibição não alcançava as empresas sediadas no exterior, já que o artigo 5º do Código Penal estabelece que a lei brasileira só se aplica aos atos praticados no território nacional.>
Na prática, não havia impedimento para que sites de apostas hospedados em países nos quais tais atividades são lícitas ofertassem serviços a internautas no Brasil. Assim, mesmo antes da legalização, cerca de 500 sites já ofereciam serviços em português e possibilidade de realização de apostas.>
Com a regulamentação da atividade, as empresas de apostas estrangeiras poderão obter licenças para operar diretamente no país, o que, além de incremento de arrecadação pelo Governo Federal com as outorgas de licenças, autorizações e a tributação das atividades e resultados, permitirá às entidades desportivas brasileiras acesso a novas possibilidades de obtenção de recursos.>
As estimativas sobre o mercado brasileiro de apostas esportivas dão conta que movimenta entre R$ 4 bilhões e R$ 9 bilhões por ano. Imaginando-se uma tributação linear da ordem de 15% sobre o faturamento das empresas e de 27,5% sobre os resultados das apostas, pode-se imaginar um nada desprezível incremento de arrecadação federal variando entre cerca de R$ 1 bilhão e R$ 3,8 bilhões ao ano, sem prejuízo dos valores obtidos com a outorga onerosa de licenças e autorizações para funcionamento dessas empresas - sem falar do próprio aumento de apostadores a partir da legalização.>
Mas a matemática não é tão simples. Sem a adequada política tributária sobre a atividade de apostas esportivas, não haverá estímulos para a constituição de novas empresas em solo brasileiro - que concorrem com as sediadas em países com políticas fiscais mais favoráveis.>
Em outra frente, a legalização é igualmente benéfica às entidades esportivas. Em função da anterior proibição, havia restrições à publicidade e a patrocínios. Tais restrições decorriam do disposto no artigo 21 do Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, que prevê que anúncios não devem conter nada que possa induzir a atividades ilegais ou que pareçam favorecer, enaltecer ou estimular tais atividades.>
Com a autorização das apostas por quota fixa, abre-se para o mercado publicitário e, sobretudo, para o mercado de patrocínios esportivos, um novo rol de possibilidades que em outros países têm se demonstrado uma importante fonte de recursos para o esporte.>
Permite-se também que as entidades esportivas brasileiras se beneficiem de uma parcela dos recursos decorrentes das atividades de apostas por meio do licenciamento e autorização do uso de suas marcas ou, até mesmo, do fornecimento de dados e estatísticas oficiais de suas atividades. >
Por fim, outro desafio relevante está no combate à manipulação de resultados. A questão é complexa, pois é necessário criar mecanismos de detecção e prevenção, sendo recomendável a centralização de dados para monitoramento dos padrões de apostas, garantindo não só a integridade do esporte, mas também a transparência e segurança para os apostadores. >
Recomendável, também, que se estabeleça a obrigação das empresas atuantes no mercado de notificar as autoridades sobre a ocorrência de apostas incomuns tanto em valores quanto em eventos. >
Além disso, é aconselhável que jogadores, treinadores e dirigentes sejam proibidos de apostar em resultados envolvendo os seus respectivos esportes. Por fim, a legislação criminal deve ser atualizada. A legalização é inegavelmente positiva, pois passa a regular um mercado que, bem ou mal, já envolvia centenas de milhares de pessoas e movimentava milhões de reais. Mas sem a adequada estrutura fiscal e, principalmente, sem políticas eficazes de combate à manipulação de resultados, os efeitos buscados jamais serão alcançados.>
Tiago Gomes é advogado e especialista em Direito Empresarial. Marcel Belfiore é advogado e especialista em Direito Desportivo.>
Opiniões e conceitos expressos nos artigos são de responsabilidade dos autores>